terça-feira, 3 de junho de 2014

IMPORTANTE MATÉRIA DO GATO SOBRE BLACK BLOC, PCC E VIOLÊNCIA URBANA

GRANDE MÍDIA BRASILEIRA CRIA MEDO PARA JUSTIFICAR POLÍCIA MAIS VIOLENTA NAS MANIFESTAÇÕES



Carlos Eduardo Magalhães

2 de jun (Há 1 dia)

O jornal paulistano "O Estado de S.Paulo" de domingo, dia 1 de junho, na manchete principal, anuncia que "Black blocs prometem caos na Copa e contam com PCC", numa clara alusão de que haveria uma ação conjunta entre eles e o grupo criminoso. Lendo a matéria do jornalista Lourival Sant'Anna, no caderno Metrópole, página A 20, observa-se que não é bem assim, que essa ligação que a manchete informa existir "não se trata de uma parceria, nas de uma soma de esforços." Um dos entrevistados, foram seis, relata que "o crime organizado, o PCC, vai causar o caos na Copa... Não temos aliança e nem somos contra o PCC. Só que eles têm poder de fogo muito maior do que o MPL (Movimento Passe Livre, que iniciou as manifestações, há um ano, com ajuda dos black blocs). Pararam São Paulo." Um detalhe... os Black blocs não ajudaram o MPL nas manifestações de junho de 2013, apenas surgiram com maior evidência, só isso. Não houve nenhuma ligação entre os movimentos.

Mais a frente, lê-se que a maioria dos entrevistados são da periferia, moram lado-a-lado de membros do PCC; todos sofreram maus tratos, abuso, humilhação da PM; que há um respeito mutuo entre eles exatamente por enfrentarem a polícia, a repressão; e pela igualdade na condição social etc. e a partir dai, a matéria não toca mais no PCC. Lê-se, também, que "os black blocs não são um grupo estruturado, mas uma rede, que vai se formando espontaneamente, no contato nas ruas queimaram carros de emissoras de TV e da polícia, depredaram bancos (em 40 minutos) e a sede da prefeitura."

A socióloga espanhola Esther Solano, entrevistada na mesma matéria, "professora da Universidade Federal de São Paulo e pesquisadora dos black blocs, vê uma distorção nessa atenção dada às depredações. 'Num país onde mais de 50mil pessoas são mortas por ano, como é possível essa histeria com 40 garotos?'. "Um país que naturaliza tanto a sua violência não tolera ver violência na Avenida Paulista."... "Choca mais 14 bancos quebrados do que a polícia matar 6 crianças". Nas outras entrevistas vê-se uma séria de respostas ideológicas contra o capitalismo, contra a falta de estrutura social, de saúde pública, moradia, transporte etc. justificando o confronto dos black blocs contra a polícia nas manifestações... uma boa matéria, com informações importantes, mas sem muito a ver com a manchete estrondosa, manipuladora e cheia de medo do Estadão.

Na segunda-feira, dia 2 de junho, no mesmo jornal, também no caderno Metrópole, página A14, lê-se a matéria "Elo entre black blocs e PCC é 'inadmissível', diz ministro" (José Eduardo Cardozo). Repercutindo a matéria de domingo, o ministro da justiça desabafa dizendo ser "inadmissível a união pelo crime"... "Não toleraremos abuso de qualquer natureza, e as pessoas que praticarem ilícitos responderão nos termos da lei". Cardozo afirma existir uma "estreita colaboração entre os serviços de inteligência dos governos federal e estadual para acompanhar diversas situações"... "O que temos de fazer sempre é evitar o abuso, o abuso de qualquer natureza. Por isso temos dialogado muito com as policias dos Estados e isso me leva a crer que teremos uma intervenção pronta e eficiente das autoridades policiais". Na mesma página, abaixo, lê-se que o "Exército vai policiar ruas de SP na Copa" e que "Alckmin aceitou oferta de Dilma e ao menos 4 mil militares reforçarão a segurança do Mundial; eles seguirão para as cidades que vão abrigar seleções" e que "homens do Exército ficarão nas ruas e em locais que demandarem reforço na segurança".

