O GOLPE DO MEIO BILHÃO COMANDADO PELO SULTÃO CUNHA E SUA
BANCADA
De Mauro Lopes em seu blog Caminho Pra Casa.
O processo de impeachment contra a presidenta Dilma é um
golpe em dois sentidos: político e financeiro. Não tem qualquer traço de
legalidade. Há um trem pagador de mais de R$ 500 milhões de reais (meio bilhão)
que patrocina o golpe contra uma presidente eleita e contra a qual não pesa
sequer uma acusação de corrupção. O trem pagador tem um maquinista, Eduardo
Cunha.
Segundo documentos do Ministério Público da Confederação
Suíça enviados à Procuradoria Geral da República, o esquema suíço liderado por
Cunha com outros participantes movimentou R$ 411 milhões em 29 contas bancárias
entre 2007 e 2014 (o valor não inclui, portanto, o ano de 2015). Isso é apenas
uma fração, aquilo que foi identificado Suíça. Há ainda o dinheiro não
localizado na própria Suíça e mais uma série de paraísos fiscais não mensurados
neste montante (veja reportagem do Correio Braziliense sobre os documentos
suíços clicando aqui).
Entrevistado pelo programa Espaço Público TV Brasil da EBC
em novembro de 2015, o ex-ministro Ciro Gomes estimou que deste volume imenso
de recursos Cunha usou R$ 350 milhões para montar seu próprio bloco
parlamentar: “Eduardo Cunha roubou algo ao redor de meio bilhão de reais e deve
ter distribuído uns 350 (milhões de reais) por uns 150 a 200 picaretas”
–assista aqui e veja a afirmação de Ciro sobre a montagem da
bancada de Cunha, a tropa de choque do impeachment, aos 8min05 da entrevista.
Se as contas de Ciro estiverem corretas (e use-se o número mais modesto, 150),
Cunha repassou algo como R$ 2 milhões para cada um de seus apoiadore$ apenas na
“operação Suiça”.
Mas não é só. Como a planilha da Odebrecht já deixou
patente, Cunha é padrinho de muitas outras doações$. A planilha indica o poder
de Cunja como intermediário. Tomo emprestada a formulação da jornalista Helena
Sthephanowitz no blog da Helena, na Rede Brasil Atual sobre o assunto:
“Eduardo Cunha aparece como beneficiário de uma doação do Grupo Odebrecht de R$
1,1 milhão para seu partido, o PMDB. Se foi ou não devidamente registrada é
outra discussão e deverá ser objeto de novas investigações.
O curioso é ele aparecer como ‘padrinho’ de uma doação
bem maior, de R$ 3 milhões, para o diretório nacional do PSC, atual partido do
deputado Jair Bolsonaro. Cunha aparece também na planilha como
‘padrinho’ de outra doação, de R$ 900 mil, para o PR. Ou seja, só por
essas indicações na planilha, em 2010 Eduardo Cunha operou como captador de R$
5 milhões – isso apenas junto ao Grupo Odebrecht – para três partidos,
justamente os que em Brasília compõem a chamada ‘bancada do Cunha’, ou seja, o
grupo de parlamentares de vários estados que acompanha fielmente a liderança do
atual presidente da Câmara em todas as votações.” – leia a íntegra da
coluna aqui.
É impressionante. Cunha apadrinha R$ 5 milhões apenas na
planilha de uma empreiteira em uma eleição. É a
bancada da mala, estimada por Ciro Gomes em 150 deputados . Fiéis Cunha até o
fim –enquanto ele continuar doando, é claro. É disparadamente a maior bancada
da Câmara, praticamente o dobro do maior bloco parlamentar da Casa, que conta
com 87 deputados (PP, PTB, PSC e PHS).
É a tropa de choque de Cunha, majoritária na Comissão do
Impeachment e capaz de tudo para impedir o prosseguimento do processo contra o
“capo” na Comissão de Ética.
Mas há mais, muito mais dinheiro para comprar o impeachment
de Dilma. Segundo o deputado Paulo Pereira da Silva, “tem muita gente
querendo financiar esse negócio do impeachment”. Ouça aqui.
