sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

SOBRE MARIEL: DOIS VÍDEOS ESCLARECEDORES

Um, sobre os fatos. Outro, sobre um jornalismo mambembe. Saiu no Escrevinhador.

Dilma e o porto em Cuba: a diferença entre jornalismo e discurso panfletário

publicada sexta-feira, 31/01/2014 às 09:19 e atualizada sexta-feira, 31/01/2014 às 11:38
Do Escrevinhador
O Porto de Mariel, construído em Cuba em parceria com o Brasil, gerou polêmica nos últimos dias. O BNDES investiu US$ 802 milhões para o porto. Mais US$ 290 milhões serão destinados para a zona especial de desenvolvimento de Mariel.
A comentarista Rachel Sheherazade, apresentadora e comentarista do Jornal do SBT, fez duras críticas aos investimentos do governo. Jornalista brilhante, especialista em todos os assuntos, fez um comentário dura: “Parece que está sobrando dinheiro no Brasil, porque não tem limite a generosidade do governo com os estrangeiros”.
No final do comentário, a especialista em comércio internacional pergunta: “Por que financiar um porto em Cuba quando se os nossos portos estão sucateados e abandonadas?”
Heródoto Barbeiro, apresentador do Jornal da Record News, mais humilde, abriu mão de fazer comentários conclusivos e convidou para o programa um diretor da Fiesp, Thomaz Zanotto, para saber a opinião dos industriais.
Apesar de não serem tão sábios como a comentarista do SBT, os industriais têm interesses econômicos concretos e podem tecer avaliações sobre o assunto…  O diretor da Fiesp destacou que, o porto foi construído por empresas brasileiras, que forneceram também 80% dos materiais e equipamentos envolvidos na obra.
“Existe um interesse estratégico. O Brasil é um país sul-americano e tem bastante inserção na região. A inserção econômica do Brasil no Caribe ainda é pequena e pode melhor muito. E o porto é uma oportunidades para isso”, disse.
A sábia apresentadora do SBT, com seu discurso ideológico, precisa ter cuidado, para não passar a imagem de que é boneco de ventríloquo dos blogueiros “fofos” da Veja…
Heródoto Barbeiro, por sua vez, fez jornalismo e entrevistou um diretor da Fiesp, que apresentou informações relevantes sobre as vantagens para as empresas do Brasil investirem no porto.

Leia outros textos de GeralRadar da Mídia

UMA ARTIGO SOBRE O PORTO DE MARIEL, EM CUBA

Saiu no Blog do Miro:

Brasil, Cuba e o socialismo

www.escambray.cu 
Por Beto Almeida, de Havana

Tem sido extremamente educativo registrar, aqui em Havana, a reação do povo cubano diante da inauguração do Porto de Mariel. Expressando um elevado nível cultural, uma mirada política aprofundada sobre os fenômenos destes tempos, especialmente sobre a reunião de Cúpula da Celac que se realiza por estes dias aqui na Ilha, tendo como meta central, a redução da pobreza, os cubanos revelam, nestas análises feitas com desembaraço e naturalidade, todo o esforço de 55 anos da Revolução Cubana feita na educação e na cultura deste povo.

Mariel, uma bofetada no bloqueio 
Poderia citar muitas frases que colhi ao acaso, conversando com os mais diversos segmentos sociais, faixas etárias distintas, etc, mas, uma delas, merece ser difundida amplamente. O marinheiro aposentado Jorge Luis, que já esteve nos portos de Santos e Rio de Janeiro, que vibra com o samba carioca, foi agudo na sua avaliação sobre o significado da parceria do Brasil com Cuba para construir o Complexo Portuário de Mariel.

“Com Mariel, Brasil rompe concretamente o bloqueio imperialista contra Cuba”, disse. E adverte: “Jamais os imperialistas vão perdoar Lula e Dilma”. Ele não disse, mas, no contexto do diálogo com este marinheiro negro, atento ao noticiário de televisão, leitor diário de jornal, informado sobre o que ocorre no Brasil e no mundo, estava subentendido, por sua expressão facial, que ficava muito claro porque Dilma é alvo de espionagem dos EUA.

O tom da cobertura do oposicionismo impresso brasileiro, pré-pago, à inauguração do Porto de Mariel, não surpreende pela escassa informação que apresenta, muito menos pela abundante insinuação de que tratar-se-ia apenas de um gasto sem sentido, indefensável, indevido. Ademais, sobram os rançosos preconceitos de sempre, afirmando que o Brasil estaria financiando a “ditadura comunista”, tal como este oposicionismo chegou a mencionar que seria esta a única razão para empreender um programa como o Mais Médicos, que salva vidas e que tem ampla aprovação da sociedade brasileira.

 É necessário um jornalismo de integração
Informações objetivas sobre o significado e a transcendência do Complexo Portuário de Mariel certamente faltarão ao povo brasileiro. Primeiramente, porque o oposicionismo midiático não permitirá sua difusão, numa evidente prática de censura. E, por outro lado, nem o PT ou as forças que sustentam politicamente o governo Dilma e estas iniciativas robustas da política externa brasileira, com tangíveis repercussões sobre a economia brasileira, possuem uma mídia própria para esclarecer o significado de Mariel, ante um provável dilúvio de desinformações sobre a sociedade brasileira.

Primeiramente, deve-se informar que o financiamento feito pelo BNDES, algo em torno de um bilhão reais na primeira fase, não se trata de uma doação a Cuba. É um empréstimo, que será pago. As relações bilaterais Brasil-Cuba registram crescimento contínuo nos últimos anos.

Além disso, está condicionado à contratação de bens e serviços na economia brasileira, além de envolver cerca de 400 empresas, sendo, portanto, um dos fatores a mais que explicam porque há contínua expansão no mercado de trabalho brasileiro, com uma taxa de desemprego das mais baixas de sua história. Ao contrário do que ocorre, por exemplo, na Europa, onde aumenta o desemprego e há eliminação de direitos trabalhistas e sociais conquistados décadas atrás.

