quarta-feira, 10 de julho de 2019

PARA COMPREENDER AONDE ESTÁ A CORRUPÇÃO NO BRASIL

Mais uma vez agradeço ao amigo Gato pela postagem que ele me mandou e que reproduzo aqui, muito importante para podermos avançar na compreensão do que se trata quando olhamos sem filtros para os extratos mais poderosos da classe média brasileira - grande campeã da destruição da democracia em nome do moralismo alegado. 

"CLASSE MÉDIA NO ESPELHO" - TRECHO DA ALTA CLASSE MÉDIA

Trechos do livro do sociólogo Jessé Souza, "A Classe Média no Espelho", 2018, GMT Editores Ltda., Rio de Janeiro.
Capítulo - "Trajetórias de vida"
- "A alta classe média" (pág. 168)
Entrevista do Jessé Souza...
"Sérgio: o CEO de um banco explica como se compra todo mundo" - (a entrevista completa vai da página 169 até 180)
- "Sérgio não é um CEO qualquer. Muito inteligente, culto, leitor de psicanálise nas horas vagas - sua mulher é psicóloga -, ele é dessas pessoas que têm prazer numa sinceridade desconcertante... no início dos anos 2000, quando voltou ao Brasil depois de quatro anos de pós-graduação no exterior, com pouco mais de 30 anos, o amigo João Carlos já era multimilionário por 'esforço próprio' e apenas naquele ano tinha ganhado mais dinheiro do que o pai durante toda a vida (Sérgio foi convidado a trabalhar com João Carlos no departamento jurídico).
Pergunta - Qual era o seu trabalho?.
Resposta - "O João é o gênio, sabe onde estão o dinheiro e as oportunidades, pensa nisso o tempo todo. Eu só faço comprar as pessoas necessárias para que as coisas aconteçam como ele quer... o mais importante no Direito é conhecer os meandros da linha cinzenta entre o legal e o ilegal. Meu trabalho é estender ao máximo a margem da legalidade a serviço dos interesses do banco... Eu faço os contatos com juízes, políticos e jornalistas e cuido dos clientes estrangeiros.... É mais uma questão de clientes, dar a eles o que querem, dizer o que querem ouvir, beber o que eles querem beber e ser discreto e sóbrio".

P - "E o que eles querem?".
R - "Aqui em São Paulo o que move tudo é o dinheiro e todo mundo quer viver. As pessoas são compradas com dinheiro vivo e com depósitos em paraísos fiscais criados para isso. A gente sabe fazer bem feito. Sem deixar rastros. A cidade é toda comprada, não se iluda, toda licitação pública e todo negócio lucrativo, sem exceção, é repartido e negociado. Todo mundo tem um preço. Até hoje não conheci quem não tivesse. E para todo negócio é necessário uma informação privilegiada aqui, um amigo no Banco Central ali, uma sentença comprada ali ou uma influência de um ministro em Brasília acolá... Uma forma eficaz são presentes constantes, sem expectativa imediata de contra favores... Todo mundo adora vinhos caros... (para mulheres) bolsa que custam 50, 60 mil reais... promover seminários e palestras, e pagar muito além do que se paga nesse tipo de mercado... O que construímos é um círculo de amigos... Isso é o que chamo de criar relações de confiança".

P - "E o pagamento direito por serviços específicos?".
R - "Obviamente isso também existe. Pagamos em paraísos fiscais, por meio de transferências sucessivas entre dezenas de empresas de fachada, de tal modo que nem o Sherlock Holmes consegue refazer o caminho original... Mas, não fica rastro, posso assegurar... Não foi só no caso do nosso banco: todos os bancos, inclusive os maiores, fazem a mesma coisa... A mina de ouro de qualquer banco comercial ou de investimentos é o Banco Central. Ali só entra gente nossa. E o país é gerido a partir do Banco Central, que decide tudo de importante na economia. É lá que a zona cinzenta entre a legalidade a ilegalidade define a vida de todos. Isso não aparece em nenhum jornal. Podemos fazer qualquer tipo de especulação com o câmbio, como nos 'swaps' cambiais, por exemplo. Se der errado, Banco Central cobre o prejuízo. Não existe negócio melhor. Se der errado, o famoso Erário paga a conta. Quem controla toda a economia somos nós e a nosso favor, o Congresso nem apita sobre isso. Quando, muito eventualmente, decide sobre algo, apenas assina o que nós mandamos, essa é a verdade que ninguém conhece porque não sai em nenhuma TV. Claro que tudo é justificado como mecanismo de combate à inflação e não enriquecer os ricos. Para quem vê tudo isso funcionar a partir de dentro, como no meu caso, é até engraçado".

