SYRIZA original, grega, é sigla do que está no título acima
(Συνασπισμός
Ριζοσπαστικής Αριστεράς, para quem lê grego). Uma SYRIZA brasileira
deveria ser capaz de ir além da coligação grega original, que ainda está (em
2018) no governo, mas acabou sendo garroteada pelo capital financeiro
internacional em 2015, meses depois de ser eleita governo, ao tentar cumprir o
programa pelo qual foi eleita, contra a austeridade feroz imposta ao povo grego.
Uma versão tupiniquim de coligação teria
que se reformular em relação ao que existe hoje para algumas arenas, como:
Eleições
O partido brasileiro de esquerda que vier tem que se
libertar do condicionamento eleitoral. Eleições não são nem suficientes nem
necessárias para exercer poder político. Se as classes dominantes continuarem a
ser imunes a reações dos mais pobres contra seus avanços, não importa muito
quem seja eleito, e na atual condição de sem poder, a esquerda nem deveria dar
muita importância em assumir postos de mando no Estado – eles não conferem lá
tanto poder.
Eleições, na atual situação e conjuntura, são mais uma
distração do que uma arena para a disputa política.
Justiça
A justiça brasileira está tomada, assim como as polícias,
pela direita ultraconservadora e filo-fascista. Não merecem confiança, de modo
que disputas políticas devem ser travadas longe do sistema judiciário. Quando
houver um sistema judiciário de verdade, ele terá que ser completamente
diferente do atual.
O judiciário brasileiro é aliado objetivo e subjetivo do
poder econômico, principalmente financeiro. No processo de seu crescimento
desde a vigência da Constituição de 1988, montou um sistema de remuneração para
si, completamente à margem dos limites legais previstos em leis e na
constituição, que o enquadra entre os um por cento mais ricos da população
brasileira, garantindo sua sólida solidariedade em relação aos donos do
dinheiro.
Ideologia e poder
O espaço da geração das ideias, da imaginação, das opiniões,
do conhecimento está em grande parte enquadrado pelo sistema de mídias, de
academias, de “think tanks” (estes, no Brasil, são praticamente unicamente de
direita).
O poder dos bancos se traduz em poder político ilimitado.
Limitar esse poder passa por boicotes gerais aos fluxos de dinheiro que
permitem sua acumulação e manutenção. Quais as formas desses boicotes, tem que
bolar.
Controlar o poder deles, para que o poder dos noventa e nove
por cento possa eventualmente enquadrá-los e derrota-los politicamente. A
resistência nas arenas política, acadêmica e da blogosfera contra as tentativas
de calar as dissidências ao discurso neoliberal é essencial. Pressuposto para começar a transformar em proposta o projeto de
substituir completamente os mecanismos de fluxo e acumulação de riqueza por
outros que passem a servir os interesses das maiorias.
Império
Os EUA são considerados no Brasil não como um país, mas como
o centro maior de decisões, e funcionam desde tempos imemoriais como
tal. Como começar a tirá-los desta posição, a distancia-los e usar a existência
da China e outros países como contraponto econômico e político?
Um começo: identificação e combate aos “ativos” do império:
espiões estrangeiros e mercenários brasileiros, entidades de atuação política,
financiadas por órgãos do governo e de corporações estadunidense.
Cultura
Iniciar, inventar, criar uma liberdade de imprensa e de
expressão, completa com informação, fundamentação teórica independente da
ideologia dominante, formulação de opiniões e de propostas, projetos, programas
regionais e nacionais.
Criação de espaços de pensamento racional e artístico. Onde
puderem florescer e crescer.
Internacionalismo
A esquerda brasileira tem se mostrado muito fraca, tanto em
efetivos como nas ações, para poder fazer uma diferença nos cenários do poder.
Faltam ideias, organizações, táticas de atuação que mostrem poder de mudar o
curso das coisas. O mesmo pode ser dito da esquerda europeia, dentro da qual se
insere a grega. E também dos outros países do Reino Unido e da União Europeia.
E dos Estados Unidos.
As grandes corporações financeiras, produtoras de armas e de
poluição têm arrancado nacos cada vez maiores de poder dos estados nacionais. Países
como o Brasil são ocupados por uma multiplicidade de forças tarefa dos governos
dos EUA e de seus aliados, e dos governos das grandes corporações.
Há um entendimento crescente nas camadas mais racionais das
populações de que elas não têm tido força para mudar o curso das coisas. Nos
EUA, quase Bernie Sanders consegue ser candidato a presidente, no Reino Unido
Jeremy Corbyn teve um rápido crescimento. Na Europa, Yanis Varoufakis articula
com outros a formação do primeiro partido de âmbito supranacional para o
parlamento europeu, o Democracy (DiEM25). Só que até agora, nada
sucedeu que tenha conseguido reverter sequer em um milímetro por hora a
rota de desastre do Titanic Mundial que é o capitalismo em sua atual versão.
A recente manifestação de líderes europeus de
centro-esquerda a favor da liberdade e do direito de Lula de disputar as
eleições de 2018 é um acontecimento muito importante, mesmo se não gerar
efeitos imediatos.
Relações “exteriores”
A esquerda brasileira pode governar? Um monte de gente anda
escrevendo e falando que não. É aí que políticos como Ciro Gomes podem entrar,
já que o pragmatismo radical dele o retira da esquerda e o coloca mais é no
centro. O que levanta a questão de se descobrir se existem grupos não de
esquerda suficientemente democráticos para conviver de modo leal com os de
esquerda.
Uma aliança democrática é possível? Poderia ela incluir
questões essenciais como o combate à ditadura do judiciário, das polícias e das
ameaças militares, ao monopólio da mídia e da banca privada, reversão das
privatizações danosas, volta a uma política externa própria? Ou deveria limitar-se
a apenas alguma forma de resistência à escalada fascista na sociedade?
Tudo está em aberto, por ora muito em aberto.
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