Dinamização das forças produtivas
Além disso, Mariel vai ser - por enquanto , Dilma inaugurou apenas a primeira fase - o maior porto do Caribe, com capacidade para atracar navios de calado superior a 18 metros, e também , podendo movimentar mais de 1 milhão de conteiners por ano. Terá um impacto especial para o comércio marítimo também direcionado ao Pacífico, via Canal de Panamá. Para isto, vale lembrar da importância da participação da China, crescente, na economia latino-americana, em especial com o Brasil.

Tanto o gigante asiático como empresas brasileiras, já manifestaram interesse em instalarem-se na Zona Econômica Especial a ser implantada em Mariel, onde também já foi construída uma rodovia moderna, estando em construção, uma ferrovia. De alguma maneira , Havana retoma uma posição de destaque no comércio marítimo internacional, pois já foi o maior porto da América Latina, ponto de conexão de várias rotas, tendo sido, por isso mesmo, uma cidade com mais de 70 por cento de habitantes portugueses, quando Portugal era um grande protagonista na marinha mercante internacional. Havana já teve, também, uma das maiores indústrias navais do mundo.

Cuba sempre impulsionou a integração
O tirocínio do marinheiro negro Jorge Luis é perfeito. Depois de suportar décadas de um bloqueio que impediu os cubanos a compra de uma simples aspirina no maior e mais próximo mercado do mundo, os EUA, a Revolução Cubana, tendo resistido a ventos e tempestades, sobretudo às agressões imperialistas, soube preparar-se para esta nova etapa da história, simbolizada pela existência de uma Celac que vai se consolidando, pouco a pouco. Não sem enfrentar ações desestabilizadoras, lançadas contra os países mais empenhados na integração regional latino-americana, como Venezuela, Bolívia, Equador, e, também, pelas evidentes ações hostis contra Brasil e Argentina.

Cuba investiu parte de seus modestos recursos na solidariedade internacional. Seja no envio de 400 mil homens e mulheres para derrotar o exército racista da África do Sul que havia invadido Angola, como também para promover, em vários quadrantes, com o envio de professores, métodos pedagógicos, médicos e vacinas, a eliminação do analfabetismo e o salvamento generalizado de vidas. É o caso, por exemplo, do programa Mais Médicos, não por acaso tão injustamente desprezado pela oligarquia midiática, que vocaliza os laboratórios farmacêuticos multinacionais. Como defender que salvar vidas merece desprezo?

É certo que todas as economias caribenhas e latino-americanas serão dinamizadas com a entrada em funcionamento do Porto de Mariel, gerando mais empregos, possibilitando novas opções comerciais. É emblemático que China esteja firmando um acordo estratégico de cooperação com a Celac. Para uma economia cercada de restrições, sem capacidade de investimentos, sem engenharia nacional para fazer esta obra por conta própria, o Porto de Mariel, é um imenso descortinar de possibilidades para Cuba.

Os gigantescos navios chineses, de uma China que consolida sua posição como a segunda potência comercial mundial, não podiam mais aportar no velho Porto de Havana, o que resultava numa limitação operacional e logística, com impactos econômicos negativos de grande monta. O Porto de Havana será readaptado para o turismo e a economia cubana, no seu conjunto, recebe, com Mariel um enorme impulso para a dinamização de suas forças produtivas. A atendente do hotel onde estou instalado me confessava hoje o interesse de ir trabalhar em Mariel, porque, segundo disse, o futuro está por ali e são empregos mais promissores. 

Mariel e seus impactos internacionais
Realmente, para um economia que perdeu a parceria que tinha com a União Soviética, que resistiu durante o período especial com as adaptações inevitáveis para salvar o essencial das conquistas da Revolução, o que Mariel significará é de extraordinária relevância. E é exatamente na dinamização das forças produtivas da Revolução Cubana que se localizam as chaves para muitas portas que podem ser abertas para uma maior dedicação de meios , recursos e iniciativas visando a integração latino-americana. E, neste quebra-cabeças, a política estratégica implantada por Lula, continuada por Dilma, é, inequivocamente, muito decisiva. Que outro país poderia fazer um financiamento deste porte para a construção de Mariel?

Por último, pode ser muito útil uma reflexão sobre os diversos pensadores, formuladores e também executores de políticas de integração. Desde Marti, aquele analisou a importância da “nossa Grécia”, numa referência ao significado da civilização Inca, mas que também formulou o conceito de Nuestra América, até chegando ao pensamento de Getúlio Vargas, criador do BNDES, o banco estatal de fomento que está financiando a construção do Porto de Mariel, uma estupenda ferramenta integradora.

Tudo converge para a abertura de uma nova avenida para dar trânsito à integração. Seja pela sabedoria dos povos da região que estão sabendo apoiar, com o seu voto, os governos que mais impulsionam estas políticas, seja pelos avanços concretos que estas políticas integradoras têm registrados, apesar da insistência nada profissional do jornalismo de desintegração em reduzir tudo a zero.

Futuro socialista
A força e a necessidade histórica das ideias se vêm comprovadas nesta inauguração da primeira etapa do Porto de Mariel, em plena reunião da Celac, sem a presença de Estados Unidos e Canadá, patrocinadores históricos da desintegração entre os povos. A simbologia da justeza histórica do pensamento martiniano, nos permite, agora, afirmar, também, que José Marti é um dos autores intelectuais de Mariel. E, retomando o otimismo realista do marinheiro Jorge Luis, constatamos que a dinamização das forças produtivas da Revolução Cubana que a parceria entre Cuba e Brasil possibilita, foi estampada na frase final do discurso do presidente cubano, General Raul Castro:

“Mariel e a poderosa infraestrutura que o acompanha são uma mostra concreta do otimismo e da confiança com que os cubamos olham o futuro socialista e próspero da Pátria”. O marinheiro negro captou o significado essencial destes dias. Não por acaso, a Marcha das Tochas, que celebra com chamas que não se apagam, as ideias de Marti, em seu aniversário, ontem - com mais de 500 mil manifestantes, maioria esmagadora de jovens - teve, na primeira fila, além de Raul, os presidentes Evo Morales, Nicolás Maduro, Pepe Mujica, Daniel Ortega. As ideias de Marti, materializadas nestes avanços produtivos e integradores, como Mariel, vão iluminando o futuro socialista de Cuba e, com isto, da integração latino-americana.

