sexta-feira, 31 de maio de 2013

SOBRE FASCISMO NOS DIAS ATUAIS

Este artigo me foi remetido hoje por meu amigo Gato (Carlos Eduardo Magalhães):

Fascismo no Brasil de hoje*
publicado no jornal GGN
Márcio Sotelo Felipe**

Os regimes fascistas em muitos aspectos não eram diferentes de outras experiências históricas caracterizadas pelo terror do Estado contra movimentos populares, etnias, trabalhadores, sindicatos e organizações de esquerda. Mas o que apareceu na Alemanha e na Itália tinha algo específico. No primeiro momento ninguém se deu conta. Os soviéticos usaram um conceito genérico. Disseram que era uma ditadura terrorista aberta dos elementos mais reacionários do grande capital.

Se fosse isso apenas não seria uma novidade. O fascismo tinha de fato em comum com outras ditaduras burguesas vários aspectos: era uma forma de dominação com métodos terroristas, impedia o exercício de direitos, liberdades e garantias básicas dos indivíduos e esmagava movimentos populares e organizações de esquerda. Podemos identificar algo assim na Comuna de Paris, muito tempo antes. Um governo popular foi esmagado com extrema crueldade e 20 mil “comunards” foram executados. No entanto, soaria meio estranho dizer que Thiers era fascista.

 Quem pôs o ovo em pé foi Palmiro Togliatti, histórico dirigente do Partido Comunista Italiano. Ele viu que era uma ditadura de direita, mas de novo tipo. Além do terror, buscava o consenso e queria capturar a consciência das massas. O objetivo era transformar a sociedade em um organismo e eliminar conflitos. Isto sim era novidade histórica.

Um novo tipo de dominação naquele momento era necessário porque surgira o poder bolchevique. Até então o socialismo era uma ameaça detida pela só violência. Mas comunistas tomaram o poder na Rússia e se consolidaram no poder. Um desafio novo exigia respostas novas: não bastavam a violência e o terror do Estado, era preciso tornar a sociedade imune a transformações uniformizando-a. Era preciso dominar a consciência de uma parte da sociedade para excluir a outra parte.

 Domina-se uma consciência operando com a ideia de verdade. Uma visão de mundo, um interesse de classe, um ponto de vista, a ideia de conservação, todo o ideário reacionário torna-se “verdade”. Particularmente no caso do nazismo isto se deu por uma apropriação perversa do romantismo filosófico. A base do romantismo filosófico era uma ruptura com a ideia usual de verdade. No conceito clássico imaginava-se que a consciência se apropriava de uma verdade como se fosse, digamos, uma máquina fotográfica. No romantismo filosófico o eu cria a verdade. O espírito livre passa a ser senhor absoluto do dever ser. Quando está apenas submetido às leis necessárias da natureza o espírito está morto. Quando faz suas próprias regras o espírito está vivo.

 Para Fichte, escrevendo em plena invasão napoleônica, esse eu criador seria o povo alemão. Fichte inspirou o “volkisch”, movimento que grassou na Alemanha no século XIX. “Volkisch” significava mais ou menos poder do povo, espírito do povo, mas com uma conotação étnica. Abarcava o sangue, a tradição, a pátria, o ambiente, a terra e permeando isso tudo a etnia. O filósofo romântico pensava que o povo alemão emanciparia a humanidade. Lançaria “massas rochosas de pensamentos” sobre os quais “eras vindouras construiriam suas moradas”. O espírito alemão era uma “águia cujo poderoso corpo se impele ao alto e paira sobre asas fortes e experientes no céu para poder ascender para perto do sol, de onde ele gosta de observar”. (Discursos à Nação Alemã)

 Conhecemos os resultados dessa apropriação do romantismo pelo regime nazista. O sujeito - o povo alemão - cria seu mundo, cria a moral. Tudo que estivesse na perspectiva do povo alemão - entendido como “volkisch” , etnicamente - seria bom e verdadeiro. Tudo que não estivesse seria mau e falso. Ou uma doença para o “organismo”.

O Estado nazista criou uma polícia e um processo penal volkisch. Um historiador do nazismo os descreve assim: “esse tipo de polícia “volkisch”, ou biológica, da polícia foi apresentado ao povo alemão como a base racional para o que a polícia fazia. Himmler informou tranquilamente em março de 1937, que a tradição do Estado mínimo estava morta, assim como a velha ordem liberal na qual, pelo menos em teoria, a polícia era neutra. Enquanto a velha polícia vigiava mas não interferia para cumprir agendas de seu interesse, a nova polícia, disse ele, não estava mais sujeita a quaisquer restrições formais para realizar sua missão, que incluía fazer valer a vontade da liderança e criar e defender o tipo de ordem social que esta desejava. Segundo Hans Frank, era impensável que a polícia ficasse meramente restrita à manutenção da lei e da ordem. Ele disse que esses conceitos costumavam ser considerados neutros e livres de valores, mas na ditadura de Hitler ‘a neutralidade filosófica não existe mais’, isto é, apoiar ou abraçar qualquer outra visão política a não ser o nazismo era um crime. Para a nova polícia, a prioridade era ‘a proteção e o avanço da comunidade do povo’, e contramedidas policiais eram justificadas para deter toda “agitação” oposta ao povo, que precisava ser sufocada”. A polícia podia tomar quaisquer medidas necessárias, incluindo a invasão de lares, ‘porque não existe mais esfera privada, na qual o indivíduo tem permissão para trabalhar sem ser molestado na base da vida da comunidade nacional-socialista. A lei é aquilo que serve ao povo, e ilegal é aquilo que o fere’”.(Robert Gellately, Apoiando Hitler – Consentimento e Coerção na Alemanha Nazista, p. 79/80).

Nesse momento desaparece a herança iluminista do processo. A polícia pode tudo. Basta entender que certa conduta é contrária ao “povo”. Provas e procedimentos são desnecessários porque o processo é outro: um simples juízo a cargo de uma autoridade qualquer.