P - "Essa é a estrutura legalizada pela opacidade do Banco Central e da dívida pública. Mas e os negócios ilegais mesmo?".
R - "Não existe negócio que não seja intermediado por um banco, seja legal ou ilegal. Essa história de operador e doleiro é coisa da Lava jato e da imprensa para desviar a atenção da participação dos agentes financeiros. Os bancos são blindados porque inventaram um meio infalível de distribuir dinheiro para quem já tem muito poder e dinheiro. Falam de todo mundo menos de nós, que comandamos tudo... o poder do dinheiro. Na verdade, são os bancos os operadores e os doleiros, e todo dinheiro sai dos bancos, seja dinheiro limpo - na realidade, sempre dinheiro que foi tornado limpo -, seja dinheiro sujo... Aliás, parte do lucro dos bancos vem de lavar dinheiro e intermediar transações. Mas o grosso da grana vem do banco Central, da remunerações de sobras de caixa - que são ilegais, mas sobra as quais ninguém diz nada -, das operações de 'swap' cambial, dos títulos da dívida - enfim, o Banco Central é a nossa mãe. É tudo escancarado, mesmo com inflação zero e o país na ruína. Nosso lucro é legal, ou seja, legalizado, já que somos intocáveis e ninguém se mete conosco. Boa parte dos juízes e ministros de tribunais superiores, como todo mundo do meio sabe, advogam por interposta pessoa, e nós somos os principais clientes de alguns de quem paga melhor. São os bancos que pagam as eleições do Congresso quase inteiro. Ai você pode legalizar qualquer coisa,qualquer papel sujo que a gente mande ao Congresso os caras assinam. Nesse contexto, onde se pode tudo, as operações ilegais são uma parte menor dos lucros, mas obviamente existem... Os bancos controlam o que você vai fazer com o dinheiro e todo dinheiro pode ser rastreado... Mas ninguém quer saber, essa é a verdade. Como os bancos mandam na imprensa, nos juízes e nos políticos, a intermediação de todo dinheiro ilegal jamais é denunciada. E se for denunciar, você é acaba preso. Isso eu garanto".

P - "Cono funciona mandar dinheiro para propinas no exterior, por exemplo, para comprar gente em Angola, na companhia de Petróleo?".
R - "Você liga para o presidente de um banco [e cita, testando minha reação, o nome do presidente de um grande banco] e pergunta qual a comissão dele para fazer a remessa?.

P- "Assim, na cara de pau?", pergunto. "E como você acha que funciona?", indaga Sérgio, rindo e se divertindo com minha surpresa.
R - "Lembra daquelas malas do Geddel? Coo você acha que aquele dinheiro chegou naquele apartamento? Dinheiro não dá em árvore. Quem tem a possibilidade de fazer o dinheiro circular de um lugar para o outro são os bancos, mais ninguém. Não há nenhum caso de corrupção em que o dinheiro não venha de um banco. Ou seja, os bancos são os intermediários, sempre. A imprensa nunca toca nisso porque é tabu. Afinal, a imprensa é nossa."

P - "Como assim?"
R - "Vou lhe contar um caso... João estava com problemas com um jornalista, metido a investigador,  que publicava todo dia uma notinha chata sobre negócios nossos aqui em São Paulo. O João ofereceu milhões ao cara... mas o cara não aceitou. Foi um caso raro... O que fizemos? Compramos o jornal, um dos maiores do Brasil, e demitimos o fulano. Agora decidimos o que sai ou não, pois somos os donos do jornal... O jornal é literalmente nosso. Toda a imprensa hoje em dia é assim, de um modo ou de outro. Ou eles devem os olhos da cara aos bancos ou os bancos são os donos diretamente. Por isso não sai nada na imprensa contra os bancos. A imprensa é toda nossa: televisão,jornais, internet, o que você pensar."

P - "E com político e os juízes, como funciona?"
R - "Com os políticos você paga a eleição do cara e o que sobrar, se sobrar, porque toda eleição é mais cara do que se imagina, ele embolsa. Ai cobramos e montamos a agenda do cara. Ou então pagamos por serviço... num caso mais complicado, que precisa ser resolvido para os negócios andarem, você faz um depósito no exterior para vários ao mesmo tempo... Mas a gente não deixa rastro... "

P - "E com o poder judiciário?"
R - "Com os juízes os presentes funcionam que é uma beleza. O cara termina incorporando ao salário - afinal, é a manida deles... Na verdade, quando o advogado é muito rico, pode ter certeza que também enfia amão na merda... (advogado) para enriquecer de verdade, você tem de saber comprar promotores e juízes, além de advogados de outras empresas, para que escolham o seu escritório quando houver necessidade. A Lava Jato está cheia disso..."

