EXCLUSIVO: COMO MIRIAN DUTRA FALA DA BRASIF, DO DNA, DA
GLOBO ETC. POR JOAQUIM DE CARVALHO
por Joaquim de
Carvalho 1 de abril de 2016
Quinta-feira, 31 de março, o jornalista Mario Sergio Conti
apresenta Fernando Henrique Cardoso para sua audiência na Globonews:
— O nosso entrevistado de hoje dispensa apresentação. É um
dos intelectuais e políticos mais respeitados do país e no exterior. É uma
referência para os brasileiros, sobretudo nestes momentos de crise. É um elder
statesman (velho estadista). Vamos ver quem é.
Rolam na tela imagens do ex-presidente e os dois voltam para
tratar dos temas da noite: Lava Jato e impeachment.
Nada de Mirian Dutra, nada da Brasif.
Domingo, 20 de março. Mirian Dutra está em Cerdaña, perto da
fronteira da Espanha com a França, e me dá entrevista. No caminho até o hotel,
em meio a montanhas com neve, ela para num posto de combustível e abastece o
carro. “Aqui não tem mordomia, não”, comenta.
Mirian fala sobre Mario Sergio Conti e Fernando Henrique
Cardoso:
— O Fernando Henrique deve um grande favor ao Mario sergio
Conti. A nota que o Mario Sergio publicou na coluna Veja em 1991 é simplesmente
uma mentira.
A nota diz que Mirian Dutra, “conhecida pelas reportagens
que faz para o Jornal Nacional”, havia trocado o clima seco de Brasília por uma
temporada de inverno em Santa Catarina. Em seguida, conta que Mirian espera um
filho e que o pai é um biólogo.
Mirian conta a mesma história para uma amiga, a publicitária
Glória Maria Campamá, com quem está reunida em Barcelona.
As duas não se vêem há bastante tempo, depois que Mirian se
mudou para Madri. Glória, que nasceu na Catalunha e é mãe de um dos melhores
amigos do filho de Mirian, os dois na faixa dos 25 anos de idade, ouve
atentamente. Mirian explica:
— Veja é uma importante revista do Brasil. É como a Época –
diz ela, em referência a uma publicação da Espanha.
Glória não esconde a surpresa, e Mirian diz que quem armou
com o então diretor de redação da maior revista do Brasil a publicação de uma
fraude pode muito bem ter armado um exame de DNA.
Na conversa com a amiga, Mirian Dutra fazia referência a um
episódio de 2011, quando Fernando Henrique Cardoso divulgou à imprensa que se
submetera a dois exames nos Estados Unidos, e o resultado foi negativo para a
paternidade do filho de Mirian.
Mesmo assim, informou à época Fernando Henrique à imprensa,
ele continuaria a atender às necessidades materiais e afetivas do filho da
ex-namorada, inclusive mantendo o reconhecimento de Tomás como filho, que teria
feito na Espanha no ano de 2009.
Mas, no cartório onde Tomás foi registrado, o 1º Ofício de
Brasília, a certidão de nascimento obtida no último dia 24 de fevereiro pelo
jornalista Fernando Molica, da coluna Informe do Dia, registra Tomás Dutra
Schmidt como filho de Mirian Dutra e de pai desconhecido.
Enquanto conversa com Glória, Mirian está com os olhos
marejados, e esses fatos seriam de absoluta privacidade não tivesse Fernando
Henrique Cardoso movimentado uma máquina poderosa para encobrir seu
relacionamento com Mirian Dutra e o filho, durante os anos em que foi
presidente da república, com o apoio de empresas de comunicação e
concessionárias do governo federal.
Mirian, Glória e eu estamos no bar do Hotel Villa Emilia.
Mirian vê que o cãozinho Chico, sua companhia de alguns anos para cá, precisa
dar uma volta e pede licença. Glória me conta que Mirian viveu anos difíceis em
Barcelona. “Ele queria trabalhar, mas a empresa (Globo) pagava e ela não
produzia nada. Isso deprime qualquer um”, comenta.
Glória diz ainda que o mercado de comunicação no Brasil é
estranho.
Como funcionária de uma agência de publicidade em Barcelona,
diz que a empresa, multinacional, tem negócios na Argentina, na Colômbia e no
México, mas não consegue entrar no Brasil. “No seu País, a Globo dá as cartas”,
afirma.
Glória diz também que seu filho mais velho, que hoje mora no
Canadá, esteve com Fernando Henrique Cardoso, numa visita que ele fez a Tomás
em Barcelona.
— O Tomás, na época criança, queria muito que os amigos
conhecessem Fernando Henrique, mas ele não queria que vissem o presidente, mas
o pai. E como Tomás estava feliz – diz Glória.
Mirian retorna com Chico e pede ao garçom mais uma cesta de
pão. Ela quer alimentar o cachorrinho com pequenos pedaços de miolo.
— Sabe como eu soube do DNA? Eu estava em São Paulo para
acompanhar minha irmã, que estava com câncer, ao hospital. Fernando Henrique
soube que eu iria para lá e pediu para me encontrar com ele num hotel no
Morumbi.
Segundo ela, Fernando Henrique chegou com dois seguranças,
sentou-se numa mesa, lhe entregou um envelope e disse:
— Tomás não é meu filho.
— Não, então é de quem? Do biólogo?
— Fiz dois exames, e deram negativo – teria dito Fernando
Henrique.
Mirian diz que ficou sem reação.
— O hotel estava cheio de gente e ele estava com dois
seguranças.