É só o parlamentar interessado sinalizar que a grana aparece, segundo o
deputado, conhecido como Paulinho da Força, líder do partido Solidariedade e
que conhece um tipo de solidariedade que o fez réu em processo por lavagem de
dinheiro, formação de quadrilha e crimes contra o sistema financeiro e figura
em mais três inquéritos –ele está na comissão do impeachment, por óbvio.
Cunha é algo como um herói, um ícone para Paulinho. Na mesma
gravação em que firmou que está e vai continuar a chover nas hortas dos
deputados golpistas, ele fez questão de ressaltar que ”esse negócio (isso
mesmo, “negócio”) do impeachment tá indo, eu vou falar a verdade, por causa do
Eduardo Cunha. O impeachment só tá acontecendo por causa do Eduardo Cunha.”
Paulinho está certo. Retire-se Cunha e o processo de impeachment terá enorme
dificuldade de seguir adiante, sem o devido combustível.
O cenário da Câmara dos Deputados é desolador e faz do
Brasil o centro de um escândalo ao redor do mundo. O condutor do processo, o
presidente da Câmara, Eduardo Cunha, é réu numa ação no Supremo por recebimento
de propina e distribuiu recursos da ordem de centenas de milhões de reais; 61%
dos deputados da comissão encarregada do processo receberam R$ 9 milhões de
empresas investigadas na operação Lava a Jato (leia aqui); 31 dos 130 integrantes da comissão (titulares e
suplentes) respondem a inquérito ou ação penal no Supremo, acusados de formação
de quadrilha, corrupção e lavagem de dinheiro, entre outros crimes (leia aqui).
O relator da comissão do impeachment, deputado Jovair
Arantes, é funcionário (ops, aliado) de Cunha. Atua no Conselho de Ética como
um coronel do exército de Cunha nas manobras para paralisar o processo contra o
chefe. Assumiu a relatoria do impeachment apenas depois de garantir aos
golpistas que condenará Dilma –leia aqui. Jovair é um aliado de valor: teria cobrado R$ 4
milhões apenas para apoiar a recondução ao cargo do presidente da Agência
Goiana de Meio Ambiente. Quem veiculou a denúncia? É até engraçado, mas foi a
Veja!
Isso mesmo, Veja desceu o cacete no deputado em 2012, quando
considerava que isso prejudicava o governo do PT. Disse a revista na ocasião:
“Num documento de 24 páginas assinado e entregue formalmente ao Ministério
Público em dezembro passado, ele diz que, quando estava de saída da agência
ambiental, ouviu uma proposta nada ortodoxa: Jovair, a quem caberia indicar o
novo presidente do órgão, pediu 4 milhões de reais para apoiar sua recondução.
‘O deputado queria R$ 4 milhões para que o infraescrito fosse indicado para
continuar na titularidade do órgão público’, escreveu”. Está tudo no link aqui, mas como Jovair agora é da famiglia dos Civita, não
se sabe até quando estará no ar.
O crime contra o país acontece em clima de farra no
Congresso –e numa escalada fascista sem precedentes na sociedade de nas ruas.
Farra para Cunha e os seus.
E que farra. A Procuradoria Geral da República (PGR), na
denúncia apresentada ao Supremo contra Cunha em 4 de março de 2016 apresentou a
vida de sultão de Cunha ao país (não, ao país não, porque a Globo e suas
congêneres de menor expressão preferiram silenciar sobre o que você lerá a
seguir pois, afinal, o pedalinho era mais importante). A expressão “vida
de sultão” foi um preciso achado da reportagem de El País sobre a denúncia da
Procuradoria –leia aqui e, se quiser, clique no link logo no início da
reportagem para ter acesso à íntegra da peça da PGR).