* Beto Almeida é membro do Diretório da Telesur

AS NUVENS NO HORIZONTE ECONÔMICO INTERNACIONAL

Veja, do New York Times, este artigo do Paul Krugman sobre a Turquia, e este, de um Keith Bradsher, sobre a China. Para ajudar a ver o que vai acontecendo lá fora no que interessa ao Brasil. De notar a subida dos juros na Turquia, e a concorrência entre a produção doméstica e a importação de mercadorias pela China.

SOBRE AS VAQUINHAS PARA PAGAR AS MULTAS

Eu contribui com o Genoino, agora sobrou para o Delubio, cuja vaquinha sobrou e vai contribuir para João Paulo e Dirceu. É uma ção política que faz tempo não acontece. Veja o que escreve Fernando Brito:

O que a “vaquinha” por Genoíno e Delúbio ensina? O que o PT esqueceu…

31 de janeiro de 2014 | 10:43 Autor: Fernando Brito
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Os jornais não disfarçam seu espanto com as doações públicas para que José Genoíno, primeiro, e agora Delúbio Soares paguem as multas que receberam do Supremo Tribunal Federal.
Claro que pode até haver alguma mutreta de algum depósito feito por gente “muy amiga” para desmoralizar a arrecadação de fundos, e é bom que se verifique isso.
Mas nenhuma eventual “armadilha” nesta “vaquinha” esconde o seu principal ensinamento.
Se o protagonismo de José Genoíno nas lutas contra a ditadura, seu drama pessoal de saúde e a comovente solidariedade de sua família – sua filha Miruna tornou-se um símbolo de integridade e amor filial – o que poderia explicar o apoio público de Delúbio Soares, um colaborador de segundo escalão do PT e o que mais foi vilanizado em toda esta história do chamado “mensalão”.
A lição preciosa deste episódio é algo que, ao longo do tempo, boa parte da direção do PT parece ter se esquecido.
A de que existe uma militância política que não precisa ser paga – e que até paga, ela própria, do jeito que pode – para apoiar um partido, porque apóia as ideias e o significado destas ideias sobre a vida dos brasileiros.
A de que existe, fora da mídia e do mercado, gente que tem opinião valores, que entende que existe uma luta de afirmação deste país e que está aí, pronta e ansiosa por quem a mobilize p or uma causa, mesmo que a espinhosa causa de apoiar quem foi condenado num processo que, embora político até a medula, foi sentenciado num tribunal.
A “vaquinha” não foi contra a justiça nem por piedade humana.
Foi um gesto político, mostrando que há milhares de pessoas prontas a deixar seu conforto, seus interesses pessoais e a se expor, corajosamente, por uma causa que não é a figura de Delúbio ou mesmo a de José Genoíno, com todo o brilho e respeito que ela merece.
A causa é o processo de transformação do Brasil.
Pela qual, meu deus, parece que muitos dirigentes políticos, acham inútil levantar orgulhosamente a bandeira.
Reduzem a política a acordos, posições, verbas, favores, influência e – sejamos sinceros – recursos para candidaturas.
É claro que na prevalência dantesca  que o dinheiro assumiu na vida política brasileira, só um tolo teria a ilusão de que uma campanha – sobretudo as majoritárias – pudesse funcionar apenas com “vaquinhas”.
Os grandes doadores, com a impureza de intenções com que doam, continuarão a ser fonte essencial de financiamento de campanhas, enquanto não se adotar o financiamento público que a direita tanto combate.
As pequenas doações desta “vaquinha”, porém, revelam algo além de seu valor monetário e que não deve ser comemorado, mas ser, sim, objeto de reflexão.
Há quanto tempo o PT e o governo que, sob sua legenda, o povo brasileiro elegeu e reelegeu, não faz uma “vaquinha cívica” pelas causas que o levaram até lá?
Há quanto tempo não se dirigem à opinião pública para dizer que precisam da pequena mobilização que cada um pode dar para criar um caudal de vontade que sustente as mudanças?
Onde está a polêmica, a contestação ao que o coro da mídia diz – como disse dos acusados no “mensalão” – de que tudo está errado e o status quo é perverso, mau e contrário aos direitos do povo brasileiro?
Não é preciso ser radical ou furioso, mas é preciso ser firme e claro.
Os líderes políticos – e os governos que sob sua liderança se erigem – têm um papel didático e mobilizador a desempenhar para com o povo brasileiro.
Sem bandeiras, ele não se une, mas está pronto a unir-se quando estas se levantam, mesmo que absolutamente “contra a maré”, como ocorreu nestes casos.
Precisamos, urgentemente, de uma “vaquinha cívica” pelo Brasil.
Pelo projeto de afirmação que se expressa no desenvolvimento, onde o Estado – e apenas ele – é o fio condutor de políticas eficazes e justas, porque o “santo mercado” é, historicamente, incapaz e mesquinho para tudo o que não seja dinheiro rápido e cego para qualquer visão estratégica de Nação.
Assistimos o Estado brasileiro e suas ferramentas de progresso econômico – a Petrobras, o BNDES, a Caixa, a Eletrobras, o Banco Central – serem diariamente massacradas nos jornais e nas tevês e não vemos, quase nunca fora das campanhas eleitorais, buscar-se a solidariedade da população.
Uma solidariedade que existe e que vive adormecida pela incapacidade – ou opção errônea – de não ser anunciada aos quatro ventos, em lugar de serem gaguejadas explicações e “desculpas” aos senhores do poder real: o poder econômico.
Uma solidariedade que precisa ser despertada, sob pena de que também os nossos sonhos venham a ser condenados.