Vamos por partes... A manchete do Estadão de domingo, além de não corresponder inteiramente ao corpo da matéria, usa do medo contra o PCC, e tudo que ele representa no mundo do crime organizado, como argumento principal para criminalizar na mesma proporção o movimento Black Bloc. Lendo o texto vê-se que as diferenças são gritantes, não há nada que os aproxime salvo a origem social, a raiva contra a polícia e seus métodos violentos de abordar pessoas pretas, pobres e das periferias nas ruas, a capacidade e a coragem de enfrentar policiais e acaba por ai. Mesmo que alguém que se diz black bloc faça alguma referência elogiosa à membros do PCC, isso não significa que haja ligação direta entre eles e que, a partir dai, farão ações conjuntas de promoção do caos durante a Copa. O que parece estar implícito na manchete é a promoção do medo para justificar quaisquer ações repressivas nos manifestantes, seja qual for o motivo para se ir as ruas, por parte da polícia, inclusive os costumeiros excessos brutais e covardes que a PM tem feito.

Soa estranho os comentários das autoridades, especialmente do ministro da justiça Cardozo, informando existir uma sinergia e um trabalho conjunto de inteligência entre as polícias federal e estadual de São Paulo e de outros estados, para intervir nas manifestações que julgarem ser violentas e que venha a atentar contra a ordem e o Estado de Direito. Perfeito, mas por que não usar esta mesma aparelhagem de inteligência e repressão armada para acabar com os grupos de extermínio que atuam em vários Estados do país (São Paulo, Goiás, Bahia, Rio de Janeiro etc.), grupos estes com participação de policiais ao lado de bandidos?

Um exemplo desta realidade que mata de quatro a seis jovens por dia nas periferias, é a Brasilândia, na zona oeste da capital paulista. Lá, há um verdadeiro clima de terror entre os moradores visto que rotineiramente jovens são baleados por estes grupos, sabidamente compostos por policiais militares que atuam na região, e nada acontece. Há alguns anos, um coronel da PM que fora transferido para lá com o objetivo de investigar o que acontecia, foi assassinado por esta mesma gente que aterroriza a população local. Cadê a inteligência da polícia nestes casos? Por que não consegue descobrir quem mata, coisa que todos no local sabem há tempos, e assim acabar com este pesadelo? Para que serve, afinal, o serviço de inteligência das polícias que consegue monitorar os black blocs, como informou na matéria o ministro Cardozo, mas que não faz nada para acabar com os grupos de extermínio que atuam em quase toda periferia da cidade? Esse esforço policial é só por causa da Copa e dos mascarados?

Essa coisa de colocar exército nas ruas para auxiliar no policiamento é complicado. Forças armadas não existem para policiar. Elas existem para guerrear, matar o inimigo (preferencialmente o externo), ocupar regiões e áreas. Recentemente, na favela da Maré, no Rio de Janeiro, um pelotão de soldados do exército que estavam no local "policiando", foi alvo de fortes manifestações da população local quando prenderam um jovem de forma agressiva e violenta. As pessoas da comunidade foram em direção dos soldados protestando contra a prisão do rapaz. Os militares tiveram de atirar para o alto. Mesmo assim, a população continuou protestando e os soldados, sempre atirando para o alto e ameaçando as pessoas, pegaram o rapaz, o colocaram num veículo do exército e fugiram do local. Uma cena ridícula e lamentável para soldados do exército brasileiro que dentro do próprio país tiveram que fugir para não serem atacados pela população da comunidade, todos desarmados. Tudo isso foi gravado e postado nas redes sociais. Mesmo assim, as autoridades estaduais e federais pretende usar soldados para policias as ruas. Mostra, mais uma vez, a falência total da estrutura de segurança pública no Brasil.

Enquanto isso, mais de 50 mil pessoas são mortas anualmente no Brasil, nas periferias das cidades, vítimas de todo tipo de violência, desde a policial, grupos de extermínios, bandidos, etc. É o mesmo número de soldados americanos mortos na guerra do Vietnã, por volta de 56 mil, numa guerra que durou mais de seis anos. Se existe capacidade de inteligência das policias em monitorar manifestantes mascarados, por que não existe para identificar, prender e processar bandidos e/ou policiais que matam impunemente cidadãos, especialmente pretos, pobres e das periferias? Inquéritos policiais contra soldados da PM ou agentes da polícia civil quase sempre não resultam em nada. Sob as mais variadas desculpas, os policiais acabam inocentados e a impunidade continua. Voltam ás ruas para cometerem os mesmos crime, na maioria das vezes associados aos bandidos, e tudo bem. Não se trata de defender Black blocs, mascarados, bandidos, nada disso. O que se exige das autoridades é um trabalho sério, eficiente, não só pontual como no caso da Copa, mas rotineiro, que acabe com a violência policial, com os grupos de extermínio, com as organizações criminosas, que respeite os direitos humanos, que seja transparente... será exigir muito?

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