Os números são dignos de um sultão mesmo, é só ir à
denúncia, ler e deixar o queixo cair:
Virada de 2012/2013 – Em nove dias, numa viagem a Miami para
a passagem de ano (entre 28 de dezembro e 5 de janeiro) Cunha, mulher e filha
torraram R$ 170 mil. Isso mesmo! Mais de R$ 18 mil por dia (a cada dia ele
gastou mais do que o salário mensal de um parlamentar à época, de R$
17.794,76). Em Miami, a gastança foi antológica. Tudo em nove dias (a seguir
apenas alguns exemplos dos gastos): almoço e jantar em restaurantes em
Miami Beach em 28 de dezembro pela bagatela de R$ 7.500; uma refeição para
celebrar o início de 2013 com a família no restaurante Prime Italian, em 01 de
janeiro, no valor de R$ 6 mil; outras contas de valor similar em diversos
restaurantes; apenas no dia 29 de dezembro, R$ 24.520 em comprinhas na
Sacks e na Salvatore Ferragamo. Mas não foi suficiente. Em e de janeiro, mais
comprinhas, agora na Giorgio Armani e Ermenegildo Zegna, duas das grifes mais
requintadas do planeta, somando outros R$ 20.504. Parece mentira, não é? Mas
tudo registrado nos cartões de crédito do futuro “capo” do impeachment.
2013 estava apenas começando – em fevereiro, depois do
festival Miami, Cunha, que não é de ferro, foi a Nova York. O ritmo não
se reduziu. Entre 9 e 12 daquele mês, a PGR flagrou gastos de R$ 36.732 entre
hotel, restaurantes e as grifes preferidas de Cunha. O atual presidente da
Câmara é rápido no gatilho; dia 12 de fevereiro a gastança começou cedinho em
NYC e continuou à noite em Zurique, na Suíça (ah, a Suíça): entre a noite de 12
e a manhã do dia 15 de fevereiro, a conta ficou em R$ 18.716. Mas não foi
tudo: na noite de 15 de fevereiro, lá estava ele sentado à mesa do Le Grand
Vefour, em Paris, para uma refeição de R$ 9.984. No dia 16, pagou R$ 23.900 de
hospedagem no famoso Hotel Crillon, em Paris, cidade onde chegara na véspera!
Fevereiro acabara, mas em março a festa precisava continuar: no dia 25, pagou
uma conta de R$ 12.288 no Hotel W. Barcelona, na cidade do mesmo nome. Não há
distâncias nem limites para Cunha: em 20 de junho, lá estava ele no
restaurante Russkiy Ampir, em São Petersburgo (Rússia): conta de mais de R$ 12
mil. Este foi o padrão em 2013, que se repetiu em setembro, de novo em Nova
York.
Os sapatos de Cunha – o presidente da Câmara gosta de
conforto para os pés. Parece que estava adivinhando que seria eleito presidente
da Casa e tratou de cuidar dos pezinhos. Em setembro de 2013, em Nova York,
torrou R$ 32.464 na loja de sapatos masculinos Prada Abbigliamento. Isto em
apenas uma compra de sapatos. Podemos imaginar que Cunha não parou por aí, mas
os documentos da PGR não alcançam outras aquisições de lotes de sapatos. Mas
grifes como Zegna e Ferragamo, suas preferidas, têm linhas de calçados que não
devem ter escapado ao seu interesse.
2014 – Cunha não parava -e não parou até hoje. Atravessou o
Atlântico já em janeiro de 2014 para continuar a festança com o seu dinheiro em
Paris. No dia 12, pagou uma conta de quase R$ 40 mil reais no Hotel Meurice, na
Cidade Luz, sem contar as comprinhas de sempre. Em março, já estava em Roma,
logo depois em Veneza e Florença –entre 2 e 7 daquele mês, lá se foram mais R$
37 mil só em hotéis, algo como R$ 6.200 de diárias. Como Cunha não é de ferro,
não custava nada (para ele) uma esticadinha à terrinha. Dia 8 de março lá
estava o comandante das forças contra a corrupção em Cascais, porque afinal em
Portugal é tudo mais barato, não é? Mais R$ 9.472 em dois dias de hospedagem no
Grande Real Villa Hotel (quase uma pechincha para o deputado, que pagara
diárias superiores a R$ 6 mil apenas dois dias antes na Itália!). Não,
não acabou. Em abril, o sultão certamente sentiu-se em casa: mais R$
23.708 no hotel Burj Al Arab, em Abu Dabi.