Sempre que de algum modo o diferente é tratado como inimigo, excluído do povo,desqualificado em sua humanidade, associado a desvalores, mau, falso, injusto, sujo, sempre que alguém procura uniformizar o meio social como um organismo por tal método, estamos diante de uma atitude fascista. A chave é essa: alguns são “o povo” e devem ser protegidos; outros não são o povo, não tem direitos e podem ser excluídos.

 O ódio à diferença é o fenômeno social fascista por definição. Há hoje no Brasil problemas com a diferença. Devemos prestar atenção quando a luz amarela acende.

 A inculta e selvagem classe média brasileira tem horror à diferença. Não gosta de negro, não suporta homossexual, não quer pobres por perto a não ser para limpar suas privadas. Quando é de direita – quase sempre – tem ódio da esquerda. Não é apenas contra. Não é que discorda. Odeia. A classe média brasileira é a favor da pena de morte, da redução da maioridade penal, da execução sumária de transgressores, repete frases como “bandido bom é bandido morto” e seu ideal de polícia é tal qual o “volkisch” da Alemanha nazista, mas isso, claro, quando o acusado é pobre, negro, puta, gay, etc.

 O julgamento da AP 470 (o “mensalão”) teve a ver com a rejeição do diferente. Não se tratou de uma questão meramente partidária. Engana-se quem pensa isso. Pau que bate em Chico bate em Francisco. O PT não é hoje exatamente um partido rebelde, mas a questão era simbólica. O PT está associado no imaginário social à esquerda e muitos dos seus quadros são “outsiders” em relação à elite branca universitária que sempre foi dona do poder e sempre ganhou eleições presidenciais. Colocar seus quadros na prisão no vislumbre de uma edição do Jornal Nacional em que aparecerão algemados será o início do pretendido processo de “higienização” da política. Subliminarmente faz-se a associação de uma concepção não conservadora do mundo ao crime.

O STF distorceu doutrinas jurídicas, desrespeitou a própria jurisprudência, decidiu diversamente do que havia decidido pouquíssimo tempo antes para declarar-se competente (apenas três dos trinta e sete réus teriam foro privilegiado, e nesse caso o processo deveria ter sido remetido a outra instância). Um ministro declarou em sessão, ao vivo para todo o país, que estabelecia a pena sob medida para que não houvesse prescrição. Confessou um ato de vontade à margem da lei para que houvesse a condenação. Nesse momento desapareceu a figura do julgador e surgiu a do inquisidor. Não queria julgar, queria condenar. Uma ministra reconheceu que não havia provas suficientes, mas a “literatura” permitia condenar...

Tudo isso foi possível porque existe em parte da sociedade (com apoio aberto da grande midia) um ambiente favorável à exclusão de outra visão do mundo que não a conservadora. Não um mero combate, o que seria normal da política, mas exclusão. Esse é o ponto. O diferente deve ser excluído e para isso vale o ordenamento jurídico do lobo e do cordeiro, a norma que permite ao lobo jantar o cordeiro e que pode ser qualquer uma.

Colunistas ou comentaristas políticos de direita costumam agora utilizar o mais rasteiro e pobre dos recursos de argumentação, o argumento ad hominem. A estratégia é desqulificar a pessoa, a história familiar, um suposto problema do pai, da mulher, do tio, etc. As pessoas de esquerda são assim, gente sem valor desde a origem familiar. Subrepticiamente afirma-se que o desvalor está na constituição genética ou foi impresso pelo ambiente de onde vieram. A contrario sensu os que os combatem são limpinhos e saudáveis. Às vezes aparece uma descarada eugenia, como a chocante matéria de uma revista semanal que dizia que, segundo uma pesquisa científica, pessoas altas ganham mais dinheiro. O sucesso dependeria de uma condição biológica que em geral se desenvolve nas camadas privilegiadas da sociedade, constituída por descendentes de europeus, mais altos na média do que o brasileiro não branco.

O trágico episódio do Pinheirinho escancarou a violência de que essa gente é capaz de praticar ou de apoiar. Os diferentes nunca têm os mesmos direitos. Mais uma vez, contra eles pode-se tudo. A vida de 6 mil pessoas foi destruída por máquinas passando em cima de suas casas às 5,30 hs de uma manhã de domingo, com o aviso prévio suficiente para tirar o bebê do berço e correr. Não sei o que pode ser mais parecido com o Judiciário alemão sob o nazismo do que isso.

Uma parte desta sociedade pensa que o Brasil deve ser o espelho deles, do mesmo modo como a cultura “volkisch” queria que a Alemanha fosse o seu espelho.

Esta sociedade protegerá os direitos dos brancos, dos negros, dos amarelos, dos gays, dos travestis, dos indígenas, dos drogados, dos loucos, dos bêbados, das putas e será a sociedade de toda inclusão. Não será a sociedade dos brancos de classe média heterossexuais (supostamente).

É escolher entre democracia ou barbárie.

* Texto baseado em apresentação feita no seminário “Resistência Democrática - Diálogos entre Política e Justiça”, promovido pela Escola da Magistratura do Rio de Janeiro de 15 a 17 de maio deste ano.
** Márcio Sotelo Felippe é jurista, ex-Procurador Geral do estado de São Paulo (1995-2000), autor do livro Razão Jurídica e Dignidade Humana, publicado pela editora Max Limonad.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

BOLSA FAMÍLIA

A miséria favorece a prostituição infantil e juvenil  e o trabalho es cravo. O consumismo e a busca de status pelo menos de dinheiro levam ao tráfico de drogas, legais e ilegais. A bolsa família ajuda e pode vir a ajudar muito mais a controlar esses problemas que afetam os pobres e muito pobres, dando uma dignidade mínima a cada pessoa desta terra. É entrega de poder de compra diretamente às interessadas (94 % são de mulheres), sem intermediários tais como coronéis locais e políticos em geral.


Pode haver abusos aqui e ali entre as (os) que recebem, e esses abusos podem e devem ser controlados com a vigilância da população e da parcela livre da imprensa e da internet. Senhoras e senhores da direita, sobre o assunto leiam Milton Friedman, herói  do neoliberalismo;  vejam o caso do Alasca, que foi governado pela pitoresca Sarah Palin; leiam o livro do Suplicy. Ou continuem a reclamar entre si.

P.S. Paul Krugman publicou no New York Times de hoje artigo sobre a intenção dos republicanos de encolher e acabar com o programa de auxílio à alimentação aos necessitados, nos Estados Unidos. Pode ser que esse artigo saia amanhã em algum dos jornalões de São Paulo. Lá como cá.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

UMA PROPOSTA REVOLUCIONÁRIA


Todos concordam que o Brasil precisa tornar a gestão do Estado mais eficiente. Isto inclui simplificar os mecanismos para a escolha das pessoas responsáveis pelos executivos e legislativos em suas instâncias locais, estaduais e federais. Nesse processo, poderiam ser adotados critérios que permitiriam diminuir o número de instâncias de decisão nas tarefas de Estado, visando assegurar a prosperidade, que como sabemos decorre exclusivamente das atividades do setor privado. Encurtar as cadeias de comando, dispensar intermediários.

O PT e aliados tem apresentado uma proposta de reforma política com o financiamento exclusivamente público das eleições.  Não resolve, sempre haverá financiamento, por detrás dos panos, de partes interessadas, o que pode incluir sindicatos de trabalhadores e ONGs com propósitos fora da racionalidade do mercado. Sem contar que o financiamento público (que é mais uma forma de estatização) se dá por uma regra de distribuição que tenderá a favorecer quem já foi eleito, tornando lenta a renovação dos políticos.

Neste ponto, apresento o projeto. Alguns aspectos dele certamente já foram cogitados, mas a prevalência de considerações politicamente corretas tem inibido a apresentação de uma proposta mais completa:

1.     O universo de eleitores é ampliado. Para além das ampliações anteriores que incluíram as mulheres, os maiores de 16 anos e os analfabetos, as empresas, que pagam impostos e que muitas vezes seguem as leis, são incluídas.

2.     Os eleitores passam a ter um número múltiplo de votos, correspondente à sua participação na riqueza nacional. Em uma primeira fase, essa participação teria como base os patrimônios líquidos de indivíduos e empresas declarados ao fisco. Mais tarde, em um gesto de equanimidade, esse universo passaria a incluir o patrimônio constante de paraísos fiscais, se os eleitores interessados o desejarem. Pode parecer injusto com os mais pobres, mas a riqueza seria medida em reais, e assim o número de votos. Todos teriam muitos votos, a maioria milhares de votos.


3.     Empresas não precisam provar ser brasileiras para serem eleitoras. Precisariam mostrar ter interesse no Brasil. Isso poderia mais tarde ser ampliado para governos estrangeiros. Em uma fase posterior, os dólares, euros e outras moedas fortes em paraísos fiscais de eleitores no Brasil poderiam ser incluídos no seu peso eleitoral.

Qual o principal benefício a ser obtido com essas mudanças? Fundamentalmente, aumentar a transparência, diminuir o número de intermediários. Políticos, jornalistas que trabalham oficialmente para “o público”, mas que na realidade estão a serviço do capital, passariam a ser funcionários diretos desse mesmo capital.

Parte desses intermediários poderia passar ao serviço direto de seus patrões – como mordomos, auxiliares com e sem uniforme, desfrutariam da proximidade em relação ao objeto de seus serviços e dos ambientes em que eles habitam.

O povo, o povinho, passaria a ter um comportamento radicalmente diferente. Consciente, finalmente, de os que mandam não foram colocados por ele, deixará de pressionar políticos e governantes. Deixará de lado a tóxica esperança depositada no sistema político. Estará satisfeito ou não. 

A elite governante e os poderosos poderão finalmente deixar de lado seus jogos e trapaças e passarão a “temer as massas”, como os figurões do socialismo real e os governantes da China atual. Se faltar comida, se a desordem resultante da violência passar o ponto de ebulição ou a diversão deixar de ser satisfatória é capaz de portões e muros dos palacetes e condomínios, blindagens nos carrões e exércitos de seguranças privados não serem capazes de controlar a situação, mas até lá tudo será mais eficiente e direto, como desejam os largos extratos da classe média brasileira que se pautam pela mídia conservadora.

terça-feira, 21 de maio de 2013

UM SEMINÁRIO NO IEE


Nos dias 13 e 14 de maio de 2013 foi realizado um seminário com debate intitulado DIAGNÓSTICO DO SISTEMA ELÉTRICO BRASILEIRO: ANÁLISE E PROSPECTIVA. Convocados e coordenados pelo diretor do IEE, Ildo Sauer, estiveram reunidos Adilson de Oliveira, da UFRJ, Roberto D’Araujo, do site Ilumina e ex-Furnas, Carlos Augusto Kirschner do Sindicato dos Engenheiros, Mario Thadeu de Barros, da EPUSP, Carlos Ribeiro da CTEEP, Juliana Ricosti, representando as Comercializadoras de Energia, e Maury Lima e Silva, do Instituto Brasileiro de Direito da Energia, IBDE.

No dia 14 à tarde houve uma plenária para sumarizar as conclusões dos debates travados desde o dia anterior e apresenta-las a um público convidado, em um auditório da USP. Entre os convidados para essa seção, este humilde blogueiro.

Não me surpreendi favoravelmente. A seção transcorreu muito serenamente, e no fim não houve perguntas do plenário. Não sei dos outros presentes, mas eu lá fui não para ouvir qualquer coisa de novo, que não houve, mas para ver repassar questões que sempre me preocuparam, desde a época em que eu trabalhava no setor e apresentava propostas políticas para o mesmo.

No quesito de repasse de questões faltaram coisas essenciais. Os debates centraram-se nas disfunções do atual modelo para o setor elétrico e da atuação do governo federal. Questões como as alterações ambientais acarretadas pelas barragens da Amazônia não foram examinadas em si, apenas foram citadas como variáveis externas, limites externos um tanto imprevisíveis, mais ou menos como as empresas elétricas vêm encarando desde sempre os problemas de meio ambiente.

O IEE, anteriormente Instituto de Eletrotécnica e Energia, atualmente chama-se Instituto de Energia e Ambiente. Ildo Sauer lembrou a presença de Ambiente no nome, mas assim como o IEE abriga dois programas que funcionam com lógicas e notas de avaliação pela CAPES perfeitamente distintas, não tenho testemunhado uma visão integrada entre pesquisadores, professores e colaboradores do IEE dos dois campos. Este seminário realmente foi apenas de energia.

A síntese mais interessante veio de Adilson Oliveira, que disse que é necessário ou restabelecer a estrutura anterior à privatização, de tarifação pelo custo, ou liberalizar de vez, privatizando tudo o que não foi até agora. O fato de Adilson ter admitido o “retrocesso” reforça a percepção de que o modelo do governo federal faz água, ao procurar a suficiência da oferta e a modicidade tarifária enquanto mantém mecanismos de decisão complicados e contraditórios (aspecto que D’Araujo também enfatizou).

Como debate acadêmico pode até ter cumprido seus objetivos. Mas não trouxe qualquer novidade em relação a debates travados cinco, dez, vinte anos atrás. É como se não houvesse novos grandes protagonistas atuando no setor elétrico. As distribuidoras, as empresas de transmissão, as geradoras públicas e privadas, a ONS, a ANEEL não foram questionados quanto a seus objetivos e atuação. Não se examinaram alternativas estratégicas para o cuidado conjunto da terra e da energia.

Mais uma vez não foi tema central o para que, para quem a energia elétrica e a energia em geral devem ser ofertadas neste país. A demanda de energia continua a ser encarada como variável independente, juntando em um bloco só a parcela que satisfaz necessidades básicas da população e a que cumpre o papel reservado ao Brasil pelas grandes corporações financeiras e industriais nacionais e internacionais.

Os especialistas que lidam com a  questão energia, da academia como de empresas públicas e privadas e membros das burocracias governativas, deveriam reservar um espaço maior em suas análises à questão do poder político e da democracia nas decisões do setor.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

UMA BOA SÍNTESE DO LULISMO


Lula, ser E não ser

15/5/2013 12:41
Por Gilberto Maringoni - de São Paulo
(DO JORNAL CORREIO DO BRASIL)