SERÁ QUE O GOVERNO FEDERAL VAI PARAR DE CRIAR CUERVOS?

Do O Cafezinho:


O ataque da Globo aos “blogs sujos” e as chances de um mundo novo

Enviado por  on 31/01/2014 


É o tipo de matéria para ler com um brilho malicioso nos olhos. Quer dizer que a toda poderosa Globo está mesmo preocupada com os “blogs sujos”? Aliás, que sintomático a Globo usar a mesma expressão usada por José Serra, em 2010, para se referir aos blogs políticos que lhe davam combate.
A pretexto de escrever sobre a demissão de Helena Chagas, atual chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, e sobre uma possível mudança de rumo na política de comunicação da presidência da república, a Globo mostra todo seu pavor de perder a “boquinha” que, há décadas, mantém junto à Viúva.
Em matéria estampada na capa do site, a Globo dispara alguns comentários sobre os “blogs sujos” que, evidentemente, foram sopesados a dedo para nos prejudicar. Mas acabam nos dando mais cartaz do que talvez merecemos. Por isso o brilho malicioso nos olhos.
Trecho em questão:
*
Em uma das reuniões do presidente do PT, Rui Falcão, com a bancada e integrantes do Diretório Nacional, para discutir saídas para a crise depois das manifestações de junho, houve um debate sobre pontos fracos na equipe ministerial, com críticas à comunicação do governo e da presidente. A reclamação era em relação à pequena margem de financiamento dos chamados “blogs sujos”, que fazem o enfrentamento com a mídia tradicional e atacam a oposição.
— A comunicação do governo é uma porcaria! O governo não tem a estratégia de comunicação nas redes sociais. O Lula mantinha uma canalização de recursos para alguns blogs, mas a Dilma cortou tudo — reclamou naquela reunião o vice-presidente da Câmara, André Vargas (PR), segundo petistas presentes.
Na época, Vargas desmentiu as críticas, mas nesta quinta-feira, diante da notícia da saída de Helena Chagas, disse ao GLOBO:
— Não gosto dela. A Helena foi pro pau! Beleza.
*
Eu gostaria muito que algum órgão de pesquisa, público ou privado, fizesse uma investigação sobre todas as verbas que a Globo recebeu do Estado desde a sua fundação, em 1925. Receio que chegaríamos a uma cifra próxima ao PIB do Brasil em 2013.
Tive o privilégio de ler a História da Imprensa Brasileira, de Nelson Werneck Sodré, onde o historiador fala sobre as campanhas da imprensa contra Getúlio Vargas. O “mar de lama”, expressão que a mídia hoje substituiu por “mensalão”, eram os financiamentos que o Banco do Brasil teria concedido a Samuel Wainer, para ele fundar a Última Hora.
Sodré levanta exatamente a quantia emprestada à Wainer.  E revela a indescritível hipocrisia dos jornais: todos haviam, obtido, em seu nascimento, polpudos empréstimos do mesmo Banco do Brasil. Maiores, inclusive, do que os dados à Última Hora. Mas não de Vargas e sim de governos anteriores. Por isso o apego da nossa imprensa à “República Velha”.
Mais tarde, alguns jornais brasileiros passariam a contar com uma outra segura fonte de renda. Os EUA passam a injetar dinheiro, ilimitadamente, na mídia brasileira.
O tempo passa, a ditadura termina, vem a redemocratização, e os mesmos grupos de mídia continuam drenando para si quase toda a verba publicitária federal.
Lula e Dilma deram 6 bilhões de reais à Globo.  É estatística. De 2000 a 2012, a Globo recebeu 54,7% de toda a verba federal no período. É evidente que se trata de uma caso absurdo de concentração, estimulada pelo Estado.
A Constituição Brasileira tem cinco fundamentos e um deles é o “pluralismo político”; não creio que este fundamento esteja sendo rigorosamente cumprido pelo Estado, quando se trata de propaganda federal.
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Além de receber tal quantidade de verbas, a Globo agora também resolveu intimidar os blogs. O seu diretor de jornalismo, Ali Kamel, vem processando vários blogueiros, inclusive eu, pedindo indenização financeira. Meu julgamento em primeira instância acontece no dia 11 de fevereiro. Ali Kamel quer me arrancar 41 mil reais, ou seja, quase a minha renda de um ano.
A Globo recebe dinheiro do Estado e o usa para pagar advogados que tentam sufocar financeiramente os “blogs sujos”.
Essa é a situação que a Globo quer manter por tempo indeterminado.
O curioso é a decisão da Globo em centrar fogo nos blogs. A Secom de Dilma cortou verba, sim, mas não para os blogs, que nunca a tiveram (com exceção de Reinaldo Azevedo e Noblat, sempre ricos em propaganda estatal), mas para toda a mídia alternativa: jornais médios ou pequenos, sites de notícia, revistas, agências. A Secom até passou a distribuir verba a alguns sites e blogs, mas em geral espaços neutros, tipo “Bolsa de Mulher”. Ou pior, aplicando os recursos no Adsense, do Google, o que apenas ajuda os EUA a ficarem ainda mais poderosos.
Não vou cair, na armadilha da Globo de criminalizar Helena Chagas. Mantive o bom combate contra o que ela representava, fazendo críticas duras, mas sempre de maneira democrática e elegante. Muito esperta a estratégia da Globo, de transformar Helena Chagas em heroína mal compreendida, atacada por vilões truculentos do PT, possivelmente para incentivá-la a assumir posições políticas de oposição. Aposto que a estratégia será repetida em toda grande imprensa.
Entretanto, Helena Chagas fazia o que fazia por orientação de Dilma Rousseff. Minhas críticas, portanto, tinham como endereço a própria presidente da república e seu entorno. Se não deixei isso claro antes, faço-o agora.
Pela mesma razão, cumprimento agora Dilma pela decisão de substituir Helena Chagas.  Antes tarde do que nunca.
Quanto aos recursos da Secom, espero que assuma uma posição mais generosa em relação à imprensa alternativa.
Que tenha um olhar mais humano e mais democrático em relação à fauna midiática nacional.
Que libere recursos para os jornais e sites de movimentos sociais, sindicatos e cooperativas, inclusive daqueles que lhe fazem oposição.
Que estimule o surgimento de blogs de pesquisa universitária, educação e cultura.
Uma iniciativa ousada e moderna, por exemplo, seria o governo incentivar, via editais monitorados por escritores e acadêmicos, a criação de centenas de blogs de ficção literária. De crítica de cinema. De crítica de artes plásticas!
A Secom poderia incentivar o surgimento de blogs escritos por médicos, psiquiatras e dentistas, devidamente monitorados por algum conselho do setor, para ajudar os internautas a conhecer suas doenças e respectivos tratamentos. Blogs voltados para estimular o empreendedorismo, ou discutir mobilidade urbana e economia sustentável!
E que faça anúncios, por que não?, em blogs políticos de esquerda!
A nova Secom pode ajudar o Brasil, enfim, a incrementar sua produtividade intelectual e aprimorar seu desenvolvimento na área de tecnologia das informações.
Enquanto a Globo se preocupa se os “blogs sujos” vão receber alguns trocados, a sociedade brasileira está preocupada se haverá ou não um dia uma oferta mais rica e mais plural de informações.  Quer acesso a conhecimentos, dados e opiniões diferentes daqueles propagados diariamente na grande mídia.
Sei o quanto essas ideias parecem utópicas, ingênuas. Mas sonhar não custa nada.
De qualquer forma, desejo bom trabalho a Thomas Traumann, novo ministro da Secom; que não esqueça a lição de T.S.Eliot: “Aqueles que confiam em nós, nos educam.”
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Thomas Traumann
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quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