2015 – Até o início do último ano, Cunha não era ainda
presidente da Câmara. A eleição, em 1 de fevereiro de 2015, não constrangeu o
sultão. Lá estava ele, 15 dias depois de sua eleição, cuidando de renovar o
guarda roupa em Paris. Uma conta de mais de R$ 32 mil reais na Textiles Astrum
France. Hospedagem? Nada de monotonia. O Crillon, em 2013, e o Meurice, em
2014, não estavam à altura do terceiro homem na linha sucessória: era chegada a
hora do Plaza Athenee! Cinco noites por R$ 63.520 (quase R$ 13 mil a diária).
Era preciso mesmo celebrar, e de novo na terrinha, mais uma conta de quase R$ 6
mil reais por uma refeição no restaurante Os Arcos, em Paço D’Arcos e de novo
no Grande Real Villa Hotel, em Cascais (ele gostou!): mais R$ 11.700.
A singeleza da mulher de Cunha, Cláudia – nada de listas
extensas. Só os destaques. Em 2014: em Paris, em janeiro, R$ 30.828 na Chanel e
mais R$ 16.736 na Charvet Place Vêndome (só os destaques, lembre-se); em Roma,
em março, R$ 17.988,00; em Lisboa, também em março, outros R$ 14.144 na Louis
Vuitton; e, claro, Dubai –R$ 15.196 na Chanel. Os destaques de 2014 (só os
“highlights”!) somaram quase R$ 100 mil reais em roupas, sapatos e bolsas.
Chanel é sempre Chanel: pra a grife, quase a metade, R$ 46.024. Importante
mencionar duas compras de 2015 porque, afinal, o maridão estava eleito
presidente da Câmara e era preciso caprichar e pensar nele; na favorita Charvet
Place Vêndome com suas opções para homens e mulheres, R$ 26.148; e
mais R$ 6.704 em gravatas na Hermès pra Cunha fazer bonito presidindo a Câmara.
Tudo em fevereiro, um mês de compras pra família Cunha (junto com março,
setembro, outubro, dezembro e janeiro compõem o semestre dourado dos cunhas
anualmente).
A filhinha Danielle e suas delícias – a lista é enorme e tá cansando,
começa a ficar monótono. Mas vale o registro que mocinha não deixou barato. Da
extensa lista de Danielle, três que merecem realce: em janeiro de 2014,
enquanto papai e mamãe passeavam na Europa, ela gastou quase R$ 21 mil na
Chanel, em Nova York; mais R$ 20 mil na Neiman Marcus em Orlando, em abril do
mesmo ano; e mais R$ 18.508 na Fendi em Nova York –afinal, Europa é pra velhos,
não é?
Cunha gasta como um sultão. É o sonho de todos os
manifestantes dos domingos na Paulista, das matilhas fascistas, dos pequenos,
médios empresários e até alguns grandes empresários, dos parlamentares e
jornalistas a serviço do golpe: querem todos gastar como sultões. Por
isso Cunha desperta uma relação mal escondida de inveja e admiração: pois ele
de verdade gasta como um sultão.
É um sultão que presta serviço ao ódio dos que desejam ser
sultões como ele, mas, sobretudo, preferem a morte a ver um país em que os
ricos tenham de abrir mão de parte de sua fortuna para que os pobres possam
viver com dignidade. Preferem a morte a ter de abrir mão de farras como a de
Cunha -ou do “direito” de sonhar com elas.
Não há solução para o escândalo da presença de Cunha à
frente da Câmara no interior do próprio Congresso –sua bancada é a maior da
Casa. Só há duas soluções possíveis para o caso Cunha no âmbito da democracia:
as ruas ou o Judiciário.
Cunha é o que é. A imprensa faz de conta que não vê o meio
bilhão do sultão e sua máquina de fazer bancada. Prefere cuidar dos pedalinhos
do torneiro mecânico.
O golpe em marcha, entre centenas de milhões de reais, ódio,
farra e um condutor: o sultão.
o trio parada dura
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