P - "E como vocês recompensam os juízes?"
R - "É um pouco diferente, porque os caras são muito vaidosos, alguns se acham intelectuais. Quando o cara é muito vaidoso, o melhor método é pagar uma palestra com 100, 200 ou 300 mil reais, e ainda faz o cara se convencer de que é por sua cultura jurídica. Ou fazemos seminários internacionais com grandes jornais e revistas comentando e fotografando - ai eles piram. Ou então compramos diretamente a sentença."

P - "Você pergunta o preço da sentença e paga, assim, na cara de pau?"
R - "Como você acha que funciona? (retruca Sérgio, sempre se divertindo muito por estar dando aulas de sociologia prática da vida real). Vou lhe contar um caso... João queria abrir uma casa noturna em Florianópolis, só para se divertir. O diabo é que encasquetou de construir a boate num lugar que era área de proteção ambiental, o MP local encrencou e a história virou pendenga judicial. Ai tive de ir lá para acertar com o juiz. Quando deixei tudo combinado, o João mandou uma loura - que foi a favorita dele durante um tempo e depois passou a trabalhar com a gente, dessas muito bonita e de 1,80 de altura, como só tem no Sul - levar, numa bolsa grande dessas de marca, um milhão de reais, misturando reais e dólares... o fulano passou o fim de semana com a loura, ficou com o dinheiro e a mala, e o João construiu a boate onde queria. É assim que funciona com o Judiciário... Mas não foi uma experiência agradável, vou confessar, já que a moça foi humilhada de um modo meio violento... (ela e eu) começamos a discutir o modus operanti jurídico do caso com o juiz e mais dois auxiliares na própria sala do juiz, depois do expediente. Betina, era assim que a moça se chamava, era estudante de Direito e de vez em quando arriscava um palpite sobre o caso. A certa altura, o juiz se irritou e disse que ela não era advogada, mas puta, e estava ali para outro serviço. Na mesma hora, botou o pau para fora, na minha presença, e de outros dois, e mandou a moça chupar. Depois mandou que fizesse o mesmo com os dois funcionários. Em seguida entra um terceiro assistente, todos obviamente de confiança do juiz e de sua equipe "privada". Ao ver a moça ainda de joelhos e já com o vestido meio rasgado, lança um olhar entre divertido e intrigado à cena, e então o juiz interpela: 'Quer também?'. Ato contínuo, a moça cumpre pela quarta vez o mesmo ritual. Este pessoa adora um abuso, quase tanto quanto dinheiro."

P - "As mulheres sempre participam desse jogo?"
R - "Nem todo mundo gosta de misturar putaria e trabalho, mas se você for carente e cair nessa, está fodido... Mas tem muitos que gostam. Os estrangeiros, por exemplo, adoram. Passei um ano em Londres trabalhando como estagiário na área jurídica do mercado financeiro e lá a putaria é nais pesada. Onde tem muito dinheiro tem muita putaria. Pesada mesmo,todo tipo de coisa que você for capaz de imaginar... com muita droga e muita festa para todo tipo de gosto. Afinal, todas as máfias do mundo estão por lá... Londres é uma grande lavanderia atrás de uma fachada da realeza. Comparado com eles, somos amadores...

P - "E cabe a você comprar as pessoas para os negócios andarem?"
R - "Quem existe neste mundo que não é comprado de alguma forma? Comprar alguém bem comprado não envolve só dinheiro. Você tem que comprar uma relação de confiança. Sem isso, todo o dinheiro do mundo não conta. O João costuma dizer que quem manda no Brasil, a elite, não soma de mais de 800 pessoas, e que ele e eu conhecemos cada uma delas. Dessas 800 pessoas, 600 estão em São Paulo, 100 em Brasília e 100 no resto do Brasil... Um bom empresário ou banqueiro percebe a oportunidade quando ela aparece. Mas se você é muito bom, melhor que os outros, como no caso do João, então você tem que fazer com que a oportunidade aconteça só para você ou que você possa aproveitá-la antes dos outros. Este é o segredo do nosso negócio... Para isso servem as relações de confiança cultivadas ao longo dos anos."

Nenhum comentário: