segunda-feira, 29 de agosto de 2016

O ROTEIRO DO GOLPE, INÉDITO

Bene trovato, ed anche vero, anzi disgraziatamente vero. Do Conversa Afiada

Bomba! Vazou reunião da CIA: o pré-sal é "nosso"!
Primeiro, quebrar a Petrobras!

publicado 29/08/2016

Reunião na CIA em janeiro de 2015

Em uma sala de reuniões ampla, com cortinas fechadas em um de seus lados, vê-se no centro da sala, uma mesa retangular em torno da qual estão umas vinte pessoas acomodadas em cadeiras confortáveis. Cada pessoa tem à sua frente um mesmo dossiê. O cidadão da cabeceira começa a falar.

- Não serão feitas apresentações e não precisam se identificar ao falar. Todos sabem do que iremos tratar. Por favor, comece.

Esta última frase é dita enquanto olha para o cidadão ao seu lado. Este toma a palavra.

- Hoje, o Brasil não é somente um mercado para o consumo dos bens e serviços das nossas empresas, além de um grande fornecedor de grãos e minérios de baixo valor no mercado internacional. Com a descoberta por parte deles da enorme jazida do Pré-Sal, mais as novas províncias petrolíferas, que ainda irão ser descobertas, na área que os nacionalistas brasileiros chamam de território marítimo brasileiro, que vai além do seu mar territorial, o Brasil poderá se tornar o maior exportador mundial de petróleo, acima da Arábia Saudita e da Venezuela.

- Os nativos sabem disso?

- Não. A grande massa não sabe de nada. Pouquíssimos brasileiros nacionalistas sabem. Alguns dos nossos aliados no país sabem da possível extensão das províncias petrolíferas que o país possui, porque os informamos. Mas só demos estas informações aos confiáveis. Neste ponto, o coordenador interrompe a apresentação para dizer:

- Seria melhor se as perguntas fossem anotadas e feitas no final. Continue, por favor.

- Creio que todos aqui sabem que o petróleo ainda será vital para as economias mundiais por no mínimo uns 50 anos, os desenvolvimentos tecnológicos para fornecimento de calor e movimento para as sociedades não encontrarão competidores em custo com os derivados de petróleo, a menos que restrições ambientais sejam impostas. Sumariamente, o petróleo continuará sendo um insumo essencial para as economias mundiais. Além disso, o petróleo do Brasil terá papel primordial no futuro do mercado internacional de petróleo, porque no resto do globo só ocorrerão descobertas de petróleo caro e, quando for de petróleo acessível, elas serão em regiões conflituosas.

O coordenador da reunião agradece a exposição do último interlocutor e passa a palavra a outro presente, dizendo:

- Assim, chegamos ao objetivo principal da nossa reunião. Tenha a palavra.

- Ocorreu recentemente, no final de 2014, a eleição para presidente do Brasil e, apesar de todos os esforços por nós despendidos, que não foram poucos, a presidente Dilma foi reeleita. Não vou fazer uma análise profunda do que ocorreu, para não roubar tempo do que é principal para este reunião. Mas, faço questão de frisar, até porque será útil para qualquer ação futura nossa, que existe no Brasil hoje um fator que nos desestabiliza.

Trata-se do ex-presidente Lula. Ele é um fenômeno na capacidade de comunicação com as massas e, hoje, é muito mais perigoso que no passado. Nós erramos em 2002, quando dissemos que não importaria, se ele ganhasse a Presidência naquele ano. Não imaginávamos que o Lula de 2002 evoluiria para um político que valoriza o nacionalismo. Possivelmente, o contato com lideres da China, Rússia, Índia e de outros países, a interferência do seu chanceler Celso Amorim e o entendimento da riqueza que representa o Pré-Sal o levaram a ser mais consciente da questão geopolítica.

- Encaminhe a nossa proposta de reversão desta perda eleitoral. É preciso deixar claro que para nós é inconcebível o Pré-Sal não ficar aberto a nossas empresas.

- Obviamente, temos que recuperar o poder para as nossas mãos. Um golpe através dos militares não é mais viável porque, primeiro, eles saíram muito marcados do período recente em que estiveram no poder, pois a população guarda lembrança de torturas e assassinatos de lideranças neste período e, em segundo lugar, não sabemos ao certo como pensa, atualmente, o militar brasileiro. Temos a nosso dispor para ajudar em qualquer projeto que decidirmos a mídia comercial local, que é nossa, o empresariado brasileiro, com raríssimas exceções, a grande maioria dos políticos do país, que são sem escrúpulos e corruptíveis. Temos também parcela do judiciário local, que é uma casta complexa em que residem egos avantajados. Temos uma arma secreta que é o treinamento de pessoal da Justiça e de ocupantes do Ministério da Justiça aqui, conosco. O mote para nossas ações a ser transmitido para todos os brasileiros será a luta contra a corrupção.

A verdade é que a corrupção vem acontecendo no Brasil há anos. Por exemplo, somos conhecedores da corrupção dentro da Petrobras desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, mas, se tivermos que entregar a nossos aliados no Brasil, divulgaremos só os fatos dos períodos Lula e Dilma. Aliás, um ponto que precisa ser providenciado urgentemente é quebrar esta empresa, por tudo que ela representa. Ela é o próprio “vírus” nacionalista. Não podemos deixar no Brasil uma concorrente das nossas empresas querendo roubar o Pré-Sal de nós. O pior que pode nos acontecer é nosso plano ser identificado como contrário aos interesses brasileiros. Não se pode deixar o sentimento nacionalista brotar. Por isso, é recomendável não se aliar a ninguém que tenha algum compromisso nacionalista por mínimo que seja, a menos de torcer pela seleção de futebol do Brasil. Devemos reconhecer que o período neoliberal globalizante, cujo auge foi durante o governo de Fernando Henrique, alijou quase por completo qualquer sentimento nacionalista.

Trabalhamos bem, então. A partir daí, o nacionalismo foi vinculado ao atraso, ao passado distante e ao autoritarismo. Depois desta época, candidatos têm procurado reabilitar as teses nacionalistas, mas têm sido massacrados nas eleições. Naquela época, o brasileiro “foi conquistado”, em grande parte graças à nossa mídia “brasileira”, que nos ajuda muito.

- Acabou, Greg? Porque creio que chegou a hora de falarmos dos suportes financeiros para as ações que desenvolveremos. Antes, é preciso deixar claro que todas as ações de inteligência e o suporte das embaixadas serão dados sem custo algum. Mesmo o custo para corromper será rateado entre as nossas empresas beneficiadas e o nosso governo. Falará, agora, nosso especialista em compor estruturas de financiamento de projetos.

- Obrigado. Representantes de todas as grandes empresas com interesses econômicos no Brasil foram chamadas. Trata-se de investir neste projeto, agora, para podermos usufruir principalmente de recursos minerais a preços baixos por horizonte confortável, alem de usufruir com a venda de nossos produtos no mercado brasileiro.

Obviamente, não há certeza absoluta do sucesso do projeto, mas se trabalharmos de forma inteligente sem nos atrapalharmos, a grande probabilidade é que, logo, logo, fecharemos contratos de 30 a 40 anos que serão usados para garantir o processo de dominação. A qualquer época, eles serão acenados como contratos juridicamente perfeitos que precisam ser honrados. As petrolíferas, por serem grandes beneficiárias, serão as que contribuirão com maiores parcelas. Não vamos entrar em detalhes agora. Mas este material está à disposição das empresas. A boa notícia é que os deputados e senadores brasileiros eleitos junto com a presidente Dilma, na sua maioria, são nossos e não foram baratos para nós. Inclusive esta “compra” já foi feita e os senhores não precisam mais contribuir. A partir de agora, sabemos que, para cada projeto específico, eles serão favoráveis, bastando acertar algum valor adicional.

O grande projeto de retirada do poder das mãos de Dilma e entrega a pessoa de nossa confiança ainda está sendo planejado. Tudo leva a crer que será uma obra intrincada envolvendo o Judiciário, Ministérios do governo, a mídia comercial, políticos das duas Casas do Congresso do Brasil e movimentos sociais financiados por nós. Contudo, a mídia terá o papel principal, pois irá gerar a novela da deposição da presidente, consistente e compreensível pelo grande público.

- Muito bem. Acho que chegamos ao fim da reunião. Comunicaremos sempre fatos relevantes. Quaisquer informações que tenham, por favor, nos passem. Este processo será um pouco demorado. Leiam os jornais e tudo que inocentemente acontecer podem ter certeza que foi providenciado.

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

REVOLUÇÃO NOS EUA?

O pré-candidato à presidência dos EUA Bernie Sanders chegou bem alto em sua campanha, antes de ser derrotado pela candidata do establishment, Hillary Clinton Ele trouxe muitas das promessas em seu tempo feitas por Obama , e não cumpridas. Mais, colocou-se como socialista, contra o poder das corporações, por um combate às desigualdades. Agora, inicia um movimento que chama Our Revolution, cujo objetivo é de continuar a impulsionar a agenda da esquerda estadunidense. É interessante acompanhar mais esse movimento, colocando esse título no Google. 

O que falta a eles é tomar posição clara em favor de promover a paz, de renúncia à imposição de mudanças de regime em todo o mundo. Mas talvez seja pedir demais, pelo menos neste momento. 

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

LADISLAU DOWBOR SOBRE A VIDA QUE VIVEMOS E PODEMOS VIVER

Do Outras Palavras. Como sempre, ótimo. Só que não deve ter havido tradução, ele é daqui mesmo!


