terça-feira, 3 de março de 2015

DOIS IMPORTANTES TEXTOS SOBRE A CONJUNTURA POLÍTICA ATUAL

De J. Carlos de Assis, ambos no jornal GGN. O propósito da direita é o golpe, veja-se a situação da Argentina e da Venezuela, e é hora de mobilização para defender o Brasil e a democracia de seus inimigos.

O mapa da conspiração no Brasil segundo o padrão da CIA, por J. Carlos de Assis

Temos em curso no Brasil uma conspiração destinada a desestabilizar o Governo Dilma sob o pretexto da luta contra a corrupção. É da mesma natureza das iniciativas para promover mudanças de regime na chamada Primavera Árabe, com a diferença de que, nesses casos, os regimes eram ditaduras estabilizadas , enquanto no nosso caso somos uma democracia vulnerável. Como não é possível estimular um golpe em favor de democracia que já existe, a desculpa é o combate à corrupção que se pretende vincular aos presidentes Lula e Dilma.
Pessoas de boa fé pensam que tal conclusão é precipitada. Eu próprio costumo rejeitar teorias conspiratórias, porém só até o ponto em que as evidências começam a falar mais alto. Vou tentar mostrar a evidência de uma conspiração em curso no Brasil usando como principal referência a principal revista de política externa dos Estados Unidos, a “Foreign Affairs”, insuspeita de antiamericanismo. Tomo como referência ensaios da edição de setembro/outubro sobre a crise na Ucrânia e sobre o golpe contra Allende no Chile há 40 anos.
Relativamente à Ucrânia, a revista diz abertamente que a crise é culpa sobretudo do ocidente, ou seja, dos Estados Unidos. Resulta da ambição da OTAN, sob liderança americana, de empurrar suas fronteiras para o Leste incorporando sucessivamente quase todos os estados da órbita da antiga União Soviética. Assim, em 1999, foram incorporadas a República Checa, a Hungria e a Polônia. Sempre sob protestos russos, em 2004 foram anexadas Bulgária, Estônia, Latvia, Lituânia, Romênia, Eslováquia e Eslovênia. Em 2009, foi a vez de Albânia e Croácia.
Essas incorporações violaram compromissos formais estabelecidos com Gorbachev no processo de reunificação da Alemanha, para a qual foi essencial a concordância russa. A Rússia não reagiu além de protestos formais, parte porque estava ela própria internamente fragmentada, parte porque todos esses países incorporados à OTAN não fazem fronteira direta com ela, exceto os pequenos países bálticos. Em 2008, contudo, a OTAN manifestou a intenção de incorporar também as fronteiriças Geórgia e a Ucrânia, o que significava acabar de cercar a Rússia.
Nenhum líder russo aceitaria ou aceitará o cumprimento dessa ameaça no seu próprio quintal, muito menos um estrategista da estatura de Putin. Quando o presidente da Geórgia, simpatizante da entrada na OTAN, resolveu reincorporar as províncias rebeldes de Abkhazia e Ossétia do Sul, Putin reagiu imediatamente e as invadiu. Deixou claro, nesse movimento, que não aceitará a incorporação da Geórgia, um país limítrofe da Rússia, à OTAN, a não ser fragmentado. Assim como deixou claro a Bush, segundo um jornal russo, que “se a Ucrânia fosse admitida na OTAN ela cessaria de existir.”
