Jornalista, tendo ocupado cargos de
destaque nos principais órgãos de imprensa brasileiros
13 de Junho de 2016
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A direita trabalha agora no sentido
de alcançar a aprovação e a conclusão definitiva do processo de impeachment da
presidenta da República. A frente formada com esse intuito é ampla, reúne a
mídia parcial e conservadora, a parte mais corrupta e fisiológica do Congresso,
setores do Ministério Público, do STF, da Polícia Federal e do Judiciário
contra o PT e a esquerda nacionalista. Apesar das dificuldades vividas pelo
governo interino, o processo não será fácil de ser revertido.
Não tendo sabido enfrentar, de forma
organizada e decidida – a começar pela internet –, os ataques que vinha
sofrendo desde 2013; não tendo estabelecido um discurso abrangente que
defendesse minimamente suas conquistas, que ocorreram, sim, em importantes
momentos dos últimos 13 anos; tendo cometido erros grosseiros do ponto de vista
estratégico, político e eleitoral, o que resta ao PT e aos grupos que o apoiam
é parar de se equivocar, de serem pautados pelas circunstâncias e pela imprensa
adversária, e entender o que realmente ocorre com o país neste momento.
Manter a realização de protestos
isolados e constantes contra o governo Temer – acusando-o de golpista – pode
ser um exercício retórico, e uma forma de fugir do imobilismo, mas essa
abordagem não deve ser a única, nem a principal, nem ser levada às últimas
consequências, porque pode conduzir a graves equívocos dos pontos de vista
tático e histórico. Não se discute a questão da legitimidade do voto. Mas é
rasteira simplificação – que colabora com os conspiradores ocultos, muitíssimo
mais perigosos – de dizer que o golpe partiu do PMDB, como se ele tivesse
nascido quando a legenda abandonou o governo Dilma.
Dizer que quem compõe o governo
interino é corrupto é outra simplificação que também não resolve, nem agora,
nem a médio prazo, o problema. Por um lado, porque reproduz em parte o discurso
adversário, minimizando o fato de que muitos dos que estão sendo investigados
pela Operação Lava Jato à direita estão sendo processados com as mesmas
justificativas e argumentos espúrios usados para justificar acusações e as
investigações lançadas contra membros do próprio PT. Por outro lado, porque
quem compõe o governo são, com exceção do PSDB e do DEM, basicamente as mesmas
forças que estiveram durante tantos anos nos governos do PT, não por afinidade
política, mas porque é assim que se estabelece o equilíbrio de governabilidade
possível em um regime típico de presidencialismo de coalizão.
Seguindo esse raciocínio, por mais
que seja difícil para alguns admitir isso, a mesma miríade de pequenos partidos
e legendas de aluguel que apoia hoje Michel Temer, faz parte de seu governo e
está sendo atacada pelo PT pode vir a ter de ser, amanhã, cooptada de volta
por Dilma para compor seu ministério, caso ela retorne ao poder. O próprio
presidente do PT, Rui Falcão, já admitiu que não fará nada para evitar que o
partido se alie ao PMDB nas eleições municipais deste ano. Portanto, devagar
com o andor.
É preciso cautela, para não parecer
hipócrita, na mesma linha de leviandade usada pela direita contra a esquerda –
e pela extrema-direita contra a política de modo geral, tendo a democracia e a
liberdade como alvos finais dessa linha de atuação. Na tentativa de atingir
seus adversários, a esquerda não pode cair no mesmo erro –aproveitado com
deleite pelos fascistas –, na tentação e na esparrela da criminalização da
política. Mesmo quando atacada hipócrita e injustamente. Pois corre o risco de
legitimar a Operação Lava Jato, o discurso da mídia – muito mais importantes e
deletérios do que o PMDB, no processo de golpe que estamos vivendo – e de se
equiparar a quem o defende, diante da história e da população.