POLÍTICO FERNANDO HADDAD

Fernando Haddad é um político do PT que não pertence à velha guarda que fundou o partido (era muito jovem na ocasião). Não foi parte nos embates entre facções que desembocaram na hegemonia dos grupos centristas chefiados por Lula e José Dirceu.

Veio da academia para o PT e para os cargos em administrações petistas, primeiro na prefeitura de Marta Suplicy, depois como Ministro da Educação nos governos Lula e Dilma. Foi eleito o terceiro prefeito do PT em São Paulo. Os anteriores, Luiza Erundina e Marta Suplicy, não conseguiram eleger seus sucessores. Nisso assemelham-se aos prefeitos que foram eleitos por outros partidos na cidade: os eleitores do município punem os políticos que não resolvem, nem mudam a dinâmica das coisas o suficiente para que os cidadãos sintam que finalmente a cidade pelo menos deixou de piorar. Esta a maldição da cidade contra os que ousam pedir (e ganhar) o seu voto. Será que Haddad vai conseguir mudar essa percepção?

Ele tem mostrado uma tendência de afirmação. Em uma cidade dominada por interesses privados, isso seria um bom sinal. A vacilada na questão do aumento das tarifas de transporte público quando ele primeiro insistiu na questão técnica de cobrir custos e só depois de muita manifestação e quebradeira voltou atrás revogando o aumento, dá algumas pistas sobre a forma de agir do político Haddad. 

Primeiro, e antes de tudo: É um político do sistema. Não escolhido pelo sistema, mas tolerado, e que procura sempre conciliar os interesses estabelecidos nesse mesmo sistema. Além de evidentemente não ser revolucionário, sua ação não tem sido realmente reformista. Como o PT como um todo, trabalha dentro das regras que perpetuam o domínio da política pelos interesses concentrados de sempre, e além disso não toma qualquer iniciativa para alterar as relações de poder que encontrou. No discurso e em voz baixa, os políticos do PT desafiam a correlação de forças. Mas não agem efetivamente para alterá-la.

Dada esta condição, ele tem tomado inciativas para melhorar a situação dos mais pobres e dos excluídos na cidade. Tentou mudar um imposto em que é possível uma certa redistribuição, o IPTU, nada que seja destoante com o que já outras grandes cidades do mundo. Desafiando o enfoque de repressão violenta aos usuários de drogas do governo do estado, deu início a um programa com um custo inicialmente mais alto mas possivelmente mais eficiente se levados em conta mais fatores, de tentativa de recuperação dessas pessoas.

Essa postura de confronto de estilos pode ter amadurecido depois do episódio das jornadas de junho, quando um bando de black blocs ou o que seja cercou o prédio da prefeitura no centro da cidade, iniciando uma depredação da fachada e ameaçando invadir, e a Polícia Militar de Geraldo Alckmin fez corpo mole em atender ao chamado para dispersar o bando, enquanto estragos já eram feitos. Uma guerrinha entre estado e prefeitura.

Outra iniciativa que tem algo de desafio, desta vez em relação aos donos de automóveis veio também da pressão daquelas manifestações, que afinal começaram políticas, contra as tarifas e as deficiências do transporte público em São Paulo: a instalação de algumas centenas de quilômetros de vias exclusivas de ônibus nas já saturadas ruas e avenidas da cidade. A prefeitura sabe, já admitiu, que antes de melhorar, a situação tende a piorar para a cidade como um todo. Mas os usuários de ônibus estão sentindo uma melhoria nos tempos de seus percursos. Muitos mais ônibus deixaram de estar ilhados em um mar de carros congestionados.

Com tudo isso, a avaliação de Fernando Haddad nas pesquisas de opinião anda baixa, muito baixa. A resposta do prefeito é que me leva a ter uma boa dose de simpatia para com ele. É mais ou menos que não trabalha tendo em vista a reeleição, mas sim para fazer o que acha certo. Isso é bom. Só acho que, já que o objetivo é mais elevado, o interesse público mais do que o resultado das próximas eleições, ele teria que chutar bem mais o pau da barraca. A ver.