O ex-presidente da República criou um discurso e um comportamento político capaz de, mesmo em situações polarizadas
O ex-presidente da República criou um discurso e um comportamento político capaz de, mesmo em situações polarizadas
Quem se espanta com a incorporação do vice-governador paulista Guilherme Afif Domingos à administração Dilma Rousseff, achando que o político oriundo do malufismo e aliado histórico dos PSDB seria um corpo estranho na seara petista, deve ficar mais atento ao funcionamento do chamado lulismo.
Não se trata apenas de uma manobra de ocasião para compor maiorias parlamentares e estreitar o espaço da oposição nas eleições de 2014. Estamos diante de uma sofisticada tática política, capaz de contentar aliados à esquerda e à direita e de se colocar como esquerda e direita ao mesmo tempo, sem assumir claramente nenhum dos lados.
Um exemplo mais claro desse comportamento pode ser visto no vídeo disponível neste link (http://www.youtube.com/watch?v=td1ywn3SoWc).
Ele não é novo, dura um minuto e capta um trecho do discurso do ex-presidente Lula nas festividades de 35 anos da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), em abril de 2008.
Nas palavras de Lula, o ex-presidente Emílio Garrastazu Médici, que governou o Brasil entre 1969 e 1974, fez o país viver “o momento mais crítico da história do país”. Mas também permitiu que “o Brasil encontrasse seu rumo”.
A fala pode gerar várias controvérsias, mas, acima de tudo, mostra como funciona o discurso lulista, seguido pela direção do PT. Parece atacar alguém, mas não ataca. Parece elogiar, mas também não elogia. Parece ser de esquerda, mas não se assume como tal. Às vezes soa de direita, mas, habilmente, não deixa marcas explícitas.
No caso da Embrapa, o ex-metalúrgico parece elogiar a ditadura, mas faz uma leve ressalva. A ressalva parece crítica, mas tampouco é.
Veja a contradição
Na intervenção, o então presidente diz literalmente o seguinte:
“(…) É com muito orgulho que de vez em quando as pessoas falam “Lula defende … elogia o governo Geisel, elogia o não sei das quantas. Pois eu agora – veja a contradição, Requião – um dos presidentes que permitiu que a gente vivesse um momento político mais crítico da historia do país, o presidente Médici, foi o homem que assinou a Embrapa e foi o homem que assinou Itaipu. (…) Os outros gestos que as pessoas fizeram que permitiram que o Brasil encontrasse seu rumo. Cada um de nós será julgado um dia. Cada um de nós será julgado por aquilo que fizemos e pelo que deixamos de fazer”.
O que Lula quis dizer, exatamente?
Atacar sua fala como sendo uma rendição ao legado da ditadura ou alienação sobre o período 1964-85 simplifica o problema e não vai ao âmago da questão.
A conduta ambígua não indica dúvida, hesitação ou falta de clareza sobre posição a tomar ou rumo a seguir. Trata-se de discurso bem pensado e sofisticado para o tipo de projeto que o assim chamado lulismo vem implantando no país há dez anos.
É sofisticado porque dialoga com os vários interesses em disputa na sociedade. Contenta progressistas e conservadores, direitistas e esquerdistas e… não toca no status quo.
Inúmeros gestos
Intervenções como essa se desdobraram em inúmeros gestos, falas e iniciativas ao longo dos dois mandatos de Lula e na gestão de sua sucessora, Dilma Rousseff (menos competente que seu patrono, nesse quesito).
Ao mesmo tempo em que usou o boné do MST em manifestação dos sem-terra, Lula praticamente paralisou a reforma agrária. Deu força à Secretaria de Direitos Humanos da presidência da República e nomeou um quadro da direita, como Nelson Jobim, para a pasta da Defesa, o que freou qualquer investigação sobre os anos de chumbo nos quartéis. Colocou um desenvolvimentista moderado na Fazenda e soltou as rédeas da ortodoxia no Banco Central. Apoiou a gestão de Hugo Chávez na Venezuela, para possibilitar a entrada de empreiteiras e outras empresas brasileiras no país. Mas tratou de esvaziar propostas de integração estatal, como as da Telesur, Gasoduto do Sul, Banco do Sul etc. Reclamou da imprensa, mas não tomou nenhuma iniciativa para formular uma nova regulação para o setor. Fala como homem de esquerda, mas abrigou figuras egressas da fina flor do conservadorismo nacional em seus governos.
Os exemplos são infindáveis e representam a materialização de uma habilíssima política conservadora de novo tipo. Não se trata de uma modalidade heavy metal do neoliberalismo, como a dos governos do PSDB (1995-2003). É algo que dá concessões secundárias a um lado e mantém a essência do modelo estruturado pelo outro.
Governo sofisticado
Com tais diretrizes, Lula construiu o governo mais sofisticado e complexo no Brasil desde Getúlio Vargas (1930-45 e 1951-54). Obteve adesões à esquerda e à direita, deixando intocados os interesses hegemônicos na sociedade.
Para Lula e a maioria petista, ele e sua sucessora construíram governos de coalizão, montados para superar desafios históricos do país (como se os desafios não tivessem sido colocados justamente por uma parcela da sociedade que o PT abrigou em suas gestões).
Para uma facção mais à esquerda do petismo e para seu tradicional aliado , o PCdoB, este seria um governo em disputa (como se todos os governos não o fossem, em maior ou menor grau). Através desse biombo vernacular, aceitam-se quaisquer manobras para se manter a chamada governabilidade.
Governabilidade, esclareça-se, não é uma maneira de se manter o comando para se atingir determinado objetivo. Governabilidade é aqui um fim em si mesmo.
Para a direita – que disputa com condições muito melhores os rumos da administração – trata-se de manter espaços nunca perdidos historicamente. Os governos petistas incorporaram, sem dizer que o fizeram, políticas caras aos setores monopolistas e rentistas, como o aprofundamento do processo de privatizações, de isenções tributárias e fiscais e a política de franco favorecimento aos grandes grupos privados, via BNDES.
A argumentação de parcela da esquerda lembra que o governo distribuiu uma parcela do excedente social entre os setores miseráveis e obteve um crescimento econômico razoável, em comparação com a administração do PSDB (é possível que as medíocres taxas de crescimento obtidas pelo governo Dilma quebrem esse parâmetro).
Com tudo isso, uma conclusão é clara: não é fácil se opor a uma gestão desse tipo.
Ganhos reais
Há ganhos reais para os trabalhadores nas políticas de Lula e Dilma. Há um aumento da renda individual de forma direta, propiciada pelos aumentos do salário mínimo e pela elevação do nível de emprego. E há também, de forma indireta, uma elevação do consumo popular, definida pela ampliação do crédito pessoal. Como parte das políticas sociais, o governo lançou o Prouni e o Fies, destinados a financiar a educação de jovens carentes, através de subsídios indiretos a faculdades privadas e políticas focadas de transferência de renda, como o Bolsa Família. São práticas eficientes, mas não desconcentram renda de maneira significativa. Antes, destinam uma parte do excedente propiciado pelo crescimento do PIB aos pobres, propiciado por um cenário internacional extremamente favorável para os países exportadores de commodities.
Cenário atípico
A primeira década do século XXI constituiu-se num cenário atípico em temos mundiais. A chegada ao mercado internacional de novos países importadores de produtos primários – China e Índia -, um aumento significativo da liquidez – e do crédito – internacional, combinados com taxas de juros extremamente baixas, possibilitou a entrada de grande volume de capital nos países do sul do mundo.
O Brasil – bem posicionado como exportador de soja, trigo, carne e etanol – soube tirar vantagens expressivas da situação.
As ações governamentais nesse período tiveram como uma de suas metas a ampliação do mercado interno que alavancou um miniciclo de crescimento, entre 2006 e 2010.
Versões mais toscas da linha lulista não prosperaram. Os exemplos são dois, Gilberto Kassab e Marina Silva. São imitações que arranham a superfície da orientação ambígua do ex-metalúrgico, mas não articulam o conjunto de forças sociais que ele – montado na máquina estatal – soube tão bem fazer.
Todos se lembram do ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, fundador do Partido Social Democrático (PSD). Suas palavras foram sinuosas à época do lançamento de sua agremiação, em fins de 2011: “Não somos nem de direita e nem de esquerda”. Opinião igual tem Marina Silva, para quem sua Rede não está nem a esquerda e nem a direita, mas à frente.
Quais os limites da política lulista?
Essa é a grande pergunta, depois de dez anos de governo. Os limites são dados pela estrutura do Estado, que segue a serviço dos interesses rentistas e dos grandes monopólios.
O que significa mudar a estrutura do Estado em termos econômicos? Significa embutir custos adicionais ao seu funcionamento, transferindo efetivamente renda de uma classe a outra.
O Estado brasileiro sofreu quatro grandes reformas ao longo do século XX. Ou seja, por quatro vezes rompeu-se o círculo das mudanças sem mudanças.
A primeira se deu entre 1930 e 1945. Getúlio Vargas alterou a política fiscal, direcionando parte da arrecadação para iniciativas industrializantes, para a adoção de políticas sociais permanentes – CLT e previdência social – e para a reforma da própria máquina pública. Criou um Estado com maior poder de intervenção na economia.
A segunda reforma do Estado aconteceu por obra da ditadura militar (1964-1985).
Embora seus governos não tenham sido uniformes, ela aumentou o poder de intervenção na economia, através da criação de centenas de empresas estatais e órgãos públicos.
A terceira não chegou a ocorrer totalmente. Foi esboçada pela Constituição de 1988, através da ampliação de direitos sociais universais, especialmente nas áreas de saúde (SUS) e previdência social. Havia na Carta uma tentativa de se criar uma versão nacional de Estado de Bem Estar Social. No capítulo da ordem econômica, a Constituição estabelecia diferenças entre empresa estrangeira e nacional, retiradas no governo FHC.
A quarta e radical mudança veio nos anos de 1990, nos governos Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso. Ela pode ser sintetizada como uma tentativa de desconstrução da primeira (Vargas) e terceira (Carta de 1988) intervenção. Essa mudança começa com a aprovação do Programa Nacional de Desestatização (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8031.htm), em 1990, renovado em 1997 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9491.htm). A lei pretendia “reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público”. Ela possibilitou uma radical alteração do papel do Estado. Juntamente com 34 emendas constitucionais, aprovadas entre 1995 e 2002 (http://www.dji.com.br/constituicao_federal/ec.htm), o governo Cardoso ajustou o país à nova ordem mundial, pautada pelos preceitos do Consenso de Washington.
O papel de Lula
O governo Lula não apenas manteve todas essas mudanças – inclusive o Programa Nacional de Desestatização -, como tomou iniciativa de realizar mais 28 emendas constitucionais, que não se contrapuseram às diretrizes da administração anterior. No caso, por exemplo, da reforma na Previdência Social (http://www.dji.com.br/constituicao_federal/ec047.htm), de 2005, a intenção foi de aprofundar o modelo liberal. O mesmo pode ser dito de iniciativas na legislação ordinária, começando pela Lei de Falências (2003), até as privatizações realizadas pelo governo Dilma, sob o eufemismo de “concessões”, sem contar as dezenas de setores que foram agraciados com desonerações na folha de salários.
Assim, as melhorias sociais – que são reais – em vários aspectos da vida da população mais pobre, obtidas nos governos petistas, foram alcançadas graças a um cenário de crescimento econômico, sem tocar na organização do Estado, sem ampliar serviços públicos universais – como saúde e educação públicas -, que se constituem em ganhos indiretos, mas universais. Aliás, na saúde pública, o que se nota é um avanço dos planos de medicina privada, das organizações sociais e um paulatino sucateamento do SUS, estabelecido na Constituição de 1988.
Cabe tudo
Repetindo: a justiça social lulista se faz via mercado, via crédito e aumento da massa salarial que dependem de cenários de crescimento econômico.
Para esse tipo de modelo, não é necessário uma nova repartição de renda e da riqueza social. O discurso político para essa situação não deve incentivar o confronto e a luta de classes, pois não é um discurso mudancista. É o discurso que exalta ganhos, ao mesmo tempo em que mostra o valor da estabilidade. Aliás, é a apologia da estabilidade que possibilita ganhos.
Cabe tudo nessa formulação, desde avaliações incompreensíveis sobre o período mais pesado da ditadura até o líder do movimento das pequenas e médias empresas.
É uma fala marcadamente ambígua, sofisticada e, sobretudo, conservadora.