POR 
– ON 23/08/2016CATEGORIAS: CAPACRISE FINANCEIRAMUNDO
Saídas para evitar um colapso civilizatório são evidentes – mas nunca estiveram tão bloqueadas. A questão crucial: teremos tempo para chegar a um Plano B?
Por Ladislau Dowbor | Tradução: Inês Castilho | Imagem: Banksy
Difícil deixar de pensar que estamos vivendo num circo gigante. Quando sentamos no sofá depois de um dia bizarro de trabalho e horas de transporte, as novelas surreais na TV nos dão uma visão geral do jogo global: tantas bombas sobre a Síria, mais refugiados nas fronteiras, os problemas das grandes finanças, os últimos gols de Neimar. Ah sim, e quem, depois da Hungria, a Grécia, a Polônia e o Reino Unido está ameaçando deixar a União Europeia em nome de ideais nacionais superiores.
É um jogo e tanto. Relatórios do Crédit Suisse e da Oxfam mostram a grande divisão entre os donos do jogo e os espectadores: 62 bilionários têm mais riqueza do que os 50% mais pobres da população mundial. Eles produziram tudo isso? Evidentemente, tudo depende de que papel você desempenha no jogo. Em São Paulo, os muito ricos que habitam o condomínio de Alphaville estão murados em segurança, enquanto os pobres que vivem na vizinhança se autodenominam Alphavella. Alguém precisa cortar a grama e entregar as compras.
De acordo com o relatório global da WWF sobre a destruição da vida selvagem, 52% das populações de animais não-domesticados desapareceram, durante os 40 anos que vão de 1970 a 2010. Muitas fontes de água estão contaminadas ou secando. Os oceanos estão gritando por socorro, o ar condicionado prospera. As florestas estão sendo derrubadas na Indonésia, que substituiu a Amazônia como a região número um do mundo em desmatamento. A Europa precisa ter energia renovável, de carne barata e da beleza do mogno.
A Rede de Justiça Fiscal revelou que cerca de 30 trilhões de dólares – comparados a um PIB mundial de US$ 73 trilhões – eram mantidos em paraísos fiscais em 2012. O Banco de Compensações Internacionais da Basileia mostra que o mercado de derivativos, o sistema especulativo das principais commodities, alcançou 630 trilhões de dólares, gerando o efeito iôiô nos preços das matérias-primas econômicas básicas. O maior jogo do planeta envolve grãos, minerais ferrosos e não ferrosos, energia. Essas commodities estão nas mãos de 16 corporações basicamente, a maior parte delas sediadas em Genebra, como revelou Jean Ziegler em “A Suiça lava mais branco”. Não há árbitro neste jogo, estamos num ambiente vigiado. Os franceses têm uma excelente descrição para os nossos tempos: vivemos une époque formidable!
Fizemos um trabalho perfeito em 2015: a avaliação global sobre como financiar o desenvolvimento em Adis Abeba, as metas do desenvolvimento sustentável para 2030 em Nova York e a cúpula sobre mudanças climáticas em Paris. Os desafios, soluções e custos foram claramente expostos. Nossa equação global é suficientemente simples para ser executada: os trilhões em especulação financeira precisam ser redirecionados para financiar inclusão social e para promover a mudança de paradigma tecnológico que nos permitirá salvar o planeta. E a nós mesmos, claro.
Mas são os lobos de Wall Street que traçaram o código moral para este esporte: Ganância é Ótima!
Afogando em números
Estamos nos afogando em estatísticas. O Banco Mundial sugere que deveríamos fazer algo a respeito dos news four biliion – referindo-se aos quatro bilhões de seres humanos “que não têm acesso aos benefícios da globalização” – uma hábil referência aos pobres. Temos também os bilhões que vivem com menos de 1,25 dólar por dia. A FAO nos mostra em detalhes onde estão localizadas as 800 milhões de pessoas famintas do mundo. A Unicef conta aproximadamente 5 milhões de crianças que morrem anualmente em razão do acesso insuficiente a comida e água limpa. Isso significa quatro World Trade Centers por dia, mas elas morrem silenciosamente em lugares pobres, e seus pais são desvalidos.
As coisas estão melhorando, com certeza, mas o problema é que temos 80 milhões de pessoas a mais todo ano – a população do Egito, aproximadamente – e este número está crescendo. Um lembrete ajuda, pois ninguém entende de fato o que significa um bilhão: quando meu pai nasceu, em 1900, éramos 1,5 bilhão; agora somos 7,2 bilhões. Não falo da história antiga, falo do meu pai. E já que não é da nossa experiência diária entender o que é um bilionário, vai aqui uma nova imagem: se você investe um bilhão de dólares em algum fundo que paga miseráveis 5% de juros ao ano, ganha 137.000 dólares por dia. Não há como gastar isso, então você alimenta mais circuitos financeiros, tornando-se ainda mais fabulosamente rico e alimentando mais operadores financeiros.
Investir em produtos financeiros paga mais do que investir na produção de bens e serviços – como fizeram os bons, velhos e úteis capitalistas – de modo que não tem como o acesso ao dinheiro ficar estável, muito menos gotejar para baixo. O dinheiro é naturalmente atraído para onde ele mais se multiplica, é parte da sua natureza, e da natureza dos bancos. Dinheiro nas mãos da base da pirâmide gera consumo, investimento produtivo, produtos e empregos. Dinheiro no topo gera fabulosos ricos degenerados que comprarão clubes de futebol, antes de finalmente pensar na velhice e fundar uma ONG – por via das dúvidas.
Um suborno global
Muita gente percebe que as regras do jogo são manipuladas. Os tempos são de fraude global, quando pessoas fabulosamente ricas doam a políticos e promovem a aprovação de leis para acomodar suas crescentes necessidades, fazendo da especulação, da evasão fiscal e da instabilidade geral um processo estrutural e legal. Lester Brown fez suas somatórias ambientais e escreveu Plano B [“Plan B”], mostrando claramente que o atual Plano A está morto. Gus Speth, Gar Alperovitz, Jeffrey Sachs e muitos outros estão trabalhando no Próximo Sistema[“Next System”], mostrando, implicitamente, que nosso sistema foi além de seus próprios limites.
Joseph Stiglitz e um punhado de economistas lançaram Uma Agenda para a Prosperidade Compartilhada, rejeitando “os velhos modelos econômicos”. De acordo com sua visão, “igualdade e desempenho econômico constituem na realidade forças complementares, e não opostas”. A França criou seu movimento de Alternativas Econômicas; temos a Fundação da Nova Economia no Reino Unido; e estudantes da economia tradicional estão boicotando seus estudos em Harvard e outras universidades de elite. Mehr licht! [Mais luz!]
E os pobres estão claramente fartos desse jogo. Sobram muito poucos camponeses isolados e ignorantes prontos a se satisfazer com sua parte, seja ela qual for. As pessoas pobres de todo o mundo estão crescentemente conscientes de que poderiam ter uma boa escola para seus filhos e um hospital decente onde pudessem nascer. E além disso veem na TV como tudo pode funcionar: 97% das donas de casa brasileiras têm aparelho de TV, mesmo quando não têm saneamento básico decente.