Vamos ser francos – mesmo que as
conversas tenham sido propositadamente gravadas e conduzidas para ser usadas
como habeas corpus por um dos interlocutores –, os diálogos entre o ex-diretor
da Transpetro Sérgio Machado e autoridades como Romero Jucá, Renan Calheiros e
José Sarney não podem ser rotulados com o mesmo grau de subjetividade dirigida
com que se julgaram e disseminaram outros diálogos gravados com a mesma
intenção, e divulgados fora de contexto, como os de Delcídio do Amaral.
Ao dizer que a Lava Jato representou
uma sangria, por exemplo, o senador Romero Jucá diz não mais que o óbvio. A
sangria em empregos, em interrupção de negócios, em sucateamento de obras e
projetos, em desvalorização de ações e ativos, em contratos interrompidos, em
prejuízos institucionais e contábeis para as empresas acusadas, com terríveis
resultados para o país, em termos estratégicos, de defesa, energia e
infraestrutura, e para milhares de empregados e acionistas, é evidente e
redundante.
Da mesma forma que dizer que era
preciso costurar um diálogo nacional para analisar o assunto, com a
participação do próprio STF, a quem cabe corrigir eventuais desvios e ações
polêmicas – principalmente no âmbito jurídico –, colidentes com o texto
constitucional, seria uma afirmação consequente, lógica, e, no correr da
conversa, óbvia e ululante.
Ou será que a Lava Jato não poderia
ter investigado e condenado os corruptos efetivamente identificados, com
dinheiro em contas no exterior, como Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró e
Renato Duque, sem precisar destruir algumas das maiores empresas de engenharia
do país? Ou sem atrasar e prejudicar tantos projetos e programas de interesse
nacional, colocando no mesmo balaio de gatos gente que se locupletou
pessoalmente, gastando acintosamente o dinheiro roubado à nação, e funcionários
de partidos que obtiveram doações eleitorais registradas, à época, como
rigorosamente normais e legais? Soltando os primeiros e encarcerando os
segundos?
A Lava Jato pode ter tido,
indiretamente, alguma influência positiva, sobretudo na identificação do fato
de que não existem corrompidos no setor público se não houver os corruptores no
âmbito privado. Ou seja, a corrupção, antes de doença política, é do mundo dos
negócios que tenta se apropriar dela.
Mas o que está ocorrendo é que
direita, centro e esquerda estão cometendo o erro primário de não entender que
o que se está enfrentando é um grupo de forças que se opõem à própria atividade
política, por princípio. E que ao se digladiarem fora do campo das ideias não
estão fazendo mais do que favorecer os inimigos da liberdade, saudosos do
autoritarismo, que se aproveitam das falhas normais de um regime – que, como
diria Churchill, não é perfeito, mas é o melhor que se conhece –, para jogar a
população contra a democracia e promover e preparar, diligente e
coordenadamente, a chegada do fascismo aos cargos mais altos da República.
O processo de impeachment é um golpe
jurídico-midiático, mas ele representa apenas um passo, mais uma etapa, para a
deflagração de um golpe maior contra a Nação, que levará à derrocada da
democracia no Brasil, à aprovação de leis que lembram os nazistas, como a
exigência de diploma superior para ministros e presidente, fim do voto
obrigatório, volta do escrutínio manual, cassação de registros de partidos
políticos, repressão ao trabalho de educadores na sala de aula, criminalização
dos movimentos populares e até do comunismo – conforme propostas recentemente
encaminhadas à apreciação do Congresso Nacional.
Some-se a isso a eventual chegada de um candidato
de extrema-direita ao poder (há pelo menos dois sendo promovidos pela
imprensa), ou a consolidação de uma massa de votos que seja suficiente para
transformá-la na terceira força política do país, capaz de decidir, com o seu
peso, o resultado do segundo turno das eleições de 2018. E dá para ter uma
ideia concreta do que espera a Nação – se não houver urgente correção de rumo –
depois da curva.
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