Gilberto Maringonijornalista e cartunista, é professor de relações internacionais da Universidade Federal do ABC. Doutor em história pela Universidade de São Paulo, é autor de “A Venezuela que se inventa – poder, petróleo e intriga nos tempos de Chávez” (Editora Fundação Perseu Abramo).

terça-feira, 14 de maio de 2013

SEGREDOS E PODER



No período em que fiz parte do PT, em uma das últimas campanhas de eleição, em determinada reunião plenária dos grupos que elaboravam propostas setoriais, fiz uma de minhas poucas e “desastradas” intervenções. Como coordenador do grupo de trabalho de energia, em meu nome, admiti que a cúpula do partido fizesse acordos com outras forças – partidos e atores econômicos, mas que o fizessem dentro de parâmetros e limites que fossem debatidos naquela assembleia, para que nossas propostas de governo fossem a sério.


Não devo ter dito isso nesses exatos termos, mas de fato contestei a legitimidade de acordos que permaneceriam secretos e que sentia, poderiam invalidar ou pelo menos mutilar muitas das propostas que iam sendo elaboradas para ser apresentadas ao eleitorado. Eu não participava de nenhuma cúpula, e tinha ojeriza aos grupos em que o PT estava dividido, incluído aí o grupo que se tornou dominante, o de Lula e José Dirceu.


Essa intervenção foi recebida com quase unânime hostilidade pelos participantes (só depois da reunião um ou dois militantes se aproximaram para se solidarizar com minha fala). Mais tarde, fui observando as prevaricações aparentes do governo de Marta Suplicy na cidade de São Paulo: o fato de não constituir a prefeitura como parte lesada em uma investigação em outro país, a Suíça ou os Estados Unidos, sobre dinheiro na posse de Paulo Maluf, o fato de se ter construído uma selva de pedra em meu bairro – Cidade São Francisco, sem dar uma contrapartida por ser grande gerador de tráfego, como exigia a lei. E a famosa carta aos brasileiros de Lula com candidato em 2001, que ao mesmo tempo em que procurava se legitimar perante o poder financeiro nacional e internacional legitimou as ações lesivas ao país do governo Fernando Henrique Cardoso.


Eu sabia que corriam negociações por cima de todos nós, fossemos petistas ou não. Não era o que queríamos, depois da ditadura. Ignorava que a cleptocracia brasileira não seria combatida de fato, nem interrompida com os governos de Lula e Dilma. Notem bem, não estou dizendo que eles introduziram ou pioraram a corrupção. Isto é a mentira que a direita quer pregar para voltar ao poder pleno e radicalizar nas desnacionalizações, privatizações e ações assemelhadas. Estou tratando de levantar, isso sim, a questão das formas de poder que são exercidas fora das vistas dos meros cidadãos. Estou sendo claro?