Como podemos esperar ter paz em torno do lago que alguns chamam de Mediterrâneo, se 70% dos empregos são informais e o desemprego da juventude está acima de 40%? E eles estão assistindo na TV o lazer e a prosperidade existentes logo ali, cruzando o mar, em Nice? A Europa bombardeia-os com estilos de vida que estão fora do seu alcance econômico. Nada disso faz sentido e, num planeta que encolhe, é explosivo. Estamos condenados a viver juntos, o mundo é plano, os desafios estão colocados para todos nós, e a iniciativa deve vir dos mais prósperos. E, felizmente, os pobres não são mais quem eram.
Cultura e convivialidade
Sempre tive uma visão muito mais ampla de cultura do que o tradicional “Ach! disse Bach”. Penso que ela inclui desfrutar de alegria com os outros, enquanto se constrói ou se escreve alguma coisa, ou simplesmente se brinca por aí. Convivialidade. Recentemente passei algum tempo em Varsóvia. Nos fins de semana de verão, os parques e praças ficavam cheios de gente e havia atividades culturais para todo lado.
Ao ar livre, com um monte de gente sentada no chão ou em simples cadeiras de plástico, uma trupe de teatro fazia uma paródia do modo como tratamos os idosos. Pouco dinheiro, muita diversão. Logo adiante, em outras partes do parque Lazienki, vários grupos tocavam jazz ou música clássica, e as pessoas estavam sentadas na grama ou assentos improvisados, as crianças brincando por perto.
No Brasil, com Gilberto Gil no ministério da Cultura, foi criada uma nova política, os Pontos de Cultura. Isso significou que qualquer grupo de jovens que desejassem formar uma banda poderiam solicitar apoio, receber instrumentos musicais ou o que fosse necessário, e organizar shows ou produzir online. Milhares de grupos surgiram – estimular a criatividade requer não mais que um pequeno empurrão, parece que os jovens trazem isso na própria pele.
A política foi fortemente atacada pela indústria da música, sob o argumento de que estávamos tirando o pão da boca de artistas profissionais. Eles não querem cultura, querem indústria de entretenimento, e negócios. Por sorte, isso está vindo abaixo. Ou pelo menos a vida cultural está florescendo novamente. Os negócios têm uma capacidade impressionante para ser estraga-prazeres.
O carnaval de 2016 em São Paulo foi incrível. Fechando o círculo, o carnaval de rua e a criatividade improvisada estão de volta às ruas, depois de ter sido domados e disciplinados, encarecidos pela comunicação magnata da Rede Globo. As pessoas saíram improvisando centenas de eventos pela cidade, era de novo um caos popular, como nunca deixou de ser em Salvador, Recife e outras regiões mais pobres do país. O entretenimento do carnaval está lá, é claro, e os turistas pagam para sentar e assistir ao show rico e deslumbrante, mas a verdadeira brincadeira está em outro lugar, onde o direito de todo mundo dançar e cantar foi novamente conquistado.
Um caso de consumo
Eu costumava jogar futebol bastante bem, e ia com meu pai ver o Corinthians jogar no tradicional estádio do Pacaembu, em São Paulo. Momentos mágicos, memórias para a vida inteira. Mas principalmente brincávamos entre nós, onde e quando podíamos, com bolas improvisadas ou reais. Isso não é nostalgia dos velhos e bons tempos, mas um sentimento confuso de que quando o esporte foi reduzido a ver grandes caras fazendo grandes coisas na TV, enquanto a gente mastiga alguma coisa e bebe uma cerveja, não é o esporte – mas a cultura no seu sentido mais amplo – que se transformou numa questão de produção e consumo, não em alguma coisa que nós próprios criamos.
Em Toronto, fiquei pasmo ao ver tanta gente brincando em tantos lugares, crianças e gente idosa, porque espaços públicos ao ar livre podem ser encontrados em todo canto. Aparentemente, por certo nos esportes, eles sobrevivem divertindo-se juntos. Mas isso não é o mainstream, obviamente. A indústria de entretenimento penetrou em cada moradia do mundo, em todo computador, todo telefone celular, sala de espera, ônibus. Somos um terminal, um nó na extensão de uma espécie de estranho e gigante bate-papo global.
Esse bate-papo global, com evidentes exceções, é financiado pela publicidade. A enorme indústria de publicidade é por sua vez financiada por uma meia dúzia de corporações gigantes cuja estratégia de sobrevivência e expansão é baseada na transformação das pessoas em consumidores. O sistema funciona porque adotamos, docilmente, comportamentos consumistas obsessivos, ao invés de fazer música, pintar uma paisagem, cantar com um grupo de amigos, jogar futebol ou nadar numa piscina com nossas crianças.
Um punhado de otários consumistas
Que monte de idiotas consumistas nós somos, com nossos apartamentos de dois ou três quartos, sofá, TV, computador e telefone celular, assistindo o que outras pessoas fazem.
Quem precisa de uma família? No Brasil o casamento dura 14 anos e está diminuindo, nossa média é de 3,1 pessoas por moradia. A Europa está na frente de nós, 2,4 por casa. Nos EUA apenas 25% das moradias têm um casal com crianças. O mesmo na Suécia. A obesidade está prosperando, graças ao sofá, a geladeira, o aparelho de TV e as guloseimas. Prosperam também as cirurgias infantis de obesidade, um tributo ao consumismo. E você pode comprar um relógio de pulso que pode dizer quão rápido seu coração está batendo depois de andar dois quarteirões. E uma mensagem já foi enviada ao seu médico.
O que tudo isso significa? Entendo cultura como a maneira pela qual organizamos nossas vidas. Família, trabalho, esportes, música, dança, tudo o que torna minha vida digna de ser vivida. Leio livros, e tiro um cochilo depois do almoço, como todo ser humano deveria fazer. Todos os mamíferos dormem depois de comer, somos os únicos ridículos bípedes que correm para o trabalho. Claro, há esse terrível negócio do PIB. Todas as coisas prazerosas que mencionei não aumentam o PIB – muito menos minha sesta na rede. Elas apenas melhoram nossa qualidade de vida. E o PIB é tão importante que o Reino Unido incluiu estimativas sobre prostituição e venda de drogas para aumentar as taxas de crescimento. Considerando o tipo de vida que estamos construindo, eles talvez estejam certos.
Necessitamos de um choque de realidade. A desventura da terra não vai desaparecer, levantar paredes e cercas não vai resolver nada, o desastre climático não vai ser interrompido (a não ser se alterarmos nosso mix de tecnologia e energia), o dinheiro não vai fluir aonde deveria (a não ser que o regulemos), as pessoas não criarão uma força política forte o suficiente para apoiar as mudanças necessárias (a não ser que estejam efetivamente informadas sobre nossos desafios estruturais). Enquanto isso, as Olimpíadas e MSN (Messi, Suarez, Neymar para os analfabetos) nos mantêm ocupados em nossos sofás. Como ficará, com toda a franqueza, o autor destas linhas. Sursum corda.