MINHA CASA MINHA VIDA: TUDO BEM?

Este artigo, que saiu no site Carta Capital, mostra como o capital tem feito prevalecer seus interesses mesmo em um programa cuja motivação é correta mas sem os dentes de uma verdadeira política habitacional urbana.


Como não fazer política urbana

Após anos do Minha Casa Minha Vida, déficit habitacional aumentou em quase 1,5 milhão de moradias
por Ana Paula Ribeiro, Guilherme Boulos e Natalia Szermeta — publicado 30/01/2014 06:05
Tânia Rêgo / ABr
Minha Casa Minha Vida
Obra erguida por meio do Minha Casa Minha Vida na comunidade da Mangueira, no Rio de Janeiro
Sem alarde, no apagar das luzes de 2013 foi lançado pela Fundação João Pinheiro o novo estudo do déficit habitacional brasileiro, que é o indicador oficial utilizado pelo Ministério das Cidades. Os dados, apesar de serem os mais recentes disponíveis, referem-se a 2010. Mas, mesmo defasados, são reveladores: o déficit habitacional do país aumentou após o Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV)
Em 2008, o número de famílias sem moradia no país era de 5.546.000 de acordo com o Ministério das Cidades. Em fevereiro de 2009, foi lançado o Programa MCMV com a promessa de redução drástica destes números. Ao final de 2010, o MCMV havia atingido a meta de 1 milhão de casas construídas ou contratadas. Resultado: o número de famílias sem moradia no final de 2010 era de 6.940.000. Após 1 milhão financiadas pelo governo, a carência de moradias no Brasil aumentou praticamente 1,5 milhão. Como pode?
A realidade desafiou a matemática. Mas não a lógica. A lógica da política urbana brasileira transforma qualquer programa habitacional em pano de enxugar gelo. O MCMV, mesmo com sua dimensão significativa, não fugiu à regra.
Na última década o setor imobiliário – construtoras, incorporadoras, proprietários de terra urbana – foi da água ao vinho no Brasil. Nunca teve um crescimento tão potente e tantos estímulos do poder público. O investimento em imóveis superou a rentabilidade de todas os outros investimentos financeiros e, de 2008 a 2013, rendeu cinco vezes acima da inflação. Enquanto a Bovespa, no mesmo período, teve desvalorização de 12%, o valor médio dos imóveis em São Paulo subiu 195% (Fipe/Zap).
O acesso maior ao crédito, pilar do lulismo, foi importante para isso. Mas ainda mais decisivo foi a injeção de recursos públicos por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do BNDES nas grandes construtoras. O BNDES financiou a expansão e internacionalização das Cinco Irmãs (Odebrecht, Camargo Correia, OAS, Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão). Elas abriram capital na bolsa, adquiriram um imenso banco de terras e expandiram seus horizontes para outros ramos como a telefonia, a geração de energia elétrica e a petroquímica.
Mas, diz a máxima: bonança de uns, penúria de outros. O fortalecimento rápido e intenso do capital imobiliário trouxe um alto preço a pagar aos trabalhadores urbanos. Enquanto as corporações imobiliárias faturavam bilhões, ampliando sua teia de investimentos nas grandes cidades do país, os moradores destas regiões foram arrastados por um turbilhão.
Na medida em que os construtores, ao investirem em terras o dinheiro das ações vendidas com a abertura de capital, tornaram-se também os maiores proprietários de imóveis urbanos e passaram a ter em suas mãos a faca e o queijo da política urbana. Se têm as terras, podem definir o que farão em cada uma delas. Aqui, um condomínio de elite, ali um novo shopping, acolá habitação popular. Ou seja, o direcionamento da expansão e remodelação urbana tornou-se ainda mais refém dos interesses privados e de mercado.
Com isso, regiões inteiras foram reconfiguradas sem aviso prévio aos que sempre estiveram por lá. Bairros antes periféricos viram, atônitos, torres serem erguidas ao seu lado. Novos moradores, novo perfil, novos preços. Com os investimentos de mercado veio a inflação descontrolada do valor dos aluguéis. Alguns bairros da periferia paulistana viram nos últimos cinco anos o valor médio do aluguel dobrar ou triplicar.  O mesmo se deu no Rio de Janeiro e em outras capitais.
Assim cresceu o déficit habitacional, configurado por uma explosão no valor dos aluguéis inclusive nas periferias urbanas. O morador do Campo Limpo (zona sul) ou Itaquera (zona leste) que pagava 400 reais de aluguel viu o boleto aumentar para 700 reais, mas o salário não. Das três situações seguintes, foi forçado a uma: ou comprometeu mais da metade dos ganhos familiares para arcar com este aumento; ou teve de ir viver em condições muito precárias, ainda mais longe; ou recorreu ao cômodo do fundo da casa de um parente, ao barraco em uma ocupação.
Nos três casos passou a fazer parte da cifra do déficit habitacional. Assim a lógica explica a matemática. Mesmo 1 milhão de novas casas não é capaz de compensar as outras 2,5 milhões de famílias jogadas à própria sorte pela ofensiva do capital imobiliário. Podem construir mais 2 ou 5 milhões e o déficit continuará aumentando se a política urbana não estabelecer limites às forças do mercado, ao invés de estimulá-las.
Mas é o progresso! Como ir contra ele? Seremos contra a ampliação do metrô, que também gera especulação? Contra urbanização de favelas? Melhorias urbanas em geral? O capital costuma sempre jogar a pecha do atraso em qualquer obstáculo a seu desenvolvimento.