A maior parte da esquerda não reagiu, porque apesar dessas mudanças de postura no poder ainda considerava os seus políticos como parte dela que estariam fazendo concessões táticas enquanto retinham a visão estratégica de projeto de Brasil para médio e longo prazo. Assim como aconteceu em países da Europa como França e Espanha. Assim, a esquerda pouco cobrou dos novos governantes, que de todo modo fizeram avanços importantes que já citei mais vezes neste blog, e que não deveriam ser revertidos.


A questão aqui é que os acordos secretos, descendentes diretos dos conchavos da política estudantil e dos conchavos de sindicatos com os patrões, privam os trabalhadores e os cidadãos comuns da possibilidade de ter algum controle sobre seus líderes eleitos. Ao mesmo tempo, eles são a ferramenta básica das formas superiores de corrupção. Superiores no sentido de afetarem e, escala maior tanto as finanças como a direção estratégica da economia.


Os conchavos das elites dominantes são antigos como o Brasil, desde seu início como colônia, assim como a ocultação das forças por trás das ações dos governos. Nunca o Brasil foi vendido abertamente, embora uma economista ex-libelu tenha louvado a farra privatista e desnacionalizante do governo Fernando Henrique Cardoso exatamente nesses termos e em público , provocando a fúria pontual de um distraído general.  Mas foi vendido fora do conhecimento dos brasileiros comuns, e as imposições das potências imperiais após a independência sempre foram empurradas para debaixo do tapete.

Corrupção de origem estrangeira sempre foi um fato básico da política brasileira, de Portugal a Inglaterra, Estados Unidos e vários países europeus. Assim como a corrupção doméstica, basicamente mecanismos extra-oficiais  (ilegais) portanto ocultos, de transferência de recursos e riquezas do país para indivíduos e grupos privados.


O IPES e o IBAD, abertamente financiados pelos Estados Unidos na preparação do golpe de 1964, foram apenas a ponta do iceberg. Na história recente do Brasil, a atuação dos agentes da CIA, de tempo integral ou parcial, de nacionalidade estadunidense ou brasileira, dos agentes informais representados pelos dirigentes das grandes empresas estadunidenses aqui instaladas e pelos ideólogos da globalização subordinada instalados nas universidades, e que defendem interesses que quase sempre se chocam com o desenvolvimento da economia e da soberania brasileiras, constitui uma inexistência em nossa mídia e no discurso dos políticos de centro-direita e de centro-esquerda (quase a totalidade).


Essas forças e esses mecanismos de ocultação continuam como sempre. A emergência de novas armas do império, como a vigilância planetária da internet e a expansão mais recente do poderio militar com bases militares convencionais e de drones, mais a multiplicação de ações de alta violência e terrorismo pelo complexo CIA- JSOC,  (comando conjunto de operações especiais na sigla em inglês), e pela DEA (administração do controle legal de drogas na sigla em inglês) não muda a estrutura de poder do poder mundial. Ela conta sempre com as ações do governo dos EUA e de seus agentes no exterior, de tempo integral ou não, pagos ou não, conscientes ou não, em todos os países do mundo: amigos, aliados e inimigos.

Ter conhecimento dos mecanismos ocultos de poder talvez não mude muito a correlação de forças no país. Mas se o público continuar a ignorar ou subvalorizar a importância desses segredos, isso certamente impedirá que a democracia funcione no processo de emancipação dos brasileiros como povo e do Brasil como nação.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

ADOÇÃO DA DEMOCRACIA


Não herdamos uma democracia de verdade.  Ela é um conceito a ser montado coletivamente pelo conjunto da sociedade, ou pelo menos pela maior parte dela. Mas havia elementos de democracia nas mobilizações populares, na constituição de 1946, no comportamento civilizado de muitos políticos, editores de livros e de jornais, quando a noite de 1964 caiu sobre o Brasil.

Não existe país em que se mirar como modelo de democracia. Brasil é Brasil, existem nele formas democráticas que podem crescer, em outros países formas que podemos imitar, mas o que fizermos será sempre inédito, serão invenções por um povo já existente, com maneiras e contradições próprias, tudo isso também em processo de permanente mudança.

Como é que estamos agora, para onde estamos indo neste momento, para mais ou menos democracia?
Se formos crentes do evangelho de Milton Friedman e Friedrich Hayek, dois economistas que receberam o prêmio Nobel, haveria uma boa chance de responder afirmativamente a essa questão (Friedman foi conselheiro do ditador Pinochet do Chile). Para eles, por definição democracia e liberdade são função direta da liberdade total do capital, que deve se apropriar da maior parcela possível da riqueza de um país e restringir o Estado ao papel de polícia, a partir de leis e regulamentos gerados pelo capital, para o capital. E é isso que tem ocorrido nos últimos trinta e poucos anos, com o avanço neoliberal em todos os países, submetendo e cooptando inclusive todos os grandes partidos que antes eram de esquerda. O neoliberalismo das corporações financeiras, como as grandes empresas entre as duas guerras mundiais do século passado, é perfeitamente compatível com o fascismo, que tem florescido com a penúria imposta a setores da classe média e os mais pobres nos países mais ricos, e com a pregação dos ideólogos da direita que ocupam os meios de comunicação em países como o Brasil.

Há um virtual monopólio da imprensa escrita – jornais e revistas de grande circulação, com a exceção da revista Carta Capital, esta bem atrás das outras, e das redes de rádio e televisão nacionais, defendendo os interesses das corporações e do governo dos Estados Unidos da América. Dedicados a impulsionar a privatização, isto é, retirar do domínio público em favor das corporações privadas os recursos naturais e funções do Estado, tudo o que possa ser transformado em riqueza desfrutável, de todos os países do planeta.  Por outro lado, uma parte crescente da população tem se informado pela internet – pelos e-mails, redes sociais e sites jornalísticos e de opinião.

Os comunistas de várias décadas atrás aderiram em massa às formas democráticas de fazer política: deixaram de lado a luta armada, o conceito de ditadura do proletariado, o vanguardismo e sectarismo que prevaleceram até os anos 40 e 50 do século 20. Às lutas de socialistas, anarquistas e comunistas que o haviam feito na Europa e Estados Unidos, e usaram formas mais pacíficas de ação política, devem-se a universalização do direito de voto, o aumento dos salários para permitir uma existência digna aos trabalhadores e o conjunto de mecanismos de transferência de recursos via Estado para o amparo da sociedade – aposentadoria, educação gratuita, saúde, seguro desemprego.