segunda-feira, 22 de agosto de 2016

BANDIDAGEM SOLTA

Refiro-me à bandidagem do conluio mídia-judiciário-legislativo. Artigo publicado no Jornal GGN

O Jornal de todos Brasis

1.9K
SAB, 20/08/2016 - 12:14
ATUALIZADO EM 20/08/2016 - 12:14

“Lula Triplex” no Google 396 mil. Só duas na PF
por Armando Rodrigues Coelho Neto
Li, ontem, o relatório da PF sobre o tríplex do Guarujá, que vazou atrasado. Quem ousaria dizer não estarmos diante de uma peça bem feita? Índice, citações, transcrições, aranhas, documentos, gráficos, etc, tudo como manda o figurino. Está, tecnicamente, como deve ser um bom trabalho. Mas, ainda é cedo para proclamar a inocência de Lula e ou Marisa, pelo simples fato de não estarem indiciados.
A PF prova que o tríplex 163-B (Guarujá/SP) está registrado em nome da offshore MURRAY HOLDINGS LLC (NEVADA/EUA), representada no Brasil por Eliana Pinheiro de Freitas, pessoa simples, cujo padrão de vida destoa do alto padrão do apartamento. A verdadeira proprietária seria Nelci Warken, procuradora de outras offshores. Para o leigo, "offshore " é uma entidade situada no exterior, sujeita a um regime legal diferente do pais onde vive um “associado”.
A PF solicita o envio de peças para aqui, para acolá, para um monte de siglas que não cito para confundir o leigo. Afinal, já o diz a perspicaz observadora Marilena Chauí: no Brasil, “sigla só serve pra esconder a finalidade das coisas”. A PF também diz que não faz isso ou aquilo “para não perder o foco”. Que foco?!! Posso presumir do baixo ou do alto de meus mais de 30 anos de casa, mas não arrisco dizer.
Como tudo na Farsa Jato é calculado, chama a atenção o atraso no vazamento do relatório. É um relatório bem feito. Tão bem feito quanto os bolinhos envenenados que Joana queria mandar pro Jasão, na peça Gota D’Agua (Chico Buarque). Tão bem feito quanto uma estátua de Hitler esculpida pelo mais radical e talentoso escultor antinazista. Tão bem feito quanto os argumentos de um pastor para roubar um fiel. Mas, esconde maldades, não do meu colega.
É um relatório a altura de um Poder Judiciário com partido. Contém um rol de verdades, que é a melhor forma de mentir. Como o documento é longo, joguei de cara um “Control F” para localizar rapidamente o nome do ex-presidente Lula. Seu nome aparece duas vezes de forma quase aleatória. A pretensa proprietária (Nelci Warken ) diz que havia um boato entre condôminos de que Lula seria dono de um tríplex (Guarujá/SP). Na outra, a testemunha diz que Lula “tem”, mas não informa prova nem referências de pesquisas para comprovação.
A testemunha diz que pra fugir da fúria fiscal do ex-prefeito Kassab, passou a blindar bens. Assim, criou uma dívida fantasma com uma empresa fantasma dela mesma e firma essa tomou seus bens para pagar a dívida. Mas, sobre Lula/Marisa só boatos e inconsistências. Boatos que alimentaram o ódio útil ao golpe. A grande imprensa, que o GGN por uma questão de princípios não quer que eu trate por “latrina”, não passa disso mesmo: latrina criminosa.
Além do atraso no vazamento, da falta de provas (até agora) contra Lula/Marisa, do explícito uso da Farsa Jato para o golpe, o que se extrai de real no relatório é o mecanismo de ocultação de capitais. O relatório mostra um sofisticado esquema de lesa-Pátria - que não foi criado, inventado, nem concebido no governo petista. Sérgio Moro sabe disso, pois autuou em caso semelhante com o mesmo esquema, o mesmo doleiro, ainda quando as técnicas eram mais artesanais e, portanto, mais fáceis de serem apuradas.
O esquema não tão novo mostrado pela Farsa Jato serve pra roubar mesmo, razão pela qual precisa ser investigado, combatido e não usá-lo contra o Lula, Marisa, o PT, nem para destruir o patrimônio nacional. Afinal, a Farsa Jato tem a obrigação de saber que a diferença entre o antídoto e o veneno está na dose. A dose está destruindo o patrimônio nacional, matando empregos, a democracia, matando o Brasil.
Mas, o que me chamou mais atenção está fora do relatório. Quem pesquisa “Lula Triplex” no Google encontra 396 mil citações! Já no relatório da PF, apenas duas vezes! Leia-se, um destroçamento moral patrocinado por um “juiz de primeira instância”, em conluio com a mídia, sem precedentes numa verdadeira democracia. Não sei que nome a dita Suprema Corte do Brasil dá pra isso, nem o Tribunal Penal Internacional, menos ainda a ONU - que ainda se dá ao trabalho de responder minhas mensagens.
Só falta o pedalinho. Pode prender o Lula. Eu vou lá, levar rapadura, tapioca e pinga pra ele. Se o Judiciário têm bandidos de estimação, já escolhi o meu!