A conversa não demorou muito. Ele teria pegado o exame de
volta, se levantou e saiu.
Mirian recorda que, à noite, enquanto jantava num
restaurante do Itaim com a irmã, começou a chorar.
A irmã achou que era por causa da doença dela e procurou
tranquilizá-la:
— Eu vou superar.
Mirian, então, revelou:
— O Fernando Henrique me mostrou um exame de DNA e disse que
Tomás não é filho dele.
Mirian, que diz ter tido sempre um relacionamento tenso com
Margrit Dutra Schimidt, conta que viu a irmã baixar a cabeça e dizer:
— Eu já sabia… Que vergonha…
Como sabia?
Mirian diz que Margrit foi uma das pessoas que, a pedido de
Fernando Henrique Cardoso ou de José Serra (grande amigo dela e de Fernando
Henrique), pediram que Mirian não levasse adiante a gravidez.
— Mas, depois que o Tomás nasceu, ela gostava de ser conhecida
como a cunhadinha do Brasil.
Nesse ponto da conversa, Mirian muda a expressão e diz que a
irmã era sócia do marido (já falecido) na empresa de lobby Polimídia. “Com a
história do filho de Mirian Dutra, as portas se abriam para ela e minha irmã
ganhou muito dinheiro”, diz e sugere que se investigue o patrimônio da irmã:
“Ela era funcionária da UNB (Universidade Federal de Brasília), não tinha nada
e hoje tem conta no Canadá e muitos imóveis.”
Margrit Dutra Shimidt tem hoje um cargo comissionado no
gabinete de José Serra, no Senado, mas quase não é vista por lá.
Com a notícia do DNA, Mirian procurou o filho e quis saber
por que ele fez o exame sem o conhecimento dela:
— O Tomás não tinha ideia do que significava aquilo e falou:
‘Ah, mãe, não é definitivo.’”
Mirian achou que ela, Fernando Henrique e Tomás, deveriam
ter uma conversa, e se encontraram no hotel Palace, de Madri.
— Eu estava no meu território e a conversa foi dura. Acho
que tinha caído a ficha do Tomás. Ele queria saber se eu tinha me relacionado
com outra pessoa e eu respondi: tive, sim, com o porteiro. Claro que não,
Tomás!
Enquanto mãe e filho discutiam, Mirian Dutra diz que
Fernando Henrique chorou.
Mirian conta que também procurou um antigo terapeuta em Brasília,
com quem fez psicanálise durante os seis anos de namoro com Fernando Henrique,
para saber se, na ficha dela, constava alguma referência a um caso com outra
pessoa.
— Eu fiquei tão confusa que achei que eu pudesse mesmo ter
tido outro relacionamento e bloqueado isso por algum motivo. Meu terapeuta
ficou de procurar as anotações no arquivo morto e, depois de alguns dias, me
ligou para dizer que a coisa mais importante que tinha achado era uma
referência à troca de medicamento para dormir. Não tinha nada.
Em agosto de 2014, seu advogado no Brasil, José Diogo
Bastos, notificou duas vezes Fernando Henrique Cardoso para apresentar os
documentos de reconhecimento de Tomás como filho e o resultado dos DNAs.
Fernando Henrique, que assina uma das notificações – a outra
é assinada por uma secretária do Instituto Fernando Henrique Cardoso –, não
respondeu. Em janeiro de 2015, ele concluiu a compra de um apartamento para
Tomás, por 200 mil euros, perto da Universidade de Barcelona, onde o jovem faz
pós-graduação.
Telefonei para Tomás, mas ele não quis falar. Disse que um
dia, quando “tudo isso passar”, poderia dar entrevista. Procurei também
Fernando Henrique Cardoso. A chefe de gabinete do Instituto FHC, Helena Maria
Gasparian, retornou minha ligação e disse que tentaria marcar uma conversa.
Caso a entrevista pessoal não fosse possível, propus enviar perguntas por
escrito, mas não tive resposta.
Mirian diz que hoje estuda processar o ex-namorado, por
danos morais, particularmente porque diz que sempre quis fazer o exame de DNA,
mas ele recusou.
— Na maternidade, quando Tomás nasceu, ele me telefonou e eu
disse que ele deveria fazer o DNA. Ele não quis, esperou meu filho ficar maior
de idade e estar bem longe de mim – quando o exame foi feito, Tomás estudava
nos Estados Unidos, com dinheiro de Fernando Henrique Cardoso.
Segundo Mirian, foi Fernando Henrique quem contou a Tomás
que o resultado do DNA deu negativo. “Ainda que fosse verdade, e não é, ele
deveria conversar comigo primeiro e depois falar com o Tomás”, diz.
A tragédia da família Dutra se mistura a situações em que é
difícil separar o assunto público do privado. Nos anos em que considera seu
exílio na Europa, com salário da Globo e o dinheiro de um contrato fictício da
Brasif, ela teria questionado Fernando Henrique quando a Brasif, empresa
concessionária do governo federal, parou de transferir dinheiro – eram 3 mil
dólares por mês.
— O Fernando Henrique disse: é claro, eu coloquei 100 mil
dólares lá, e esse dinheiro já acabou.
A família não deixou de receber recursos, mas a Brasif,
segundo Mirian, deixou de ser o canal. Ela diz guardar todos os registros de
transferência de dinheiro – da Brasif e de outros meios — e é o que pretende
entregar à Polícia Federal. Seu depoimento foi marcado para 7 de abril, em São
Paulo.
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