“Foreign Affairs” faz um retrato realista do que aconteceu daí em diante na Ucrânia. No processo de criar a atmosfera “democrática” favorável à adesão à União Europeia, atalho para a entrada na OTAN, os Estados Unidos despejaram desde 1991 mais de US$ 5 milhões em instituições de formação de opinião no país, para - segundo Victoria Nulan, a secretária de Estado assistente para a Europa e a Eurásia -, criar para a Ucrânia “o futuro que ela merece”. Uma instituição especial, a National Endowment for Democracy, promoveu mais de 60 projetos para minar a estabilidade do Governo legítimo de Yanukovych, pró-russo.
O presidente dessa instituição, Carl Gershman, não deixou muita dúvida quanto ao objetivo último desse movimento. Numa entrevista ao New York Times, declarou que “a escolha da Ucrânia de integrar a Europa vai acelerar a morte da ideologia do imperialismo russo que Putin representa”. De forma ainda mais explícita, acrescentou que “os russos também enfrentam uma escolha, e Putin pode encontrar-se no lado perdedor final não no exterior do país mas dentro da própria Rússia”. Putin reagiu a esse tipo de provocação invadindo a Crimeia e promovendo o referendo para sua anexação à Rússia.
Estou transcrevendo trechos dessa longa reportagem porque sei que os brasileiros não merecem de nossa imprensa, escrita ou televisiva, um noticiário imparcial sobre o que está acontecendo na Ucrânia. Nossa grande imprensa é em relação aos Estados Unidos mais governista, em qualquer circunstância, do que a própria imprensa da elite americana. Mas o que quero acentuar é que o governo americano tem uma estratégia clara de sustentação de sua dominação no mundo e está disposto a pagar qualquer preço, sobretudo se o preço foram instituições ou vidas de outros povos, para firmar seus objetivos estratégicos.
É nesse ponto que convém examinar a situação brasileira atual. Os Estados Unidos restabeleceram a Guerra Fria e elegeram a Rússia como inimigo estratégico, já que a Rússia, ainda uma potência nuclear de primeira linha, é o único poder estratégico, junto com a China na economia, capaz de rivalizar com eles. Ora, nós estamos cometendo a audácia de nos aproximarmos da Rússia e da China no âmbito dos BRICS, criando uma alternativa de desenvolvimento no mundo, tanto do ponto de vista geoeconômico quanto geopolítico. Para quem quer levar o braço da OTAN até as planícies ucranianas, esse é um grande desafio, considerando o fato de que Brasil e África do Sul são considerados quintais relativamente bem comportados do poderio americano.
Se para eliminar o risco de uma maior aproximação com a Rússia for necessário desestabilizar o Governo brasileiro, apelando para uma inventada condescendência com a corrupção, como aconteceu na Ucrânia, os Estados Unidos não se farão de rogados. Eles tem aliados poderosos aqui dentro como leais quinta-colunas. Por algum motivo gravaram os telefones da Dilma. Já no Chile, de acordo com documentos desclassificados depois de 40 anos da deposição de Allende, verifica-se, segundo a mesma “Foreign Affairs”, que o golpe e o assassínio de Allende foram orquestrados por Washington, sob coordenação de Henry Kissinger. Começou com o assassinato do general anti-golpista Schneider, pago pela CIA, e teve durante todo o tempo da conspiração a instigação permanente do jornal “El Mercurio”, que para isso recebeu da CIA US$ 11 milhões em dinheiro de hoje. A “Veja”, como todos sabem, passa por dificuldades financeiras. Não seria o caso de se examinar quem está sustentando suas infâmias destinadas a desestabilizar o Governo brasileiro?