Armando Rodrigues Coelho Neto é advogado e jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

PARA COMEÇAR A SEMANA

Tirado do Tijolaço

Eleonora de Lucena: não é só um mandato; é um país


Direto ao ponto, com meus aplausos, o texto de Eleonora de Lucena – de novo, brilhante -, na Folha de S. Paulo:

Truculência

Eleonora de Lucena, na Folha
O Brasil entrou no centro da disputa geopolítica mundial. Tem riquezas naturais, mercado interno, posição estratégica. Construiu economia diversificada e complexa, terreno para grandes empresas nacionais e ambiente potencial para desenvolvimento de tecnologias de ponta.
Os Estados Unidos, acostumados a nadar de braçada no continente, começaram a ver o avanço chinês no que consideram seu quintal. Investimentos, comércio, parcerias com os orientais cresceram de forma exponencial.
Não parece ser coincidência a intenção norte-americana de voltar a ter bases militares na América do Sul (na sempre sensível tríplice fronteira e na Patagônia, que vigia o estreito de Magalhães, curva entre dois mundos). Nem parece ser ao acaso a escolha dos alvos do momento: a Petrobras, as grandes empresas e até o programa nuclear.
Nos últimos anos, o país mostrou zelar por sua autonomia e buscou alianças fora da influência dos EUA. Com China, Rússia, Índia e África do Sul, o Brasil ergueu os Brics e um banco de desenvolvimento inovador.
Aqui, reforçou o Mercosul -alvo imediato de ataque feroz do interino, afoito em mostrar serviço para o Norte e ressuscitar relações subalternas.
Esse contexto maior escapa da verborragia conservadora, ansiosa em reduzir a crise atual a um confronto raso entre supostos corruptos e hipotéticos éticos. Bastaram poucas semanas para deixar evidente a trama hipócrita e podre do bando que tenta abocanhar o poder.
O que está em jogo é muito mais do que uma simples troca de governo. É a própria ideia de país.
Falar de luta de classes e de projeto nacional deixou alguns leitores ouriçados. Mas, apesar da operação de marketing em curso, os objetivos do atropelo à Constituição são claros: concentrar riqueza, liberar mercados, desnacionalizar a economia, desmantelar o Estado.
O discurso dos sem-voto que se aboletaram no Planalto tenta editar um macarthismo tosco, elegendo um inimigo interno. Agridem os de vermelho (sempre eles!), citados como os culpados de todo o mal, numa manobra conhecida dos movimentos fascistas desde o início do século 20.
Quem se atreve a discordar do rolo compressor elitista é logo tachado de “maluco” pelos replicantes da direita raivosa. Dizem que os que apontam as contradições atuais são saudosos do século 19.
Viúvos do século 19 são os que querem agora surrupiar direitos e restabelecer condições de exploração do trabalho daqueles tempos. Com a retórica de uma suposta modernidade, atacam conquistas sociais e pregam o desmonte da corajosa Constituição de 1988.
Alegam que a matemática não permite que o Estado cumpra suas funções perante os cidadãos. Para eles, a matemática deve servir apenas aos mais ricos e a seus juros maravilhosos. Num giro chinfrim, mandam às favas o tal controle do deficit público: gastam tudo para atender corporações, amigos e ganhar votos.
Com uma cortina de fumaça, arriscam confundir esquerda com autoritarismo. Projetam, assim, no adversário, os seus desejos ocultos. Afinal, o programa dos não eleitos só poderá ser implantado integralmente num regime de força, que censure e elimine a voz dos mais fracos.
As exibições de truculência absurda nos estádios da Olimpíada, proibindo manifestações de “Fora, Temer!” e rasgando os direitos constitucionais de livre manifestação e opinião, parecem ser uma terrível amostra de tempos sombrios pela frente.
O Senado vai enfrentar o julgamento da história.

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

UMA DAS DUAS RAZÕES DO GOLPÉ

A outra são as políticas de redução de desigualdade dos governos Lula e Dilma. Saiu no jornal GGN

DOM, 07/08/2016 - 15:05

no Senhor X
por Fernando Rosa
Em meados dos anos setenta, o general Ernesto Geisel, então presidente do Brasil, inaugurou uma nova fase da política externa brasileira em relação aos Estados Unidos. Assinou o Acordo Nuclear Brasil-Alemanha, que resultou nas usinas Angra I e II, provocando grande tensão com os ainda parceiros da “doutrina de segurança nacional”. Também abriu relações diplomáticas e comerciais com a República Popular da China, desafiando o núcleo duro dos militares, então comandado pelo general Silvio Frota.
Na época, questionado sobre a proposta de aproximar-se da China, “porque era comunista”, Geisel foi taxativo na defesa de uma política de multilateralidade nas relações internacionais, segundo conta o livro “O caso dos nove chineses”. “Se vocês querem ser coerentes, então, vamos cortar relações com a Rússia também e vamos nos isolar, vamos virar uma colônia dos Estados Unidos”, respondeu ele, mantendo a sua posição. E desde então, a relação entre Brasil e China cresceu até chegar aos níveis atuais.
Passados quarenta anos, nesta semana os golpistas interinos decidiram dar mais um passo para revogar a política externa brasileira, desde Geisel, e retornar ao alinhamento submisso aos Estados Unidos. A declaração de imprensa do ministro de Relações Exteriores José Serra com o Secretário de Estado dos EUA é uma afronta à soberania nacional. Talvez seja a peça mais acovardada de um representante de Estado diante de outro representante de Estado, fora de épocas de guerra – vejam o vídeo abaixo.
A presença do Secretário de Estado John Kerry, por si só já deu a dimensão do tipo de relação que os Estados Unidos têm para oferecer ao Brasil, muito distante de investimentos econômicos. O único interesse americano no Brasil é militar, é garantir a instalação de suas bases militares em território nacional, como já fez na Argentina. É também fazer do Brasil um parceiro de sua política mundial belicista de “combate ao terror”, para transformar nossos vizinhos em inimigos, traficantes e “bases” do EI.
Na declaração à imprensa, o ministro José Serra deixou claro a sua cumplicidade com a estratégia geopolítica norte-americana para o continente sul-americano. Alinhando-se ao discurso hipócrita do Império, Serra destacou a parceria para “defender a democracia e os direitos humanos” no Brasil e na região. As cenas explicitas de “viralatice” chegaram ao ponto do ministro José Serra “abrir” infantilmente seu “voto” a senhora Hillary Clinton, em meio ao riso amarelo de Kerry.
Isso, enquanto segue em curso no país um golpe de estado, em boa parte operado por ele e pelo seu partido, o PSDB, derrotado nas últimas eleições realizadas no país. Também ao mesmo tempo em que cidadãos são presos e expulsos dos estádios apenas por exercerem seu direito democrático de discordar dos golpistas. Ou que, um juiz praticamente filiado ao PSDB, pede a cassação do registro de um partido, o PT, situação registrada anteriormente apenas em tempos de ditaduras.
Aliás, o alinhamento suicida e vira-lata aos Estados Unidos, pelo visto, é o que resta aos golpistas, tamanho seu isolamento mundial, ainda mais evidente depois da abertura das Olimpíadas. A Olimpíada reúne 206 nações, mas apenas 18 chefes de Estado e de governo compareceram à abertura, segundo revelou o Estadão, que não teve como esconder o fiasco diplomático. A Copa do Mundo, em 2014, para comparar, menor e com muitos menos interesse oficial, contou com representantes de 32 países.
O grande gesto diplomático, ao contrário da rendição “explícita” da declaração à imprensa, foi dada pelos atletas chineses, na passarela das delegações, longe do oportunismo politiqueiro de Serra e seu “amigo” Kerry. Segurando as duas bandeiras – da China e do Brasil – fizeram mais do que apenas “tentar” ganhar a simpatia da torcida brasileira, como disseram os estúpidos comentaristas das televisões. Trataram as relações dos países com a dimensão de amizade, cordialidade e respeito entre povos.


