segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

COMENTÁRIOS DE INÍCIO DE ANO

Em tempos de festas, o afetivo vem à tona. Necessário encarar também as coisas ruins que vêm ocorrendo em torno de nós.

Depois do fim do ciclo de ditadura civil-militar aberta, o clima foi de desafogo. Podia-se falar e escrever o que se quisesse, e formavam-se novos partidos, para além da ARENA e do MDB – o partido oficial e o parido da oposição consentida. De todos os partidos formados, o mais interessante e promissor foi o Partido dos Trabalhadores.

O PT reuniu uma grande diversidade de pessoas  que de uma forma ou outra se opuseram de forma mais decidida à ditadura. Incluía sindicalistas “autênticos” (para se diferenciar dos pelegos da ditadura, que se aliaram aos patrões e colaboraram com os órgãos de repressão, tortura e extermínio dos opositores), comunistas de vários matizes, os setores da igreja católica ligados ao movimento da teologia da libertação, e muitos intelectuais avulsos.

Continuo a apoiar o PT, mesmo depois da divulgação da “carta aos brasileiros” de Lula em 2001, e a minha constatação, em 2002, sobre os excessos de conciliação com os poderes que travam um desenvolvimento verdadeiramente emancipatório para o país. Por duas razões básicas, a política externa que punha o país em primeiro lugar em vez de subordinar o Brasil automaticamente aos desígnios do Grande Irmão do Norte, e a política de distribuição de renda, baseada nos aumentos do salário mínimo e na universalização do programa Bolsa Família.

Bem antes disso, antes da eleição de Lula em 2001, em uma eleição anterior, começaram incidentes com fascistas de classe média. Meu filho adolescente desfraldava do carro dirigido por minha mulher uma bandeira do PT, que foi arrancada com violência pelo pessoal de outro carro.

Em uma ocasião, passava eu com meu carro, quando um indivíduo em outro veículo começou a vociferar e buzinar, sem razão aparente. Aparentemente, ele se revoltou por um adesivo do PT no meu pára-brisa posterior.

Na década de 1990 entrei para um grupo de discussão r e-mails de aposentados da CESP. Fiquei contrariado com a intromissão de e-mails raivosos de direita, típicos de propaganda do PSDB. Ao expressar minha discordância com o que considerei um desvio da finalidade do grupo, tive uma reação malcriada do autor, mais o apoio a ele por uma componente do grupo, e da própria moderadora. Saí do grupo.

Percebi, assim como outros militantes ou simpatizantes do PT e de outros partidos de esquerda, que não deveria deixar adesivos políticos no automóvel. Encontram-se adesivos agressivos dos partidos de direita e de antipetistas e reacionários em geral, mas a sensação é que contra nós atos de vandalismo são quase uma certeza.

A partir de 2013 as “manifestações” de extração fascista deram um salto. Coros de obscenidades e palavrões contra a presidente da república em estádios, passeatas pedindo a intervenção militar nos pais, panelaços sempre que a presidenta fazia um pronunciamento na televisão...

Essas “manifestações” só começaram a regredir quando a esquerda começou a mobilizar-se, ao mesmo tempo em que passou a exigir políticas econômicas menos puramente neoliberais por parte do governo.  Mas o ambiente permanece doente, assim como a democracia. Um pressuposto da prática democrática, de respeito a pessoas e regras está em permanente estado de violação.

Essa ofensiva, que está longe de se limitar ao Brasil, da direita fascista se dá em conjugação com o aparelhamento da mídia comercial (e estatal, no caso do estado de São Paulo, através dos programas jornalísticos da rádio e televisão Cultura), de grande parte do judiciário, da polícia federal e várias polícias estaduais, em torno do projeto de esmagar o PT e a esquerda em geral.

O projeto de ter um Brasil que inclua toda a diversidade de suas gentes dentro de padrões mínimos de vida decente, e superando os intoleráveis extremos atuais de desigualdade, é fora da menor sombra de dúvida o ponto básico de dissenso para a direita raivosa. Eles devem ser combatidos. Seu poder deve ser neutralizado, ou diminuído ao máximo. Suas tribos devem ser enfrentadas o tempo todo, com a maior força possível.  Com eles não convivemos, não negociamos a não ser tréguas provisórias ou termos de sua rendição ao embate civilizado e democrático.

A esquerda deve se bater hoje e sempre pela emancipação de todos, pela atribuição de poder a todos, menos aos que se opõem a essa transformação igualitária, cujo poder deve ser diminuído na medida do possível sem violência, mas com violência se tiver que ser. Pela liberdade de expressão para os que ainda não a têm. Pelo desaparelhamento das instituições e aparelhos do estado, hoje ocupados pelo capital e por seus representantes políticos.

Estaremos em estado de exceção enquanto a mídia corporativa monopolizar as notícias e interpretações dos fatos; enquanto grande parte do judiciário e das polícias continuarem a agir como instrumentos do poder dos ricos contra os pobres, em favor dos partidos de direita e contra os partidos de esquerda (hoje o PT, mas alguém tem dúvidas sobre o como seria com qualquer outro partido ou agrupamento que tivesse força para agir fora da lógica neoliberal e estadunidense?).

Estaremos em estado de exceção enquanto essa classe média burra, reacionária, mal educada, continuar a desafiar os bons modos e a tratar de violar as regras de comportamento civilizado. Até que superemos esses tempos de predomínio das xingações sobre as discussões, de domínio das versões sobre os fatos, de brutalidade sobre o debate, continuaremos em maus lençóis, e o país não poderá assumir o seu lugar entre as nações livres. 

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