É evidente que melhorias de infraestrutura, serviços urbanos e condições de vida são imprescindíveis e devem ser inclusive aceleradas de forma profunda. Mas junto a elas é preciso vir medidas regulatórias do poder público para conter o capital imobiliário e a expulsão dos trabalhadores para regiões ainda mais periféricas.
A medida mais urgente para parar com este trabalho de Sísifo é uma política de controle da elevação dos aluguéis urbanos. Medida que, em tempos neoliberais, tem um ar quase comunista. Mas que, aqui mesmo no Brasil, foi tomada em 1921 pelo governo Epitácio Pessoa, que definitivamente não era comunista. Durante os governos Vargas foi retomada por sucessivos decretos. Leis de controle do aluguel vigoraram no país até o período militar, que enterrou-as de vez.
Estabelecer o índice inflacionário como teto para reajuste nos contratos de aluguel é algo não apenas possível como urgente e necessário.
Assim como o é a aplicação das diretrizes já estabelecidas pelo Estatuto das Cidades, em 2001. Desapropriação compulsória, exercer o direito de preempção, dação em pagamento, IPTU progressivo, enfim uma série de medidas de controle à livre especulação que a legislação atual já permite.
As prefeituras e câmaras municipais, responsáveis pela aplicação do Estatuto via Planos Diretores, são, entretanto, frequentemente embaixadas do mercado imobiliário. Maiores financiadoras de campanhas eleitorais do Brasil, as construtoras têm muitos agentes públicos literalmente em seus bolsos. Esperar que as mudanças partam daí é ilusão.
Enquanto o capital imobiliário for o grande agente da remodelação urbana, livre de regulamentações mais efetivas, qualquer política está fadada ao fracasso. Aumentam os recursos para urbanização de favelas e saneamento, mas novas favelas surgem em escala ainda maior. Aumentam a meta do MCMV, mas a cada dia surgem novos sem-teto que não podem mais suportar os aluguéis abusivos.
No caso do MCMV há ainda seus problemas genéticos. Foi feito sob encomenda para salvar o setor imobiliário diante da crise de 2008 e suas regras são por isso voltadas para o interesse privado. Tem seus méritos, é verdade. Nunca volume tão grande de subsídios foi direcionado à habitação popular na história brasileira. A modalidade Entidades, apesar de com menos recursos e mais burocracias, aponta também alternativas à lógica privatista. Mas de forma geral o programa atende mais à lucratividade dos empresários que a perspectiva de solucionar o déficit habitacional.
Vejamos como se dá este processo. O MCMV estabelece um valor fixo por unidade habitacional que destina para os empreendimentos. Em São Paulo, este valor é de 76 mil reais. Ou seja, se uma construtora apresenta um projeto de mil apartamentos, o valor repassado será de 76 milhões. Para repassar este valor, o programa estabelece padrões mínimos: tamanho das unidades, especificações técnicas, etc. Uma vez que o projeto cumpra estes requisitos básicos será aprovado.
Se a construtora apresenta um projeto de apartamentos de 39 m², que é o mínimo estabelecido para a Faixa 1 (famílias com renda inferior a 1,6 mil reais), ou se apresenta com 60 m² o valor pago pelo programa será o mesmo, 76 mil reais por unidade. Ou seja, na medida em que os agentes dos empreendimentos são construtoras, que buscam rentabilidade e não qualidade da moradia, é mais do que óbvio que as moradias não terão 1 milímetro a mais que o mínimo. Assim ocorre. O MCMV, portanto, estimula a habitação popular de baixa qualidade.
Se a construtora tem um terreno num bairro mais valorizado e com mais acesso a serviços e outro no fundão da periferia, o MCMV irá repassar o mesmo valor por unidade nos dois casos. Obviamente as construtoras estão destinando seus piores terrenos para habitação popular. Estimulam com isso a periferização, o crescimento da especulação imobiliária e a piora da qualidade de vida dos trabalhadores. É isso que ocorre quando o interesse privado se sobrepõe ao interesse social.
Pior ainda: mesmo com este maná, os empresários brasileiros fazem manha, querem ainda mais e chantageiam o governo, que não responde à altura. Historicamente, o capital brasileiro acostumou-se ao capitalismo sem riscos, onde o Estado deve mimá-los sempre mais. Por isso, como a lucratividade da Faixa 1 é menor que da Faixa 2 (até 3,1 mil reais), apesar de ser elevadíssima, seguram os projetos para Faixa 1.
Dado divulgado este mês pelo Ministério das Cidades revelou que da meta do MCMV2, 75% das unidades foram contratadas na Faixa 2 e apenas 15% daquelas previstas para a Faixa 1. Nunca é demais lembrar que a tal Faixa 1 responde por mais de 70% do déficit habitacional brasileiro.
Assim podemos concluir sem rodeios que enquanto não houver um enfrentamento ao setor imobiliário, por meio de uma política urbana ousada e regulatória, as políticas públicas de habitação e urbanização continuarão sendo desafiadas pela matemática. O que o Estado der com uma mão o mercado tira com duas.
Guilherme Boulos é integrante da Coordenação Nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) e militante da Frente de Resistência Urbana; Natalia Szermeta é integrante da Coordenação Estadual do MTST e militante da Frente de Resistência Urbana;Ana Paula Ribeiro é integrante da Coordenação Estadual do MTST e militante da Frente de Resistência Urbana.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