sexta-feira, 5 de agosto de 2016

O XADREZ DO GOLPE HOJE, POR LUIS NASSIF

·         O XADREZ DO GOLPE
SEX, 05/08/2016 - 00:39
ATUALIZADO EM 05/08/2016 - 07:05

Caso 1 – cenas de uma República risonha e franca
O Ministro interino da Casa Civil, Eliseu Padilha, é acusado de ter manobrado ilegalmente certificados de filantropia para uma Universidade Privada em troca de bolsas para apaniguados e contratos para suas empresas (http://migre.me/uz6NF).
Também é réu por jogadas com precatórios envolvendo o DNER (Departamento Nacional de Estradas de Rodagem). Como Ministro dos Transportes, valeu-se de um acordo extrajudicial para repassar R$ 2,3 milhões a uma empresa gaúcha (http://migre.me/uz6Vv).
Foi condenado em R$ 300 mil por manter um servidor fantasma (http://migre.me/uz6Sv).
Em 2011 foi indiciado pela Polícia federal por formação de quadrilha na construção das barragens Jaguari e Taquarengó (http://migre.me/uz711).
É feliz proprietário de um terreno onde se instalou um parque eólico, Padilha recebe R$ 1,5 milhão por ano apenas por estar na corrente do vento (http://migre.me/uz7t8), embora vozes maliciosas sugerissem se tratar de propina da EDP.
Mas passou a controlar a Secom (Secretaria da Comunicação) e a inundar sites e blogs da velha mídia com o controle centralizado da publicidade de todas as estatais.
Com isso, transmudou—se. Eliseu Padilha aparece nos jornais com aspecto grave, pontificando sobre reforma da Previdência, reforma administrativa, diplomacia. Tem a última palavra para liberar verbas milionárias para estados (http://migre.me/uz7vQ). Tornou-se o segundo homem mais poderoso de um país continental, com mais de 200 milhões de habitantes. E sob as vistas benevolentes dos mais intimoratos defensores da moralidade pública que a República já conheceu: o Procurador Geral da República Rodrigo Janot, a Força tarefa da Lava Jato, colunistas moralistas da velha mídia.
Cena 2 – a destruição de direitos sociais
Montou-se o seguinte pacto dos justos:
1.     Em 2016 o orçamento federal será utilizado para pagar a conta do impeachment. Houve aumento para as emendas parlamentares, para as carreiras que mais contribuíram para a vitória. Ao mesmo tempo, manteve-se no Banco Central a política de Selic a 14,15% com apreciação cambial, propiciando enormes lucros para os especuladores que apostaram na queda do dólar pós-golpe.
2.     O enorme déficit contratado para 2016 e 2017 será compensado pela lei de limitação de gastos públicos. Se congelarão as despesas no menor nível da década (porque após dois anos de recessão). Depois de aprovada a lei, só poderão ser corrigidas pela inflação. Como os gastos com a Previdência continuarão aumentando, pelo envelhecimento da população, haverá cada vez menos recursos para saúde, educação, políticas assistenciais e todos os demais gastos públicos. E a conta de juros continuará sem limitações.
3.     A lambança fiscal deste ano ajudará de algum modo na recuperação moderada da economia. A médio prazo, a situação não será sustentável, a menos que se coloque o Exército nas ruas para administrar a segurança.
4.     A estratégia não é eleitoralmente viável para 2018. Mesmo esperando alguma recuperação da economia – que parece ter batido no fundo do poço.
Tem-se, então, um modelo em xeque.
O atual grupo de poder conseguiu salvo-conduto na condição de abrir o saco de maldades e liquidar com direitos consagrados na Constituição de 1988.
Mas vai-se chegar a 2018 com a dívida pública muito mais elevada – devido às lambanças desses dois anos – e sem a menor garantia de manutenção desse pacote devido a essa inconveniência das democracias chamada de voto popular.
Não é nenhum pouco factível a ideia de um grupo de desprendidos, dispostos a passar dois anos praticando maldades para depois passar o bastão para terceiros.
De duas, uma: ou prolongarão a irresponsabilidade fiscal; ou tratarão de se articular para impedir as eleições de 2018.
Cena 3 – os sinais da ditadura que se avizinha
Conforme o “Xadrez” antecipou, o caminho natural será apostar na figura do inimigo interno visando primeiro partir para uma democracia mitigada e, mais à frente, para um endurecimento maior do regime, provavelmente inviabilizando 2018.
O grupo que tomou o poder é alvo de muitas críticas. Mas há de se reconhecer que, no exercício do poder, são profissionais, incomparavelmente mais eficientes do que o amadorismo constrangedor do governo deposto: sabe intimidar os que se intimidaram; e a comprar os que se vendem.
Basta ver a reação da cúpula do governo à informação de que Michel Temer estaria inelegível pela Lei da Ficha Limpa: “Não tem problema: mudaremos a lei”.