Essas condições permitiram um apoio tácito das maiorias de trabalhadores à forma capitalista de produção, que permaneceu e se fortaleceu até os anos 80, quando essa forma entrou em crise e os extratos superiores do capitalismo – os grandes bancos e os setores financeiros das grandes corporações - voltou-se para saquear as riquezas que até então respeitara, com o apoio dos organismos internacionais dominados pelos Estados Unidos e seus aliados. Têm sido bem sucedidos. A parcela de riqueza dos mais ricos nos países centrais cresceu, à custa da parte à disposição dos mais pobres. O apoio tácito ao domínio do capital por trabalhadores que vêm sofrendo de desemprego, precarização do trabalho e diminuição de salários tem se erodido pelos prejudicados, o que inclui grande parte das classes médias, mas a incapacidade dos partidos socialdemocratas de agir, quando eleitos, deixou-as sem alternativa, ao menos em curto prazo.

Em outros países, o que inclui os BRICS, e alguns países da América do Sul: Venezuela, Equador, Argentina, Bolívia, e até certo ponto o Brasil, o poder do capital financeiro tem sido relativizado, em graus variados. Neles, esses movimentos para fora do poder neoliberal apoiado pelos governos dos países mais ricos e com  agentes estrangeiros e nativos, têm sido objeto de ações políticas por fora dos meios democráticos.

Não se fale do golpe estadunidense contra Aristide no Haiti e a tentativa de golpe de 2002 na Venezuela feita sob a supervisão e com recursos dos norte-americanos. Mais recentemente, tivemos os golpes de Honduras e do Paraguai, usando desta vez políticos e juízes de corte suprema em vez de militares.  

As mobilizações da direita nos países menos enquadrados da América do Sul tem incluído muita coisa que contraria e sabota o jogo democrático.  O objetivo é derrubar com golpes os governos não perfeitamente alinhados ao domínio de um capitalismo sem limites, e os métodos incluem violência na linguagem, no tratamento da verdade, e ameaças e efetivação de violência física. Enquanto agem dessa maneira, não piscam enquanto atribuem ações antidemocráticas ao governo federal, e chamam de ditaduras os governos da Venezuela e da Argentina, que não estão reprimem a liberdade de expressão, mas procuram quebrar o seu secular monopólio pelas classes proprietárias. 

Democracia é uma boa, se for possível manter o que foi obtido até agora, e ampliar para além de uma negociação demasiado desigual com o grande capital e o império. Eles, a outra parte, têm objetivos incompatíveis com a democracia. Lembremos a tirada de Szizek, de que o único país onde o capitalismo está dando certo é aquele com um governo repressivo de partido único, a China. 

quarta-feira, 8 de maio de 2013

ANGELO SCARPINELLA

Italiano de Priverno, veio para o Brasil em 1924, depois de ter sido segundo tenente na primeira guerra mundial, e depois de perder, aos 17 anos, pai e mãe para a gripe espanhola. Viveu muito, foi expansivo, às vezes era bravo, escrevia bem, odiava o que encarava como injustiça e foi meu pai. Nasceu neste 8 de maio, em 1899. 

terça-feira, 7 de maio de 2013

SOBRE BRASIL, PETROBRAS E A IMPRENSA GOLPISTA

No México, como no Brasil, eles trabalham para os poderosos do exterior. Veja este artigo de Fernando Siqueira, vice presidente da AEPET, publicado originalmente no site da CUT.

domingo, 5 de maio de 2013

CORRENTES DE E-MAILS DA DIREITA

São parte do processo político, mas não são uma forma de debate democrático. No Brasil concentram-se em veicular acusações contra o governo federal e o PT, grande parte das quais perfeitas fabricações. As pessoas que as reproduzem e redistribuem o fazem por ter tomado partido contra alguma coisa que elas não aceitam na realidade atual ou em iniciativas, idéias, atitudes de fora de seu círculo.

Frequentemente as acusações são de corrupção. Neste caso, às vezes sobra também para instituições, como os parlamentos. Descuidam, deliberadamente ou não, de qualificar, quantificar as formas de corrupção, de apontar caminhos para controlar essas formas, esquecem quase sempre de apontar para os indivíduos e principalmente os executivos das empresas que corrompem. 

Quando o governo fortalece órgãos de combate à corrupção, como a polícia federal, ou apresenta uma proposta de reforma eleitoral que em outros países permitiu diminuir o poder das corporações de determinar  quem vence as eleições, essas pessoas, os órgãos da mídia e partidos como o PSDB e o DEM negam os avanços, tergiversam, opõem-se e não deixam a situação evoluir. Não estão interessados em democracia. Afirmam que governos eleitos que contrariam os interesses das mídias e dos Estados Unidos são ditaduras, embora a liberdade de organização e de imprensa seja total, e com muito mais diversidade do que no Brasil.

Ditaduras foram as ditaduras, exercidas no século passado por militares. Hoje estamos melhor sem elas, estamos possivelmente avançando - muito devagar, com muitos retrocessos mas avançando. Os preconceituosos, os racistas, os que não se sentem confortáveis com os avanços, mesmo capengas, mesmo incompletos, mesmo com concessões, às vezes enormes aos interesses das grandes corporações e com parte dos diktats do império, não se conformam e atacam as instituições da democracia. 

Atacam os partidos. Da mira dessas pessoas são poupados os partidos mais permanentes deste país, a Igreja e as Forças Armadas. Mas esses partidos são incompatíveis com as formas democráticas da política, a não ser que se abstenham de nela intervir.Precisamos de respeito, de poder debater o papel do Estado, políticas públicas para melhorar as condições das pessoas e defender onde possível a soberania deste país. A direita não está ajudando.