COMBATE À CORRUPÇÃO: UMA ARMA

Esta entrevista saiu no site da Carta Capital:

Entrevista - Jorge Hage

"Lei Anticorrupção vai mudar a atitude do empresariado brasileiro”

Em entrevista a CartaCapital, o ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, se diz otimista com a legislação que pune empresas com mais rigor e entra em vigor nesta quarta
por Piero Locatelli — publicado 29/01/2014 05:54, última modificação 29/01/2014 09:32
Agência Brasil
Empresas envolvidas em corrupção terão punições mais severas a partir desta quarta-feira 29, quando entra em vigor a chamada Lei Anticorrupção. Focada no corruptor, a nova legislação determina que as companhias devolvam aos cofres públicos os prejuízos causados por atos ilícitos, além de estipular a aplicação de multas e até o fechamento delas em casos mais graves. As companhias também serão responsabilizadas por atos ilícitos dos seus funcionários, ao contrário do que ocorre hoje.
Segundo o ministro-chefe da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage, “não existe nenhum remédio milagroso”, mas as novas regras devem fazer as empresas coibirem as práticas ilícitas. “A lei vai contribuir com a mudança de atitude e mentalidade do empresariado brasileiro,” diz o ministro. Em entrevista a CartaCapital, o ministro fala da aplicação da lei em Estados e municípios, da influência das manifestações na política nacional e dos próximos passos do combate à corrupção no País. Leia abaixo:
CartaCapital: A União está pronta para aplicar a Lei Anticorrupção e punir as empresas? A lei vai “pegar”?
Jorge Hage: Nós acreditamos que sim. Vai pegar do mesmo modo que nós conseguimos que pegasse a Lei de Acesso à Informação [proposta pela CGU em 2009 e aprovada em 2011]. Muitos acreditavam que a lei não ia pegar. No entanto, nós estamos com um percentual de atendimento considerado satisfatório na ordem de 94%. Temos uma grande expectativa com a eficácia da lei da empresa corruptora como mais um instrumento de combate à corrupção. Mas não esperamos que ela seja nenhuma panaceia, porque não existe isso em relação ao combate à corrupção. Não existe nenhum remédio milagroso.
CC: As empresas devem mudar suas práticas com a nova lei?
JH: A lei vai contribuir com a mudança de atitude e mentalidade do empresariado brasileiro. E já temos os primeiros sinais disso, antes da mesmo da lei entrar em vigor. Percebemos o interesse das empresas em se preparar, em instaurar mecanismos de compliance [integridade] e códigos de conduta. Os empresários estão ansiosos para saber qual vai ser a exigência de administração pública. A minha principal aposta no caso dessa lei não reside na aplicação das penas, mas no poder inibitório da simples existência da previsão de multas pesadas, mostrando ao empresário que vale a pena ele se prevenir. Os dirigentes da empresa vão ser os maiores vigilantes interessados em cuidar para que não aconteça a prática de nenhum desses atos previstos na lei.
CC: A maioria dos Estados brasileiros ainda não regulamentou a nova lei. No caso da Lei de Acesso à Informação, a execução da lei é muito pior em municípios e estados. O mesmo pode acontecer com a Lei Anticorrupção? O que a CGU pode fazer?
JH: Isso é uma das nossas maiores preocupações, embora não possamos interferir diretamente no que os Estados e municípios fazem. A CGU se reuniu com os secretários, principalmente no âmbito do Conaci [Conselho Nacional de Controle Interno, órgão que reúne as corregedorias dos Estados]. Felizmente, sentimos que há uma pendência deles para aguardar a regulamentação federal e tomá-la como referência. Se isso acontecer, as coisas vão facilitar muito. Tomando o padrão da regulamentação federal como referência, as discrepâncias e o espaço de decisão arbitrária tendem a se reduzir. E a gente, bem ou mal, observa que isso sempre tem acontecido. Estamos cogitando manter reuniões, chamar os secretários aqui, e quem sabe chegarmos à ideia de um pacto voluntário, porque nada pode ser imposto, no sentido do interesse público. Além disso, apostamos também no parágrafo único do artigo sétimo, onde está dito que os parâmetros para as variações dos mecanismos de compliance serão estabelecidos pelo Executivo federal. [A lei diz que as empresas que cooperarem nas apurações de infrações poderão ter suas penas reduzidas, e que as regras serão estabelecidas pelo Executivo Federal]
CC: O Brasil havia se comprometido com a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) a aprovar uma lei que punisse o suborno fora do país há mais de dez anos, o que finalmente foi feito com a aprovação desta lei. Com esta aprovação, o Brasil ainda fica defasado no combate à corrupção?
JH: Está é a última dívida que o Brasil tinha, e agora pagamos. Agora, a OCDE continuará a avaliar a aplicação desta lei: as penas, número de condenações, atuação do Ministério Público e da Justiça. E a implementação de todas as normas, tanto desta quanto das anteriores.
CC: Manifestantes foram às ruas de forma difusa contra a corrupção em junho do ano passado. Havia faixas contra a corrupção de forma geral, e até pedindo pena de morte aos “mensaleiros”. A lei foi aprovada no Senado no dia 5 de julho de 2013. Essa indignação difusa influenciou o poder público?
JH: Para nós, não teve nenhuma influência de movimento de junho em nada. Nós já tínhamos proposto isso muito antes de qualquer manifestação pública [a CGU propôs a lei em 2010]. Agora, seguramente a pressão funcionou no Senado. Na Câmara, justiça seja feita, já estava aprovado [a lei foi aprovada em maio de 2011 pelos deputados]. O fato é que a lei saiu, e isso é o que nos importa.
CC: Depois desta lei, qual é o próximo passo para diminuir a influência das empresas no poder público?
JH: Não tenho a menor dúvida que o próximo passo é a vedação do financiamento empresarial [em eleições]. Se não conseguirmos que o financiamento público seja exclusivo, que ao menos ele seja público e de pessoa física. Mas com o teto bem baixo de contribuições individuais, algo como mil reais, para evitar que as pessoas sejam canais fraudulentamente para doações de grandes empresários. Com isso, há condições de eliminar o absoluto poder econômico nas eleições, que é a negação do princípio básico da democracia: um homem, um voto. Que hoje nós não temos. Um voto meu ou seu nem se compara com o que vale um voto de um grande grupo econômico, porque o poder decisivo deles em uma eleição é muito maior que o nosso ou de qualquer cidadão. Hoje, nós não temos um regime democrático funcionando adequadamente. Supondo que a gente consiga isso, ainda vai faltar uma coisa para o combate a corrupção: a reforma do processo judicial brasileiro. Uma reforma radical que reduza as infinitas possibilidades de recursos, de agravos e mais agravos, de infinitos embargos declaratórios. Aí sim teremos o fim da impunidade. Do jeito que está hoje, qualquer advogado competente prorroga um processo por quinze, vinte anos. A punição prescreve, e fica por isso mesmo.