Hoje em dia, todas as nomeações, inclusive de funcionários concursados, passam pelo crivo do Ministro Padilha, com a assessoria do general Sérgio Etchegoyen, do GSI (Gabinete de Segurança Institucional). Há um estímulo à delação, visando eliminar qualquer sinal de resistência na máquina pública.
Multiplicam-se as ações contra Lula do mesmo modo que desaparecem as ações contra políticos do PSDB. Tanto na PGR quanto na Força Tarefa da Lava Jato mantém informações sob sigilo, só sendo vazadas informações contra Lula e o PT.
Cena 4 – os responsáveis
Seria esse o objetivo final do Procurador Geral da República Rodrigo Janot, da força-tarefa da Lava Jato, do juiz Sérgio Moro, da Globo, de entregar o país a um grupo tão polêmico? Tenho para mim que não.
Então o que leva forças tão díspares a montarem uma operação de tal envergadura, derrubando uma presidente de forma ilegítima, para entregar o poder a um grupo tão polêmico?
As ditaduras não nascem do nada. São semeadas, irrigadas, até ganhar vida própria.
A base da psicologia de massa do fascismo, dos movimentos violentos europeus dos anos 30, consistia em centrar a intolerância em uma figura ou um grupo e ir alimentando gradativamente o ódio, até que a besta saísse às ruas.
Criado o efeito manada, no início consegue-se manipular a coesão contra o inimigo comum, levantando o grande véu debaixo do qual misturam-se do exercício do preconceito mais odioso, o personalismo mais entranhado às jogadas mais rasteiras, mas todos imbuídos da orientação divina de erradicar o mal.
Destampada a caixa de Pandora, gradativamente a besta vai ganhando vida própria e todos os atores, em volta, acabam sendo conduzidos pelo turbilhão que pretendiam controlar.
Quando a grita contra Lula e o PT tornou-se hegemônica, Janot resolveu surfar na onda. No início, dá uma indizível sensação de onipotência.
Provavelmente o que se passava na sua cabeça foi isso, um tremendo sentimento de onipotência. Julgava que o primeiro passo seria defenestrar Dilma e prender Lula. Ficaria tocado por um poder tão avassalador que o segundo passo seria pegar o PMDB.
No momento do segundo passo, o aprendiz de feiticeiro deu uma tacada altíssima: o pedido de prisão de vários senadores com base em grampos de Sérgio Machado. O álibi do inimigo interno só se aplicava ao PT, as declarações grampeadas não eram fortes o suficiente para justificar tais arroubos, o STF impediu e a PGR veio ao chão como um balão furado.
Imediatamente recuou. Não se ouviu falar mais em ofensivas contra o PMDB, manteve a blindagem a Aécio Neves. As únicas duas missões do PGR e do MPF, assim como dos juízes de 1ainstância, são continuar atacando os bichos de sempre – PT e Lula -  e, no andar de cima, Eduardo Cunha, e apenas ele, já que se tornou pato manco.
Cena 5 – os desdobramentos
Nesses momentos de selvageria, o país não dispõe de forças contra cíclicas. O conceito de democracia e estado de direito não é suficientemente forte nem entre os seus operadores.
Ante a onda formada, o Supremo apequenou-se. No MPF, qualquer ato contra a onda recebe críticas da própria corporação. Qualquer medida contra Lula ou Dilma é aplaudida. E o PGR não conduz, pelo contrário, é conduzido por esse sentimento porque vive-se a Procuradoria de coalizão, desde que o PT inventou a história de indicar automaticamente o Procurador mais votado – que obviamente vai ser descontinuado pelos novos donos do poder.
Criou-se um movimento tácito irresistível. Numa ponta, o desmonte total do precário Estado de bem-estar que o país ousou levantar nos últimos anos, somado à venda indiscriminada de estatais na bacia das almas. Na outra, a condescendência com o grupo de Temer, desde que entregue o combinado. Alimentando essa fuzarca, a intolerância, a radicalização do Judiciário, o delenda Lula. E, a cada momento, mais tentativas de avançar sobre o estado de direito.
E como impedir essa avalanche? O que aconteceria se o PGR ganhasse coragem cívica e tentasse enquadrar Temer e sua turma? Pagaria o preço de uma segunda crise institucional sem dispor da unanimidade em que se calçou para derrubar a presidente?
Evidente que não. A caminhada rumo ao arbítrio acontecerá grotescamente, mas passo a passo. Cada novo ato de arbítrio será minimizado, cada novo cerco aos recalcitrantes ignorado. Até que o país passe da democracia mitigada ao autoritarismo.
E não haverá forças contra cíclicas. Hoje em dia, em lugar de Raimundo Faoro, Luís Roberto Barroso; em lugar de Waldir Pires, Rodrigo Janot; em lugar de Pedro Aleixo, Michel Temer; em lugar de Paulo Brossard, Cristovam Buarque.
Enfim, o país é a resultante do nível de suas elites.