A receita dos movimentos sociais para contornar a crise da Petrobras, por J. Carlos de Assis

A receita dos movimentos sociais para contornar a crise da Petrobrás       
J. Carlos de Assis*
Movimentos sociais movidos pelo propósito de defender a Petrobrás de abutres internos e externos estão esquentando os motores para manifestar sua presença nas ruas, o que constitui a única alternativa eficaz para liquidar o golpe em marcha contra o Governo liderado pela mídia golpista a serviço do imperialismo. No Rio, tivemos no dia 24 um evento promovido na ABI por petroleiros com participação de Lula. No dia seguinte, 25, tivemos outro importante evento no Clube de Engenharia, este realizado pelos movimentos sociais.
No dia 4, os metalúrgicos fluminenses do setor naval ameaçados em seus empregos pelos desmandos da Lava Jato inaugurarão nas ruas centrais do Rio a fase de mobilização de massa da Aliança pelo Brasil, preparando manifestação convocada por centrais sindicais e outras entidades para o dia 13, em várias capitais. Por razões óbvias, o Rio será o centro dessa mobilização já que é no Rio que estão a sede da Petrobras e os braços operacionais das grandes empreiteiras ameaçadas de fechamento pela estupidez dos promotores de apostila.
Para o dia 15 a direita prepara sua própria mobilização. Veremos quanta gente ela reúne. Qualquer que seja o placar já sabemos com total segurança que ela não tem um projeto para o Brasil. Seu objetivo é a arruaça. O caos. A desordem. Os bandoleiros pagos que arrastaram ingênuos para bloquear  estradas. O país dos black blocs. Confrontado com isso, nós temos um propósito bem definido: tomar medidas concretas, imediatas, para recolocar o Brasil no rumo do desenvolvimento e, até mesmo, no rumo de uma grande conciliação.
Começamos por fórmulas concretas para a salvação da Petrobrás e da Engenharia Nacional. Deixarei esse último ponto para depois, mas adianto que temos uma proposta de distinção entre empresário e empresa. Isso supõe condenação, depois de amplo direito de defesa, de donos envolvidos com corrupção, porém com manutenção das empresas e dos empregos. Empresa é instrumento, não um fim em si mesmo. Uma faca serve para descascar abacaxi ou para matar uma pessoa. Não é criminosa. Criminoso é quem manipula a faca.
Vivemos um momento de emergência para assegurar à Petrobras condições para manter seu nível atual de atividades e para garantir seu portfólio de investimentos.  Como qualquer grande empresa, ela é um centro de articulação de atividades econômicas e sociais. Não pode parar. Não pode ser bloqueada. Não pode ser impedida de cumprir seu programa de investimentos. Qualquer dessas coisas que aconteça quebra uma cadeia de pagamentos e recebimentos com o mesmo efeito desastroso de uma quebra de um grande banco.
Nossa proposta para a preservação a curto prazo da Petrobras em sua integridade, apresentada depois de discussões com alguns dirigentes de Centrais Sindicais no Clube de Engenharia no evento do dia 25, é a seguinte:
a.       Garantia do Tesouro, através do BNDES, de assegurar os recursos necessários para as necessidades de caixa de curto prazo e para sustentar os programas de investimento em curso da Petrobras (incluindo seu entorno econômico que representa mais de 13% da economia brasileira) tendo em vista o objetivo de evitar perdas na paralisação de obras e investimentos, preservando-se a estrutura do emprego na cadeia do petróleo; onde contratos já foram adiados deve-se reverter o processo. Isso não é nenhuma novidade: foi o que o Governo americano fez com a indústria automobilística do país em 2009; como fez, de forma ainda mais acintosa, com o Citigroup e o Bank America, estatizando temporariamente quase 50% de ações de controle para que não quebrassem;
b.      Comprometimento explícito do Governo com o modelo de operadora única no regime de partilha do Pré-Sal e com a política de conteúdo nacional de equipamentos, sempre tendo em vista a geração e preservação do emprego no Brasil;
c.       Comprometimento do Governo com a defesa da Engenharia Nacional, evitando a ruptura da cadeia de pagamentos e recebimentos por simples suspeitas de irregularidades na operação Lava Jato, colocando como condição fundamental o pagamento das folhas salariais na cadeia do petróleo e do setor público;
d.      Comprometimento do Governo com as políticas de mobilização dos recursos do Pré-sal para educação e saúde públicas.
Essas medidas, que não violam qualquer dispositivo legal – na verdade, reforçam os já existentes -, resolvem os problemas de caixa da Petrobras e preservam sua capacidade de investimento. Há quem tenha a opinião de que, tendo em vista os preços atuais do petróleo, seria melhor mesmo adiar o programa de investimentos da empresa. É um equívoco. O preço do petróleo, estruturalmente, tende a subir. E precisamos da receita futura do petróleo que estiver acima de nossas necessidades para podermos crescer.
*J. Carlos de Assis - Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB.


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